A compra do Twitter por Elon Musk é uma das maiores da história. Mas, se o impacto é grande em termos de negócios, parece ainda maior em relação à regulação da liberdade de expressão online.
O próprio Musk se diz menos interessado no negócio. “Eu não ligo para a economia em absoluto”, disse. “É só o meu senso forte e intuitivo de que ter uma plataforma pública que seja maximamente confiável e amplamente inclusiva é extremamente importante para o futuro da civilização.”
As reações foram igualmente hiperbólicas. Nos EUA, os conservadores, que se sentem perseguidos pelas Big Techs, estão radiantes; os progressistas, horrorizados. Para um articulista da revista Axios, Musk “está cada vez mais se comportando como um supervilão do cinema”. A senadora democrata Elizabeth Warren disse, em um tuíte, que “esse negócio é perigoso para a nossa democracia”.
Por trás destas esperanças e temores há uma legítima inquietação com a concentração de poder das Big Techs e a liberdade de expressão. Os governos e sociedades democráticas ao redor do mundo têm debatido formas de regulação para lidar com essas questões. A compra do Twitter não altera em nada a magnitude desse desafio, mas as ambições de Musk de utilizá-lo como um laboratório para provar suas convicções maximalistas sobre a liberdade de expressão podem trazer subsídios às instâncias reguladoras.
A ideia de Musk é que as publicações do Twitter são mais policiadas do que eram há alguns anos. De fato, há uma década as plataformas advogavam pela liberdade máxima dos usuários, alegando que não eram editoras. Em 2012, um gerente do Twitter o descreveu como “a ala da liberdade de expressão do partido da liberdade de expressão”.
O uso bombástico das redes por políticos como Donald Trump e a pandemia mudaram essa atitude. Em 2019 o Twitter removeu 1,9 milhão de postagens e suspendeu 500 mil contas. Em dois anos essa cifras cresceram, respectivamente, para 5,9 milhões e 1,2 milhão.
A filosofia de Musk é que, quanto mais livre e competitivo for o mercado público de postagens, mais a verdade prevalecerá. Mas não está claro o quanto ele está consciente das tensões entre a viralização dos conteúdos e a sua retidão. Anos de experiências das mídias sociais mostram que a competição por compartilhamentos e “likes” não tende naturalmente à verdade. “Maus protagonistas e más informações têm uma vantagem natural”, disse Tobias Rose-Stockwell, que pesquisa a influência da tecnologia sobre as emoções morais e consensos cívicos.
Ainda assim, algumas das principais ideias de Musk vão na direção proposta por muitos estudiosos para desintoxicar as redes, como a repressão aos spams por robôs e a autenticação dos usuários humanos. Ele promete ainda limitar a penalização de conteúdos inadequados com bloqueios focalizados em suspensões temporárias e mover as fontes de receita para mais longe da publicidade e mais perto das assinaturas.
Em um ambiente volátil como as redes sociais, é difícil prever se essas medidas darão certo. A mais intrigante delas, a transparência dos algoritmos de moderação, por exemplo, tem o potencial revolucionário de abrir o negócio aos competidores e aumentar o controle dos usuários. Por outro lado, há o risco de entregar aos mal-intencionados as ferramentas para explorar a plataforma. Dar aos usuários mais controle também pode aumentar a segregação.
Musk disse que “políticas para uma plataforma de mídia são boas se os 10% mais extremos na esquerda e na direita estão igualmente infelizes”. Isso pode ser ruim para os negócios, mas bom para a sociedade. Mais de 75% do conteúdo político no Twitter é gerado por 6% dos usuários, e a esmagadora maioria deles está nos extremos.
Ninguém duvida dos talentos de Musk para empregar as melhores descobertas científicas em bons negócios. Há uma crescente literatura científica sobre as disfunções políticas provocadas pelas mídias sociais. Se ele for capaz de empregar o melhor dessas pesquisas no Twitter, já será um passo relevante rumo ao “futuro da civilização”.