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Opinião | Regras antidesmatamento: europeus acenam com prazo maior para exportadores

Regulamento impactará 15% das exportações totais brasileiras e 34% das exportações do Brasil para a UE. Por isso, surpreende a pouca preocupação quanto ao ajuste do mercado internacional à norma

Por Barbara Dayana Brasil, Eduardo Felga Gobbi, Heroldes Bahr Neto e Rui Pedro Ribeiro

Previsto para entrar em vigor em dezembro de 2024, o Regulamento Europeu Antidesmatamento da União Europeia (EUDR) pode passar a valer somente no fim de 2025. Isso porque a Comissão Europeia solicitou um adiamento de um ano para a aplicação das normas que buscam garantir que os produtos importados não contenham associados ao desmatamento e que foram criadas em um esforço para combater as mudanças climáticas e para promover a sustentabilidade. A intenção da Comissão Europeia é uma oportunidade única em momento crucial para o comércio internacional, especialmente para países como o Brasil, cuja economia depende fortemente das exportações para a União Europeia. O regulamento reúne critérios rigorosos para as cadeias de fornecimento, impactando significativamente as exportações brasileiras.

Embora o adiamento ofereça um tempo adicional para que as empresas se ajustem às novas normas, é imperativo que os exportadores brasileiros aproveitem o tempo extra para se preparar, garantindo que suas práticas estejam alinhadas com os objetivos de sustentabilidade da União Europeia (UE). O primeiro aviso sobre a mudança de regras veio há cinco anos, em dezembro de 2019, quando a UE anunciou o Pacto Ecológico Europeu, também conhecido como Green Deal. Trata-se de um conjunto de medidas que os países-membros do bloco devem adotar para mitigar a emissão de gases de efeito estufa e suas consequências nocivas ao meio ambiente. As propostas visam a adequar as políticas da União Europeia em áreas como clima, energia, transportes e fiscalidade, com o objetivo de reduzir as emissões líquidas de gases de efeito estufa em pelo menos 55% até 2030, em comparação aos níveis de 1990.

É nesse contexto do Green Deal que o Regulamento Europeu Antidesmatamento estava previsto para entrar em vigor em 30 de dezembro de 2024. Com o EUDR, as empresas deverão adotar diligências rigorosas para verificar as origens de seus produtos importados ou exportados, comprovando que não desenvolvem o desmatamento ou a manipulação de ecossistemas naturais. O regulamento também aborda o impacto social do desmatamento, incluindo a exploração de povos indígenas e comunidades locais.

Em termos gerais, os importadores europeus terão a responsabilidade de fiscalizar suas cadeias de suprimento, assegurando que os produtos não venham de áreas desmatadas após 31 de dezembro de 2020. A medida abrangerá produtos de cadeias produtivas como café, soja, óleo de palma, madeira, couro, carne bovina, cacau e borracha. Estima-se que o regulamento impactará 15% das exportações totais brasileiras e 34% das exportações do Brasil para a União Europeia. Por isso, surpreende a pouca preocupação quanto ao ajuste do mercado internacional à exigência da norma.

O adiamento de prazo pedido pela Comissão Europeia ao Parlamento e ao Conselho Europeu abre uma nova oportunidade para os exportadores do Brasil e dos demais países. Caso a proposta seja aprovada, o regulamento passará a vigorar em 30 de dezembro de 2025 para grandes empresas e em 30 de junho de 2026 para micro e pequenas empresas. Atenta às preocupações manifestadas por parceiros globais, que se mostram apreensivos quanto à capacidade de adaptação às novas normas, a Comissão Europeia busca, com o alargamento do prazo, permitir que os parceiros internacionais se preparem para as novas normas com o próximo ano funcionando como um “período gradual para garantir uma implementação adequada e eficaz”.

Também entre as partes interessadas na Europa há disparidades significativas para a adoção do EUDR. Para enfrentar esses desafios, a comissão busca promover práticas sustentáveis, como a agricultura de precisão, a agroecologia e a agrossilvicultura, além de estabelecer normas mais rigorosas de bem-estar animal. Tendo em vista que a introdução de alimentos importados nos mercados da UE estará condicionada ao cumprimento das normas ambientais do bloco, a necessidade de implementação de sistemas de produção sustentáveis se torna o foco de atenção e reforça a crença de que uma implantação gradual será mais eficaz.

Por meio dessas medidas, a União Europeia pretende utilizar sua influência e expertise, além de recursos financeiros, para mobilizar vizinhos e parceiros em direção a uma trajetória sustentável. Nesse sentido, também foi publicado um guia como material de referência para aqueles que desejam adequar-se ao EUDR. É fundamental notar que a implementação do regulamento depende de diversos passos e medidas que devem ser adotadas. Mesmo com a eventual aprovação do adiamento relacionado às sanções, os exportadores brasileiros devem estar atentos às exigências.

A União Europeia é o segundo principal destino das exportações brasileiras, com negócios que totalizaram cerca de US$ 25,5 bilhões em 2022. Portanto, o adiamento não significa perda de vigência da norma, mas apenas que aqueles que ainda não tomaram as devidas providências ganham nova oportunidade. Precisarão, contudo, agir de imediato, pois é pouco provável que, aprovado o adiamento sugerido pela Comissão Europeia, outras prorrogações para a aplicação das barreiras sejam adotadas.

A causa é global e muito nobre. O sucesso na implementação do EUDR não apenas fortalecerá as cadeias de abastecimento, mas também contribuirá para uma abordagem mais responsável e consciente em relação ao meio ambiente, beneficiando tanto as economias locais quanto o planeta como um todo.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, ADVOGADA, DOUTORA EM DIREITO PELA FACULDADE DE DIREITO DE COIMBRA; ENGENHEIRO CIVIL, DOUTOR PELA UFRJ; ADVOGADO, DOUTORANDO EM DIREITO PELO IDP/DF; E ENGENHEIRO FLORESTAL, COM MBA EM GESTÃO PELA UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA E ADVANCED MANAGEMENT PROGRAM PELO IESE

Opinião por Barbara Dayana Brasil

Advogada, é doutora em Direito pela Faculdade de Direito de Coimbra

Eduardo Felga Gobbi

Engenheiro civil, é doutor pela UFRJ

Heroldes Bahr Neto

Advogado, é doutorando em Direito pelo IDP/DF

Rui Pedro Ribeiro

Engenheiro florestal, com MBA em Gestão pela Universidade Técnica de Lisboa e Advanced Management Program pelo Iese