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Opinião | Quer investir na Amazônia? Esqueça soluções prontas

A região exige um investimento de longo prazo, em que o erro, embora inevitável, seja parte do aprendizado mútuo de investidores e empreendedores

Por Mariano Cenamo e Juliana Teles

O que falta para o capital das grandes cidades chegar aos rincões da Amazônia? As necessidades impostas pela crise climática e o crescente interesse pela bioeconomia têm levado a sociedade e as empresas a repensarem suas estratégias. No Brasil, a Amazônia representa uma imensa oportunidade para transformar essas ideias em prática, oferecendo nossa maior contribuição para combater a crise climática.

Para que isso ocorra, é fundamental que governos e investidores compreendam que transformar a economia de uma região tão grande e diversa como a Amazônia só se faz no longo prazo. Não existem soluções simples para problemas complexos. É preciso ir além do retorno financeiro e alinhar expectativas e confiança com as organizações, investidores e empreendedores locais que estão na linha de frente. Esse desafio ressoou alto durante a terceira edição do Festival de Investimento de Impacto e Negócios Sustentáveis da Amazônia (Fiinsa), evento organizado pelo Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas (Idesam) e pelo Impact Hub Manaus que reuniu mais de 800 pessoas na capital amazonense.

A pressão por retorno financeiro “exponencial” imposta pelos modelos de venture capital para investir em negócios de tecnologia não vai resolver nossos problemas por aqui. A natureza dos negócios criados para resolver os problemas socioambientais de nossas comunidades e promover a prosperidade na Amazônia depende de variáveis complexas, como secas severas que impedem a navegação, logística multimodal, irregularidade de serviços, dificuldade de comunicação, entre tantas outras. Essa é uma premissa básica que precisa ser compreendida para que haja um ajuste nas teses de investimento do “mercado” à região, e não o contrário.

Para que a transformação realmente ocorra, o Brasil precisa ser visto como uma potência criadora, onde projetos inovadores de desenvolvimento sustentável sejam criados com a ambição de transformar o mundo onde vivemos. Isso não significa que o trabalho precisa ser feito isoladamente: há inúmeras oportunidades para empresas se conectarem a organizações e negócios já estabelecidos na Amazônia, contribuindo para um ecossistema que valorize e fortaleça a sociobiodiversidade. Diversos empreendedores e comunidades locais têm conhecimentos profundos da região e já trabalham para desenvolver alternativas sustentáveis que possam competir com atividades degradantes e ainda gerar impacto positivo.

Se, por um lado, investidores reclamam da falta de projetos ou “negócios maduros”, por outro, empreendedores afirmam ter dificuldade em acessar recursos. Algo não fecha nessa conta, e talvez o que esteja faltando na equação sejam colaboração e adaptação real entre as partes. Para que a colaboração entre investidores e empreendedores amazônicos funcione, é preciso repensar a abordagem. Em vez de chegarem com soluções prontas, os investidores devem estar abertos a construir modelos inovadores e colaborativos. A Amazônia exige um investimento de longo prazo, profundo e cuidadoso, em que o erro, embora inevitável, seja parte de um aprendizado mútuo entre os dois lados.

Alguns pontos são essenciais para quem pretende investir na bioeconomia da Amazônia: primeiro, ações falam mais do que palavras. É fundamental testar e desenvolver soluções que realmente se adaptem ao local. Segundo, é preciso encontrar alternativas financeiramente atrativas para substituir as atividades ilegais que causam a destruição da floresta e imperam na região. Terceiro e mais importante: as comunidades, populações e moradores desta terra não devem ser vistos como público beneficiário, mas como protagonistas e parceiros (e recebendo de forma justa por isso). E, por fim, devem-se explorar mecanismos financeiros inovadores que enxerguem valor nos impactos socioambientais positivos desses negócios (exemplos: conservação da floresta, sequestro de carbono, redução de desigualdades sociais, etc.).

Além do capital bem direcionado e de forma efetiva, falta também empatia. A relação entre investidores e empreendedores amazônicos só floresce quando há abertura para entender as especificidades da região. O verdadeiro match só ocorre quando ambos os lados aprendem juntos e ajustam suas expectativas. É preciso lembrar que a Amazônia não é um projeto de alguém, mas uma potência coletiva; assim, o papel dos investidores deve ser o de fortalecer projetos já existentes, e não de criar empreendimentos sem conexão com a realidade local.

A filantropia e o investimento sustentável, embora ambos necessários, são diferentes e complementares. É preciso entender que investir na região exige paciência, inovação e uma visão de longo prazo. A Amazônia oferece ao mundo uma lição importante: soluções rápidas e simplistas não funcionam. O caminho para um impacto verdadeiro e duradouro passa por um diálogo aberto e contínuo, que valorize os erros como parte de um aprendizado fundamental. O futuro da Amazônia depende dessa capacidade de cooperação, sobretudo, e de uma nova atitude de parceria e respeito mútuo entre investidores e empreendedores de todo o Brasil.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, DIRETOR DE NOVOS NEGÓCIOS DO IDESAM, CEO DA AMAZ ACELERADORA DE NEGÓCIOS E UM DOS REALIZADORES DO FIINSA; E COFUNDADORA DO IMPACT HUB MANAUS E UMA DAS REALIZADORAS DO FIINSA

Opinião por Mariano Cenamo

Diretor de novos negócios do Idesam, CEO da Amaz Aceleradora de Negócios, é um dos realizadores do Fiinsa

Juliana Teles

Cofundadora do Impact Hub Manaus, é uma das realizadoras do Fiinsa