Em meio a um país polarizado e marcado por discursos de ódio, a escola padece com a reprodução da mesma lógica de violência que refrata a sociedade.
Não é por acaso o crescente número de atentados ocorridos nos últimos anos dentro do ambiente escolar. O recente episódio, em Aracruz, no Espírito Santo, culminou na morte de quatro pessoas e deixou outras tantas feridas. Disso tudo, o que nós, educadoras, famílias e gestores públicos, que fazemos parte e incidimos na e para a educação pública, devemos nos atentar?
O primeiro ponto é que nada do que acontece na escola está descolado da realidade. O ambiente escolar é permeado pelo que está posto na sociedade. E fora dos muros da escola muita coisa tem reforçado essa cultura de ódio e violência.
Exemplo disso foi a flexibilização das regras para o porte de armas e o incentivo ao armamento civil, encampado pela gestão federal anterior. Isso abriu precedentes para ações fatalmente equivocadas, como a que vimos recentemente, em que uma parlamentar saca e aponta uma arma para outra pessoa, no meio da rua, sem a menor hesitação.
Estudiosos, no Brasil e no mundo, vêm buscando compreender melhor o fenômeno da violência no ambiente escolar. Nessa direção, apontam que é importante distinguir o que é a violência na escola, da escola e contra a escola.
A primeira está diretamente relacionada ao dia a dia escolar, como o desrespeito entre estudantes e professoras e o bullying. A segunda se fundamenta na ação institucional, simbólica, no modo como opera a comunidade escolar, como a falta de diálogo da gestão com as(os) discentes e a deslegitimação das necessidades dos estudantes. A violência contra a escola, por sua vez, se refere àquelas que ocorrem dentro do ambiente escolar, mas que se originam fora dela – como os casos de tiroteio em que a escola acaba se tornando alvo da violência.
Importante enfatizar que isso não é novidade no cotidiano escolar do Brasil e de outros lugares do mundo. O que chama a atenção neste momento – e destaco como o segundo ponto deste artigo – é como as violências se acentuaram após a pandemia.
Um levantamento feito pela Secretaria da Educação de São Paulo mostrou que, nos primeiros dois meses de aula de 2022, houve um aumento de 48,5% de casos de agressões físicas nas unidades estaduais.
O isolamento social e o afastamento da escola trouxeram prejuízos não somente à aprendizagem, mas também à sociabilidade dessas infâncias, adolescências e juventudes. Sem contar que muitas meninas e meninos viveram situações de violência, doenças e luto no ambiente familiar e estão chegando à escola com muita dificuldade para lidar com tantas emoções.
O que temos pela frente é um trabalho árduo de enfrentamento da violência dentro e fora do espaço escolar. Isso parte, sobremaneira, de um esforço genuíno de repactuação da sociedade como um todo. Inclui também o desenvolvimento de políticas intersetoriais que ajudem a garantir o pleno direito à educação de qualidade, além de iniciativas focalizadas no trabalho docente, que precisa ser apoiado para lidar com os novos desafios do chão da escola. E, à comunidade escolar, cabe a tarefa de fomentar iniciativas que venham ao encontro de uma educação democrática, que valorize as diferenças.
O momento nos convoca a esperançar, como diz Paulo Freire. Na prática, isso significa ir atrás, levar adiante. É unir forças para buscar soluções e novas formas de pensar, sentir e agir. Enfrentar a violência nas escolas é, portanto, tarefa de todos nós. E não podemos desistir.
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PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO CENPEC