A divulgação dos resultados da avaliação internacional Pirls (sigla em inglês de Progress in International Reading Literacy Study) deu um motivo a mais para o País se preocupar com a baixa aprendizagem de seus estudantes. Não que seja novidade o Brasil figurar nas últimas posições de rankings de desempenho educacional, algo que acaba de se repetir. A questão é que o Pirls tem foco em leitura e compreensão de texto por alunos do 4.º ano do ensino fundamental, isto é, por crianças em início da trajetória escolar. E mau desempenho nessa fase, claro, não é bom presságio.
Como noticiou o Estadão, a prova foi aplicada em 2021, no segundo ano da pandemia de covid-19, em 57 países e territórios. Único representante da América Latina, o Brasil participou pela primeira vez e ficou na 52.ª posição, atrás de Kosovo, Omã e Uzbequistão − e distante não só das nações desenvolvidas, mas também da Turquia, a mais bem colocada no grupo de países da parte de baixo da tabela, na qual aparecem o Brasil e os demais países que não lograram atingir sequer a nota média registrada na primeira edição do teste, em 2001.
Por motivos operacionais, alunos de 14 países fizeram a prova quando já haviam iniciado o 5.º ano do ensino fundamental, prejudicando a comparação. Nem isso, porém, alivia o fraco desempenho brasileiro: mesmo considerando unicamente os 43 países e territórios cujos estudantes estavam no 4.º ano do fundamental por ocasião do exame, o Brasil permanece entre os últimos colocados, em 39.º lugar.
Os resultados do Pirls devem ser analisados com redobrada atenção pelas autoridades educacionais. Primeiro, porque revelam graves deficiências de leitura, um obstáculo e tanto para as futuras aprendizagens. A nota média obtida pelas crianças brasileiras indica uma capacidade limitada de compreender textos, com dificuldades para ir além das informações explicitamente enunciadas. Ora, num mundo em que as escolas precisam ensinar os alunos a ler nas entrelinhas, definitivamente isso é mau começo. Não surpreende, então, que o desempenho de cerca de 75% das crianças brasileiras tenha ficado abaixo da média registrada em Israel − país longe do topo do ranking liderado por Cingapura.
Os efeitos deletérios da pandemia sobre a educação, por óbvio, não podem ser ignorados. Menos ainda no Brasil, uma das nações onde as escolas ficaram mais tempo fechadas e onde o ensino remoto, como se sabe, deixou a desejar. O fato de que o Pirls tenha sido aplicado em 2021 joga luz sobre as sequelas desse período − e sobre a necessidade de todos os níveis de governo somarem esforços para reverter esse quadro.
Pensando nisso, o primeiro dia da série de eventos Reconstrução da Educação, uma iniciativa do Estadão e de longa lista de entidades parceiras, debateu a urgência da recomposição das aprendizagens. Como bem lembrou o secretário municipal de Educação do Recife, Fred Amâncio, as deficiências educacionais já existentes foram agravadas pelo ensino remoto. No caso da alfabetização, criou-se uma espécie de efeito cascata: “Crianças de sexto, sétimo, oitavo e até nono ano que não estão plenamente alfabetizadas”, disse Amâncio. Corretamente, ele chamou a atenção para uma agravante: os professores que lecionam nos anos finais do fundamental não são alfabetizadores e estão tendo que lidar com uma situação para a qual não foram preparados.
O cenário é desolador e requer ações urgentes, sob pena de que um contingente ainda maior de jovens conclua o ensino fundamental com graves lacunas na sua formação. Evidentemente, não será a escola de ensino médio que depois conseguirá mudar essa realidade. A propósito, o professor Tiago Bartholo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), observou, no evento do Estadão, que as perdas decorrentes da longa suspensão das aulas presenciais afetaram também as crianças da pré-escola, com déficit de cerca de um ano em seu desenvolvimento cognitivo. O atraso educacional cobra respostas emergenciais e duradouras. A menos que o Brasil queira manter seu até aqui interminável pacto com o subdesenvolvimento.