Próximo a completar dois anos, o governo de Jair Bolsonaro tem diante de si enormes desafios. O País atravessa uma forte crise social, econômica e sanitária, agravada por uma situação fiscal muito difícil e um cenário político fragmentado e conturbado. Além disso, as oportunidades perdidas e as confusões criadas ao longo da primeira metade do mandato não fornecem muitos motivos para otimismo em relação aos dois anos que faltam. Sem nenhum exagero, o quadro atual é preocupante. Veja-se, por exemplo, a situação do emprego. No trimestre terminado em agosto, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua registrou taxa de desemprego de 14,4%, o pior porcentual da série histórica, iniciada em 2012.
Com tal situação, pode-se ter a ideia de que os próximos dois anos estão inexoravelmente fadados ao fracasso. Vale, então, recordar o alerta feito pelo ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, em recente artigo no Estado (Faltam dois anos, 8/11). “Situações difíceis não são sinônimo (...) de falta de opções.”
Pedro Malan não falava de uma ideia alentadora, mas irreal. Referia-se concretamente ao dificílimo ano de 2016. “O governo Temer teve início sob situação extraordinariamente adversa. O investimento havia começado a declinar no terceiro trimestre de 2013, a recessão começara em abril de 2014. 2016 seria o terceiro ano de déficit primário e a pressão estrutural por gastos públicos era crescente”, lembrou. No entanto, mesmo com esse cenário, o presidente Michel Temer foi capaz de fazer opções. “A primeira, na área econômica, envolvia (...) escolher pessoas certas para posições-chave, que, por sua vez, pudessem atrair e reter outros profissionais competentes. Na área política, criar base de sustentação no Congresso e com isso definir agenda legislativa que atendesse a prioridades claras.”
As opções do governo de Michel Temer produziram resultados significativos para o País. Com apoio e coordenação do Executivo, o Congresso aprovou a PEC do Teto dos Gastos, a reforma trabalhista e a reforma do ensino médio. Ainda que não tenha sido votada a reforma da Previdência, o caminho político para sua aprovação foi efetivamente aberto, como se pôde constatar em 2019, com a Emenda Constitucional (EC) 103, alterando as regras previdenciárias.
Assim, a lição de 2016 revela que, por mais grave que seja a crise, o presidente da República sempre tem opções e caminhos possíveis. Essa realidade tem duas consequências imediatas. Em primeiro lugar, significa que o presidente Jair Bolsonaro não precisa simplesmente repetir o que fez na primeira metade do mandato. Ele pode fazer diferente. Se quiser, poderá adotar outras decisões, que gerarão outras consequências. Ou seja, o governo dos próximos dois anos não tem de ser mera cópia do que foi em 2019 e 2020.
Se o presidente Jair Bolsonaro quiser, ele pode ser nos próximos dois anos apoio efetivo para as reformas de que o País precisa. Ele pode, por exemplo, colaborar para que o Congresso faça uma boa reforma tributária e uma boa reforma administrativa. Pode também contribuir de forma decisiva para uma melhora da assistência social do Estado, melhorando a estrutura, a racionalidade e a eficiência dos programas sociais. E o mesmo se aplica a muitos outros temas, como saúde, educação, saneamento básico, infraestrutura logística, abertura econômica e inserção internacional do País nas cadeias de produção.
Em segundo lugar, o reconhecimento de que, mesmo na crise, existem opções para o governante significa assumir responsabilidades. Se os próximos dois anos não estão definidos – há caminhos de compromisso com o interesse público e há também caminhos de omissão, de populismo, de confusão –, o que ocorrerá na segunda metade do mandato não é decorrência apenas da pandemia, da crise econômica deixada pelo PT ou de decisões do Congresso. Será também, de forma muito direta, o resultado das opções que o presidente Jair Bolsonaro fizer.
Os caminhos estão disponíveis. Cabe ao presidente escolher como será o restante de seu mandato.