Enquanto o governo Bolsonaro continua mandando para o Congresso projetos mal formulados, muitos deles tratando de questões menores e com forte viés ideológico, na Câmara dos Deputados um grupo de parlamentares de diferentes partidos políticos e correntes ideológicas decidiu fazer justamente o contrário, apresentando projetos consistentes e oportunos.
Um deles é o Projeto de Lei Complementar n.º 146, que foi apresentado em 2019 e acaba de ser convertido na Lei Complementar n.º 182. A iniciativa desses deputados teve por objetivo melhorar o ambiente de negócios no País. A nova lei estabelece o marco legal para as empresas de base tecnológica e também cria mecanismos que facilitam seu desenvolvimento e sua consolidação. Também chamada de marco legal das startups e do empreendedorismo inovador, a Lei Complementar n.º 182/21 entra em vigor justamente num período de forte expansão dessas empresas.
Atualmente, há mais de 13 mil startups funcionando no País – cerca de 20 vezes mais do que há dez anos, quando começou a discussão sobre formas de regulamentação das pequenas empresas com atuação voltada para o desenvolvimento de inovações aplicadas a produtos, serviços ou modelos de negócios. A ideia é que a Lei Complementar 182/21 favoreça os negócios que estão sendo criados nos mais variados setores da economia, permitindo-lhes receber recursos de pequenos e de grandes investidores. A nova legislação também prevê que universidades e organizações sem fins lucrativos nas áreas de ciência e tecnologia gerenciem as startups em algumas dessas etapas. Isso é fundamental para que elas possam transpor o estágio entre o desenvolvimento de suas inovações e sua consolidação comercial.
Entre outras inovações, o marco legal das startups concede a essas empresas prioridade na análise de registro de marcas e pedidos de depósito de patentes pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Também permite que as grandes empresas obrigadas a investir em pesquisa e desenvolvimento, como as do setor de petróleo e de gás, invistam em startups por meio de fundos patrimoniais ou de fundos de investimento voltados para a aquisição de participações no processo de inovação tecnológica.
Além disso, a Lei n.º 182/21 regulamenta o papel dos investidores que aplicam recursos em pequenas empresas nascentes, confiando em seu potencial de crescimento. Ainda que esses investidores possam receber uma remuneração periódica, eles não têm o status legal de sócios nem direito a ingerência ou voto na gestão do negócio. Por isso, em caso de falência não responderão por qualquer obrigação da empresa, o que lhes dá a segurança de que necessitam para investir.
Outra inovação é a criação de um regime especial de contratação de soluções inovadoras pela administração pública, por meio de licitações. No processo seletivo, as propostas terão de ser submetidas a uma comissão formada, entre outros, por um servidor público da área para a qual o serviço está sendo contratado e por um professor de instituição pública de ensino superior ou técnico. Essa é uma estratégia já adotada em países com sistemas de inovação já consolidados, como os Estados Unidos. Ela se baseia na premissa de que é mais eficiente o poder público realizar encomendas específicas às startups do que oferecer subsídios esperando que elas tenham sucesso em seus projetos de inovação.
Nos centros de pesquisa, nas universidades e nos meios empresariais, pesquisadores, professores e executivos afirmam que o marco legal das startups poderia ter sido mais ousado em alguns pontos, principalmente em matéria de regime fiscal e estrutura societária. Mas elogiam a determinação dos autores do projeto, que souberam superar antagonismos ideológicos, ouviram todos os setores interessados e conseguiram apresentá-lo e aprová-lo num período de apenas dois anos. E também são unânimes ao reconhecer que esses deputados agiram com sensatez e determinação ao criar um padrão de segurança jurídica que é fundamental para o funcionamento da economia brasileira.