O presidente Lula da Silva já disse, a propósito do regime do companheiro Nicolás Maduro na Venezuela, que a democracia é relativa. Por que não a ética? De fato, Lula parece tão afeito à relatividade que até a moral, para ele, é relativa. Para o lulopetismo, certo e errado podem ser relativos, mas há um princípio absoluto, um valor inegociável: impunidade para os companheiros, revanche para os adversários. É o que se depreende da atuação da Comissão de Ética Pública da Presidência formada pelo demiurgo petista à sua imagem e semelhança.
A Comissão é um órgão consultivo da Presidência da República criado em 1999 para resguardar o interesse público, blindando processos decisórios no âmbito do Executivo contra a contaminação de interesses privados.
Como tal, a isenção deveria ser o requisito básico para a indicação de seus sete conselheiros, e a imparcialidade, a regra número 1 a nortear as suas decisões, sempre priorizando os interesses de Estado acima dos interesses do governo, e os interesses do governo acima dos interesses do partido. Como se sabe, o lulopetismo observa rigorosamente essa hierarquia – só que de cabeça para baixo.
Essa é só uma das práticas que tornam Lula tão parecido com seu antípoda, Jair Bolsonaro. O ex-presidente, como se sabe, abastardou a Comissão, indicando conselheiros que favoreceram seus ministros, por exemplo, liberando-os da quarentena regulamentar para exercerem atividades na iniciativa privada que mantinham relação com seus antigos cargos.
Lula, no início de seu governo, destituiu metade dos Conselheiros indicados por Bolsonaro, rompendo a praxe pública, já que eles teriam mandato até 2025, mas mantendo a praxe bolsonarista – os novos indicados, três deles advogados de Lula, tinham como credencial mais vistosa a lealdade canina ao petista. Desde então, a Comissão aplicou 10 punições a 5 ex-ministros de Bolsonaro, e arquivou todos os 21 processos contra 17 ministros de Lula.
O ex-ministro do Meio Ambiente e hoje deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), por exemplo, foi corretamente censurado por custear com dinheiro público viagens em voos de carreira sem agenda oficial. Mas a mesma Comissão não viu problema no uso de aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) pelo ministro das Comunicações, Juscelino Filho, para, por exemplo, ir a um leilão de cavalos. A propósito, a Comissão também não ergueu uma sobrancelha ao gabinete paralelo franqueado por Juscelino ao sogro, Fernando Fialho, para receber empresários e despachar junto a aliados no Ministério das Comunicações.
O ex-ministro da Educação Abraham Weintraub recebeu três punições, uma delas por chamar Paulo Freire, um pedagogo sacrossanto para a esquerda, de “feio”, “fraco” e “energúmeno”. Já Gilson Machado, ex-titular do Turismo, foi penalizado por chamar Lula de “safado, ex-presidiário e cachaceiro”. Aparentemente, isso é mais grave do que imputar o pior dos crimes, o genocídio, como os lulopetistas e o próprio grande líder fazem recorrentemente a Bolsonaro e seus correligionários.
Outro caso arquivado pela Comissão foi o do ministro-chefe da Controladoria-Geral da União, Vinícius Marques de Carvalho. Carvalho está licenciado de seu escritório de advocacia, hoje conduzido por sua namorada. Ainda assim, não parece ser menos reprovável que ofensas escolares o fato de esse escritório ter recebido valores da empreiteira Novonor (antiga Odebrecht) para atuar no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Hoje, quatro dos sete membros da Comissão, incluindo seu presidente, são ligados ao grupo de juristas lulopetistas Prerrogativas, que já emplacou dezenas de nomeações não só no Executivo, mas em tribunais superiores e regionais ou autarquias. Além de conduzir uma comissão informal a serviço de Lula e promover pajelanças, como a que consagrou a primeira-dama Janja da Silva como “guerreira do povo brasileiro”, o “Prerrô”, como é carinhosamente chamado, também se dedica a editar livros. Um deles, um certo Livro das Parcialidades, denuncia uma “saga ou um folhetim, com capítulos novos a cada semana”. Pelo jeito, a saga continua.