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Opinião|Se o professor avalia, os alunos aprendem?

Quando os docentes dominarem o processo de avaliação, esta se tornará uma grande aliada no processo de ensino e aprendizagem

Por Filomena Siqueira

Ao falar sobre o papel da avaliação na aprendizagem, rapidamente é possível identificar o grupo dos entusiastas que projetam nela a solução para superar os baixos resultados de aprendizagem e o grupo dos críticos, que não veem função alguma nisso ou, ainda, entendem que a avaliação joga contra a aprendizagem. Nos extremos, sabemos que há pouco o que aproveitar.

Um dos grandes problemas sobre o uso das avaliações é dissociá-las do processo de ensino, reservando espaço para elas apenas ao final do processo. Isso é um equívoco e custa caro para Estado, professores, alunos e famílias. Fracassos são apontados e diversas justificativas surgem para explicar o desempenho ruim. Depois disso, a vida volta ao normal até a próxima prova: volta-se ao ponto de partida, cada um segue seu modus operandi e o trajeto é percorrido novamente como um filme que se repete numa ilusão de que o final, inexplicavelmente, será diferente.

Quando avaliar é visto como parte do processo de ensino e compõe, permanentemente, o planejamento didático para o dia a dia da sala de aula, é possível compreender o desenvolvimento da aprendizagem e recalcular a rota sempre que necessário durante o percurso, identificar as melhores estratégias e intervenções e seguir adiante. Implementar essa cultura exige conhecimento, é complexo e requer investimentos, principalmente em formação docente. Mas não é impossível.

De início, a mudança pede que as avaliações sejam encaradas assim, no plural, diversas: o modelo diagnóstico (ideal para anteceder a ação didática, para conhecer o perfil dos alunos); a avaliação somativa (que apresenta uma foto que reflete aonde cada aluno e a turma chegaram até aquele momento); e a formativa (que viabiliza a interpretação do desempenho, a identificação e leitura de um processo, de algo em desenvolvimento). Tarefas feitas durante as aulas, com devolutivas bem estruturadas para os estudantes, também podem ser ótimos instrumentos de avaliação. Justamente porque são cotidianas, ajudam a interpretar o que está acontecendo durante o percurso.

Outra mudança de paradigma tem que ver com a importância central de traçar o planejamento de aulas somente depois de organizar as aprendizagens que se quer alcançar. Em outras palavras, compreender e organizar o que os alunos precisam saber ao fim do ano, quais as habilidades precisam conquistar. Dessa maneira, é possível ter clareza do que é necessário ser avaliado – caso contrário, se não se sabe aonde quer chegar e qualquer caminho serve, inclusive nenhum...

Considerando que avaliar tem por trás questões metodológicas, técnicas e conhecimento, é ainda preciso formar os professores para que saibam desenvolver boas avaliações. Faz-se necessário traçar ações com as instituições de ensino superior e com as redes de ensino, para que seja aberto um espaço conjunto de debate sobre o tema e para que o domínio de práticas avaliativas se torne parte das competências docentes. É com base nisso que será possível aprimorar o que é feito em sala de aula.

Acompanhando o uso do material formativo gratuito Avalia e Aprende pelas redes, do Instituto Reúna, sobre avaliações a favor da aprendizagem, é nítido o quanto os educadores apresentam dificuldades em relação à tarefa docente de avaliar, o quanto buscam por bancos de itens para selecionar questões e aplicar em sala sem, necessariamente, saberem fazer uso do resultado apresentado pelos estudantes. É importante que os professores não apenas saibam selecionar bons itens, mas que tenham parâmetros para fazer a avaliação das respostas dos alunos e sejam capazes de investigar os erros e identificar pistas do que o aluno não desenvolveu. Quando isso não ocorre, não existe a compreensão do potencial da avaliação.

O professor pode avaliar e o aluno, não aprender. Mas não será possível saber se o aluno aprendeu sem atividades avaliativas. O ponto central não é o fla-flu sobre avaliar ou não, dado que a avaliação precisa ser entendida como parte inerente do processo pedagógico. O passo urgente que precisa ocorrer é formar profissionais da educação capazes de entender o que será avaliado, por que, como – e mais: o que será feito com o resultado. Quando os docentes dominarem esse processo, a avaliação se tornará uma grande aliada no processo de ensino e aprendizagem.

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PESQUISADORA SÊNIOR DO CONSORTIUM FOR POLICY RESEARCH IN EDUCATION, É GERENTE PEDAGÓGICA DO INSTITUTO REÚNA

Opinião por Filomena Siqueira