Além de enfrentar os próprios desafios, o Brasil e dezenas de outros países continuarão expostos por longo tempo às consequências do aperto monetário adotado contra a inflação nos Estados Unidos e na União Europeia. Juros altos são o remédio mais empregado, no mundo capitalista, para conter a demanda, esfriar os negócios e frear a alta de preços. Aplicada em grandes economias, essa terapia acaba afetando os fluxos de capitais e o comércio internacional. O aperto ainda poderá aumentar, estender-se por 2023 e talvez chegar a 2024, segundo autoridades monetárias do mundo rico. Juros elevados no exterior dificultarão o afrouxamento no Brasil, onde o Banco Central (BC) já confronta pressões inflacionárias persistentes, em um ambiente de incertezas sobre a evolução das contas federais e da dívida pública.
O Federal Reserve (Fed, o banco central americano) talvez deva adotar uma política mais agressiva no próximo ano para derrubar mais prontamente a inflação, disse na segunda-feira o presidente do Fed de Saint Louis, James Bullard, membro do comitê responsável, em nível nacional, pela política monetária.
“Ainda há trabalho a fazer”, comentou no mesmo dia o presidente do Fed de Nova York, John Williams, também membro do comitê federal. Mesmo com a desaceleração dos preços, argumentou, a inflação ainda poderá ficar em 2023 na faixa de 3% a 3,5%, bem acima, portanto, da meta de 2%.
Diante desse risco, um aperto maior poderá ser necessário, indicou Williams. Essa observação reforça a hipótese de um aumento de 0,5 ponto porcentual na taxa básica, na próxima reunião do comitê de política monetária, prevista para dezembro. No início de novembro, uma alta de 0,75 ponto porcentual levou os juros básicos ao intervalo de 3,75% e 4%. Foi o quarto aumento consecutivo. A alta de preços tem sido menos vigorosa, nos últimos dois meses, mas a convergência para a meta ainda é incerta.
Espalhada por dezenas de países, a inflação tem sido impulsionada por choques de oferta associados, em grande parte, a desarranjos ocasionados pela pandemia, à política de covid zero aplicada na China e às consequências comerciais da invasão da Ucrânia por tropas da Rússia. Normalmente usadas para conter pressões inflacionárias alimentadas pela demanda, as políticas de aperto monetário têm-se revelado menos eficientes nos últimos tempos. As dificuldades têm sido atribuídas em parte a falhas das cadeias de oferta e às limitações da oferta de produtos básicos em momentos de tensão.
De toda forma, políticas de restrição monetária são as principais ferramentas para a contenção da alta de preços e continuarão sendo usadas. Também na Europa o aperto poderá aumentar. A presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, reafirmou nesta semana o compromisso de levar a inflação à meta (2%) e indicou novas altas de juros. Os efeitos colaterais obviamente serão sentidos em outros países, como no caso dos juros americanos. No Brasil, preparar-se para essa pressão deve ser uma das tarefas da equipe do futuro governo.