O governo do Estado de São Paulo anunciou um plano de reestruturação da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), que inclui a criação do Fundo Estadual da Habitação, corte de pessoal, extinção de escritórios regionais e fiscalização das empreiteiras que constroem conjuntos habitacionais populares. Com isso, o governo pretende coibir fraudes, reduzir gastos e melhorar o atendimento à população. A medida é correta, mas tardia. Desde 1998 a CDHU é alvo de 102 processos na Justiça, nos quais o Ministério Público Estadual (MPE) pede a devolução de pelo menos R$ 1,1 bilhão aos cofres públicos por supostos contratos irregulares firmados com prefeituras e empreiteiras. Há dois meses, o MPE e a Polícia Civil deflagraram a Operação Pomar, que revelou um esquema de superfaturamento e fraudes em licitações para a construção de casas em 23 municípios. O grupo de fraudadores atuava há sete anos e causou rombo estimado de R$ 40 milhões. A prática criminosa foi descoberta a partir do exame do livro-caixa da empreiteira FT Construções, cujo dono, o engenheiro civil Francisco Emílio de Oliveira, é conhecido como Chiquinho da CDHU, por seu estreito relacionamento com a companhia. Ele foi preso e responde por crime de formação de quadrilha e fraudes contra a lei de licitações. A denúncia envolve prefeitos, vereadores, empresários, diretores da CDHU e o ex-líder do PSDB na Assembléia Legislativa Mauro Bragato, ex-secretário da Habitação do Estado no governo Geraldo Alckmin. No livro-caixa da construtora havia 30 anotações com as iniciais MBR ao lado de valores que somavam R$ 104 mil, pagos entre 2003 e 2005. Junto dos valores havia a sigla QLN que, segundo funcionários da empresa, significava "quanto levo nisso". Na semana passada, Mauro Bragato pediu afastamento do cargo de líder do partido. A oposição protocolou um pedido de CPI para investigar o caso. Pressionado, o governo estadual anunciou o desmonte da CDHU, uma empresa que tradicionalmente teve seus cargos negociados em troca de apoio político e os serviços prestados à população sempre seguiram o calendário eleitoral em detrimento da qualidade do atendimento. Pelo menos 30% dos conjuntos da CDHU têm problemas fundiários. São 115 mil beneficiados que já quitaram suas dívidas com a companhia, mas não conseguem a escritura por causa de irregularidades dos lotes. Além disso, as unidades habitacionais em geral são mal projetadas e mal construídas. Em maio de 2006, um buraco de cem metros engoliu casas num conjunto habitacional construído em Ribeirão Bonito. Em Americana, casas erguidas em 2004 apresentaram, dois meses depois de entregues, problemas graves de infiltração e falhas nas instalações elétrica e hidráulica. No ano passado, em Santo André, um conjunto habitacional foi entregue tendo como único acesso uma escadaria de 210 degraus. O primeiro passo anunciado pelo governo para pôr fim aos abusos será o envio da proposta da criação do Fundo Estadual da Habitação à Assembléia. Assim, a CDHU deixará de receber recursos do orçamento para a construção de moradias, que passariam a ser administrados pelo fundo. Segundo o secretário da Habitação, Lair Krähenbühl, a CDHU também deixará de elaborar a política habitacional, que passará a ser planejada pela Secretaria. A companhia será o braço operacional dos projetos. Em artigo publicado no site do Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores, o deputado Simão Pedro informa que já existe projeto de lei com a mesma proposta, pronto para ser votado no Legislativo. Segundo ele, o Fundo permite que prefeituras, associações e cooperativas proponham projetos mais adequados às suas realidades. O desmonte da CDHU seguirá com a desativação de 5 dos 11 escritórios regionais no interior, com o corte de 40% do quadro de funcionários e com a contratação de 8 empresas para fiscalizar as empreiteiras. As medidas devem ser colocadas em prática com urgência. Tanto quanto a devida punição àqueles que por anos se beneficiaram da farra da CDHU.