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Israel precisa decidir

O Hamas está quase neutralizado, mas, sem uma alternativa séria em Gaza, voltará mais forte

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Por Notas & Informações
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A legitimidade da estratégia do premiê israelense, Benjamin Netanyahu, se decompõe a olhos vistos. “Estamos lutando em vários fronts”, disse à sua coalizão. Mas poderia estar descrevendo a si mesmo. A frustração de aliados se transmuta em animosidade. Rusgas com Washington, com membros de seu partido e de outros na coalizão são cada vez mais frequentes.

Nesta semana, seu adversário centrista Benny Gantz, que integrara o governo de emergência, renunciou à sua posição no gabinete de guerra ante a relutância de Netanyahu em apresentar um plano para o pós-guerra. Logo depois, o gabinete foi dissolvido, numa manobra de Netanyahu para se esquivar das reivindicações dos ortodoxos e ultranacionalistas, que sustentam o governo, de ter mais influência no comando para avançar suas ambições maximalistas.

O racha agora é com as Forças Armadas. A tensão cresceu por meses. Seu chefe, Herzi Halevi, admitiu sua parte da responsabilidade pelo fracasso no 7 de Outubro. Netanyahu nunca admitiu a sua e tenta transferi-la para os militares, que se frustram com suas manobras para manter a isenção do serviço militar dos ortodoxos.

Nesta semana, contrariando Netanyahu, os militares instituíram pausas num corredor para escoar suprimentos a Gaza. O porta-voz do Exército, Daniel Hagari, torpedeou a retórica de “vitória absoluta” do governo. Segundo ele, o Exército está próximo de derrotar o Hamas, mas “a ideia de que é possível destruir o Hamas, fazê-lo desaparecer, é jogar areia nos olhos da população”, disse. “Se não trouxermos alguma outra coisa para Gaza, no fim das contas, teremos o Hamas.”

Uma patada como essa é sem precedentes em Israel e expõe o tamanho da crise. “Os militares veem uma falta de estratégia geral, uma rusga crescente com os EUA e incitação contra seus comandantes”, disse o general da reserva Gaid Shamni.

Para não contrariar seus aliados extremistas, Netanyahu continua a dizer “não” a um cessar-fogo e um governo da Autoridade Palestina em Gaza, e “não” a uma ocupação permanente, para não desagradar aos EUA e à oposição. Mas, à medida que as Forças Armadas se aproximam da neutralização do Hamas, essa ambiguidade se prova insustentável.

Seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, de seu partido, o Likud, tem vocalizado essa irritação. A relutância de Netanyahu, disse, está movendo Israel a dois resultados autodestrutivos: ou uma ocupação militar em Gaza ou o retorno do Hamas. “Pagaremos com sangue e muitas vítimas à toa, e com um preço econômico pesado.”

As justificativas de Netanyahu derretem, expondo sua intenção de perpetuar a guerra para sobreviver no poder e se furtar à prestação de contas pelo desastre no 7 de Outubro. O Exército está próximo de destruir as capacidades militares do Hamas. Mas sempre foi nonsense a parolagem sobre destruí-lo enquanto uma “ideia”. Essa ideia só existe em contraponto à agressividade israelense contra os palestinos, e voltará mais forte sem uma alternativa séria em Gaza. Se esse governo não é capaz de viabilizá-la, então é literalmente vital para Israel eleger outro.