Se quiser mesmo consertar a economia brasileira e reencontrar o caminho do firme crescimento, o governo terá de promover a reindustrialização do País. A produção industrial encolheu 1,1% em 2019, depois de dois anos de expansão. O parque industrial brasileiro ainda é um dos nove ou dez maiores do mundo, mas está enfraquecido, atrasado e sem poder de competição depois de uma longa crise iniciada bem antes da última recessão. Houve um tombo de 18% entre o ponto mais alto da série histórica, atingido no trimestre encerrado em maio de 2011, e os três meses finais do ano passado. Olhando de baixo para cima, tem-se uma noção mais clara do esforço necessário para retornar ao topo. O volume produzido terá de crescer 21,9% sobre a base do último fim de ano para chegar de volta ao pico histórico.
Finda a recessão, o produto industrial cresceu 2,5% em 2017 e 1% em 2018 e voltou a cair no primeiro ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro. Só em março será conhecido o primeiro cálculo do Produto Interno Bruto (PIB) de 2019. As estimativas correntes têm apontado um crescimento entre 1,1% e 1,2%. O número oficial, de toda forma, refletirá o péssimo desempenho da indústria, já refletido na recuperação muito lenta do emprego, marcada pela informalidade e pela expansão de precárias ocupações por conta própria.
O desastre da mineração, sempre lembrado quando se comentam os números da indústria, explica apenas uma pequena parte do novo desastre. Houve queda na produção de bens de capital e bens intermediários e expansão de 1,1% na de bens de consumo. O exame mais detalhado mostra recuos em 16 dos 26 ramos de atividades cobertos pela pesquisa, em 40 dos 79 grupos e em 54,2% dos 805 produtos incluídos no levantamento regular.
Em todos os trimestres de 2019 o desempenho foi pior que o de um ano antes. Esse tipo de resultado ocorreu desde os três meses finais de 2018. Mas o novo governo nada fez, durante a maior parte de seu primeiro ano, para tentar pelo menos conter o declínio da indústria. Os primeiros estímulos só foram aplicados a partir de setembro, embora os números da produção e os dados do emprego fossem muito ruins.
Evitar mais um voo de galinha foi a justificativa repetida por muitos integrantes do Executivo, quando se tentou chamar sua atenção para o problema. Mas essa desculpa deixou de valer quando se tornou indisfarçável a necessidade urgente de algum incentivo. O acesso a recursos do Fundo de Garantia (FGTS), iniciado em setembro, acabou sendo prorrogado em novas condições.
Se as projeções do mercado estiverem certas, a produção industrial crescerá 2,21% em 2020 e 2,50% em cada um dos três anos seguintes. O resultado será um crescimento acumulado de 7,4% em 2020, 2021 e 2022, fim do atual mandato presidencial. No primeiro ano do mandato seguinte a indústria produzirá 2,50% a mais. Faltará quase metade do caminho para o retorno ao pico de 2011, se se tratar apenas de recompor o volume produzido.
Mas o problema é muito mais complicado. Além das perdas de produção, a indústria acumulou em muitos anos – pelo menos desde 2012 – um enorme atraso em termos de tecnologia, de inovação e, portanto, de competitividade. Isso é visível no comércio exterior. Em 2000 as vendas de manufaturados corresponderam a 59% do valor exportado. Em 2009 a proporção estava reduzida a 44%. A partir daí a participação foi sempre inferior a 40%, exceto em 2016, quando esse número foi registrado. Em 2019 a parcela dos manufaturados caiu para 35%, a menor taxa desde o ano 2000.
De vez em quando algum membro do governo fala de produtividade e competitividade, mas sem apresentar mais que vagas intenções e ideias. A expressão política industrial é evitada como blasfêmia. O discurso é geralmente um recitativo com tinturas de liberalismo econômico e nenhuma referência clara a planos, metas e instrumentos. Diante disso, até as modestas projeções de crescimento industrial conhecidas chegam a parecer otimistas.