O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, conseguiu uma vitória e tanto nesta semana. Na quinta-feira, quando o dólar voltava a se apreciar em meio a incertezas sobre a política fiscal do governo e a um cenário externo mais adverso, o ministro antecipou a informação que era aguardada apenas para a próxima semana e anunciou um congelamento de despesas da ordem de R$ 15 bilhões para tentar atingir a meta fiscal. “Estamos antecipando justamente para evitar especulação”, disse o ministro.
Simbólico, o anúncio foi feito no Palácio do Planalto, logo após uma reunião entre os ministros que compõem a Junta de Execução Orçamentária (JEO) e o presidente Lula da Silva, numa clara tentativa de mostrar que o presidente havia sido convencido da necessidade de conter gastos. Ao menos, foi essa a mensagem que Haddad e a ministra do Planejamento, Simone Tebet, tentaram transmitir em conjunto.
Desses R$ 15 bilhões, R$ 11,2 bilhões serão bloqueados porque o crescimento dos gastos obrigatórios ultrapassou o limite determinado pelo arcabouço, de 2,5% acima da inflação. Outros R$ 3,8 bilhões serão contingenciados porque as receitas não têm tido o comportamento que o governo esperava e podem comprometer o cumprimento da meta fiscal. Ambos os valores podem vir a ser liberados se as estimativas melhorarem ao longo dos próximos meses.
Como há pouquíssimo espaço para rever gastos obrigatórios, tanto o bloqueio quanto o contingenciamento deverão ter forte impacto nas despesas discricionárias, rubrica que inclui o custeio de atividades administrativas dos ministérios, investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e emendas parlamentares.
As pastas que mais concentram gastos não obrigatórios, além do Ministério dos Transportes, são as da Saúde e da Educação, algumas das mais sensíveis aos olhos da base de apoio do governo. Ademais, qualquer mexida nas emendas parlamentares sempre traz algum desgaste nas relações com o Congresso.
O governo ainda precisará detalhar como essa tesourada será materializada, mas, segundo Haddad, esses números não incluem o resultado do pente-fino em programas sociais. A estratégia funcionou, ao menos por enquanto, e trouxe alguma tranquilidade ao mercado. O congelamento foi maior do que os R$ 12 bilhões que a maioria esperava, mas inferior aos R$ 26 bilhões necessários para cumprir a banda inferior da meta.
Ou seja, com o anúncio desta semana, o governo deixou implícito que não almeja exatamente o centro da meta de déficit zero, mas que trabalhará com a margem de tolerância de 0,25 ponto porcentual. Isso permitiria um saldo negativo entre receitas e despesas de até R$ 28,8 bilhões neste ano.
Se assim for, o governo ainda terá de anunciar mais uma contenção de despesas na próxima revisão bimestral do Orçamento, em setembro. E, se tudo der certo, em novembro, poderá fazer uso do tradicional empoçamento – diferença entre os pagamentos que foram autorizados e os que efetivamente ocorreram – para remanejar recursos entre as áreas.
Até lá, há a dura realidade com a qual o governo terá de lidar. Como tradicionalmente acontece, o Orçamento deste ano conta com despesas que foram subestimadas, especialmente os benefícios previdenciários e de assistência social, que avançam em ritmo superior à inflação.
Na outra ponta, as receitas foram superestimadas, entre elas a expectativa de arrecadação com a retomada do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Até agora, dos R$ 56 bilhões inicialmente previstos, nada entrou. E ainda não houve acordo com o Senado sobre as medidas arrecadatórias para compensar a renúncia de R$ 18 bilhões associada à desoneração da folha de pagamento de 17 setores e dos municípios.
O problema de mirar o limite inferior, em vez do centro da meta, é que o governo não terá qualquer margem de manobra caso ocorra algum imprevisto. Mas, diante do cenário que se desenhava, alcançar um déficit de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB) ainda é melhor que nada. Por ora, Haddad venceu a batalha, mas a guerra ainda está longe de terminar.