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Freio de arrumação

Justiça foi prudente ao suspender a validade da lei que proíbe o turfe em São Paulo

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Por Notas & Informações
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É estranha a rapidez com que foi tratado pela Câmara Municipal de São Paulo o Projeto de Lei (PL) 691/22, que proibiu o uso de animais em atividades esportivas na cidade. Proposto pelo vereador Xexéu Tripoli (União) em 13 de dezembro de 2022, o PL 691/22 foi aprovado pela Casa no dia 26 de junho passado e sancionado pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) no dia seguinte. Nesse ano e meio de tramitação, só há registro de duas audiências públicas obrigatórias.

Na superfície, o projeto parece bem intencionado. Mas de boas intenções, como se sabe, o inferno está cheio. Desde o início, ficou claro que o grande alvo da Câmara Municipal era a proibição do turfe na cidade, a pretexto de coibir a “prática de jogos de azar” e, principalmente, os “maus-tratos” contra os cavalos. O projeto, porém, também serve a um interesse não escrito. No limite, pode culminar na desapropriação da valiosíssima área de 600 mil m2 do Hipódromo de Cidade Jardim, de propriedade do Jockey Club de São Paulo.

A bem da verdade, o Jockey Club deve R$ 856 milhões de IPTU à municipalidade, de acordo com os cálculos da Prefeitura. A desapropriação, portanto, é uma das cartas sobre a mesa. Mas o clube decerto não é o único devedor do Fisco municipal. Ademais, há sempre a possibilidade de negociação.

Sensível a essas nuances, a Justiça paulista acolheu um pedido do Jockey Club e suspendeu, na terça-feira passada, a validade da Lei n.º 18.147/24. Assim, a Prefeitura fica proibida de punir o clube por manter suas atividades até o julgamento do mérito da ação, ainda sem data marcada.

Não se pode condenar quem veja nessa correria para aprovar a lei a exploração eleitoreira da situação periclitante do Jockey Club, no melhor cenário, ou a abertura do poder público à especulação imobiliária, no pior. Em exposição de motivos, Tripoli argumentou que “a aversão à ideia de apostas em contenda com animais vem aos poucos se consolidando”, sem apresentar dados objetivos que corroborassem a asserção. Parece uma justificativa frágil.

Além disso, em que pese a opinião dos que não veem o turfe como um esporte, mas sim “uma prática extenuante” para os cavalos, como defende o vereador, parece haver uma deliberada confusão entre o que acontece no Hipódromo e o que acontece na clandestinidade das apostas em rinhas de galo, corridas de cães ou lutas entre pit bulls – estas sim, práticas que quase sempre levam à morte os animais.

Os cavalos do Jockey Club decerto são mais bem tratados do que muitos dos moradores sem-teto na capital paulista. E com estes o Legislativo municipal não parece estar tão preocupado, haja vista que passou em primeira votação um projeto de lei que multa quem doar comida aos sem-teto, impedindo, na prática, o exercício da caridade.

Igualmente estranha nessa história toda é a intenção do prefeito Ricardo Nunes de instalar um parque no lugar do Hipódromo de Cidade Jardim. Há três anos, estudos da própria Prefeitura revelaram que seria inviável criar um parque no local dadas as condições do terreno, entre outros fatores.