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O resultado possível da conferência do clima

COP-29 gerou frustração no financiamento para os países mais pobres enfrentarem as mudanças climáticas e impôs desafios extras à COP-30, no Brasil. Mas isso não significa desesperança

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Por Notas & Informações
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A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-29) deste ano, realizada em Baku, no Azerbaijão, definiu uma nova meta de financiamento climático: US$ 300 bilhões anuais, até 2035, será o valor pago pelas nações ricas para os países em desenvolvimento enfrentarem as mudanças climáticas. A cifra não é muito maior do que a meta anterior (de US$ 100 bilhões) e está muito aquém do necessário, segundo projeções internacionais. O pessimismo já era evidente, mas o desfecho foi considerado frustrante e inspirou análises sombrias sobre a falta de vontade política, a ausência de uma liderança central que promovesse uma concertação eficaz e a indefinição de como virão os recursos e como serão aplicados.

Apesar disso, convém cautela para que o mundo não embarque nem no catastrofismo nem no desespero, não só porque um impasse favoreceria a inércia dos negacionistas, mas também porque há avanços em curso que precisam ser registrados. É o caso dos movimentos regulatórios do mercado de carbono, do estímulo crescente à descarbonização, dos novos mecanismos pensados para reduzir o risco climático em países em desenvolvimento e até mesmo as mudanças na arquitetura financeira global, de modo a fazê-la suportar a pressão que a emergência climática trará nas próximas décadas.

Previsivelmente, ambientalistas consideraram a COP-29 um fracasso, uma “sentença de morte para inúmeras pessoas”, segundo palavras da ativista Greta Thumberg. Um impotente secretário-geral da ONU, António Guterres, disse que esperava um resultado “mais ambicioso”, enquanto alguns dos principais arquitetos do multilateralismo climático – como Ban Ki-moon, ex-secretário-geral da ONU, e Christiana Figueres, ex-secretária executiva da organização guarda-chuva da COP, a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – chegaram a criticar o processo, pedindo uma reforma para uma governança que seja “mais adequada ao propósito”.

As críticas acabaram amplificadas pela simbologia de 2024, que deve ser o ano mais quente já registrado. Mas não dá para avaliar a COP-29 desconsiderando o seu contexto. As negociações em Baku começaram afetadas pela eleição de Donald Trump nos EUA. Ele, afinal, promete iniciar seu mandato tirando o país do Acordo de Paris e até da Convenção do Clima. Com isso, o peso das finanças recaiu sobre a União Europeia, que não quer arcar sozinha com o financiamento climático do mundo em desenvolvimento, sobretudo diante das crises que o bloco enfrenta, como a ascensão de forças de direita explicitamente hostis à pauta climática, a instabilidade política e econômica na Alemanha e uma França em crise orçamentária.

E há a China, cuja responsabilidade pelas mudanças climáticas tornou-se incontroversa. O modelo, desenhado em 1992, é hoje um contrassenso. O financiamento caberia aos países ricos e industrializados, enquanto países como China, Índia e Arábia Saudita ainda são classificados como “em desenvolvimento” pela Convenção-Quadro das Nações Unidas, todos protegidos sob o manto do tal “Sul Global”. Hoje, no entanto, essa distinção não faz mais sentido. Primeiro pela potência que a China é. Segundo porque os chineses geram hoje praticamente o dobro de emissões dos EUA e é responsável por 90% do crescimento das emissões de carbono desde 2015. Ainda que a China tenha fornecido dinheiro para outros países em desenvolvimento e seja um líder global em investimento e expansão de energia limpa, faltam-lhe compromisso e transparência.

Esse é um dos vespeiros com os quais o Brasil e os outros países precisarão lidar até a COP-30, que ocorrerá em Belém (PA), em 2025. A palidez da COP-29 exigirá mais da COP-30, com a presidência brasileira, não só para ajudar a restaurar as negociações climáticas, como também para retomar a confiança no regime multilateral, que saiu de Baku com mais fraturas. No Azerbaijão, o ditador local, Ilham Aliyev, elogiou o petróleo como um “presente de Deus”. No Brasil, o presidente Lula da Silva e a ministra Marina Silva precisarão mostrar que o País tem mais a oferecer do que belas palavras em favor da transição. Não haverá vida fácil até lá, mas ainda assim os prognósticos estão longe de resumir-se a um horizonte sombrio e desesperançado.