A crise climática tornou-se a maior preocupação mundial das últimas décadas, e o temor cresce à medida que seus efeitos se acentuam de forma assustadora. Mas os investimentos das grandes empresas na mitigação dos impactos ainda são mínimos. Grande parte do planejamento de compromissos e metas se traduz mais em propaganda e retórica do que na aplicação efetiva de recursos.
Apesar da apreensão global, o ponto de inflexão ainda não foi atingido. Os mesmos investidores internacionais que cobram dados sobre emissões não estão preparados para aceitar retornos financeiros eventualmente mais baixos como resultado. Os consumidores, por sua vez, que se mostram mais sensíveis a conhecer a forma como os produtos são feitos, continuam a balizar suas compras essencialmente pelo custo. Por fim, as empresas alçam a questão ambiental ao patamar de prioridade, mas perseguem metas de retorno e de redução de custo em primeiro lugar.
Duzentas e seis multinacionais nos Estados Unidos, Europa e Brasil foram pesquisadas pela consultoria Oliver Wyman, líder global em estratégia e gestão, e pela Climate Group, ONG com escritórios em Londres, Nova York, Nova Déli, Amsterdã e Pequim. O resultado é o retrato sem filtro das decisões sobre investimentos ambientais, como mostrou a Coluna do Broadcast.
Diversos exemplos são citados no relatório Ação Climática em Escala, que usa o termo “contradição do mercado” para referir-se ao descasamento entre propostas e resultados. Mais da metade (59%) das grandes companhias ouvidas investe menos de 5% de seus recursos operacionais em medidas destinadas ao combate e prevenção da crise climática.
Os compromissos com a sustentabilidade entraram oficialmente na pauta global em 1992, com a Conferência das Nações Unidas no Rio de Janeiro (Eco-92). Nesses 31 anos o mundo defende formas de frear o aquecimento global, impondo o limite de 1,5°C ao aumento anual da temperatura, sob risco de os desastres climáticos tornarem inabitável o planeta.
A consciência está formada. O problema é partir da teoria para a prática, para ir além de ações isoladas ou simbólicas. O atual estágio exige investimentos em larga escala. Pela amostra representativa do relatório é possível constatar que muitas empresas instituíram metas ambiciosas de redução de carbono até 2030, por exemplo. Mas, na maior parte das vezes, não há detalhamento dos custos que o programa representará.
O papel das grandes empresas na busca pelo equilíbrio climático não acaba com o simples estabelecimento de um cronograma de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa. Além disso, é necessária a construção de negócios que prosperem num mundo descarbonizado. Não se trata de escolha. Aliás, não há mais escolha; é imperativo avançar nessa estratégia de negócios.
Os efeitos das mudanças climáticas batem à porta, com as chuvas torrenciais, ciclones, furacões, incêndios florestais, ondas de calor extremo, desastres naturais que deixam um rastro de dezenas, às vezes centenas ou milhares de mortes. Um início de primavera com temperaturas previstas acima de 40°C mostra que já passou da fase das boas intenções.
O relatório mostra que quase nenhuma ação corporativa relativa à questão climática vem do motor normal dos negócios, que é a demanda do consumidor, e nenhum dos entrevistados disse esperar que isso mude. Na interpretação deles, o comportamento do consumidor continua vinculado ao valor monetário. Isso é certamente verdadeiro, mas não pode ser tomado como algo impossível de mudar.
Enquanto a intervenção direta do consumidor for insuficiente, que haja medidas públicas para acelerar o esforço da descarbonização. O Ministério da Fazenda anunciou a criação, em breve, da taxonomia sustentável brasileira, conjunto de regras para orientar investimentos públicos e privados sobre ativos e projetos sustentáveis.
Estamos atrasados. Esse instrumento para calcular a factibilidade dos compromissos ambientais, separando o que é sério daquilo que é apenas “maquiagem verde” (greenwashing), já deveria estar em vigor.