O retrato captado pelo estudo Investimento e estoque de capital da indústria de transformação – 1996 a 2021, da Fiesp, exibe um setor claudicante, incapaz de conter a depreciação de seu parque fabril. Com base em dados estatísticos do IBGE, pela primeira vez foi calculado o volume de investimentos necessários para recuperar a competitividade da indústria de transformação: R$ 456 bilhões ao ano, por cerca de dez anos consecutivos, como mostrou reportagem do Estadão. E isso apenas para voltar ao patamar de cinco décadas atrás.
É desalentador verificar em detalhes como vem definhando o segmento mais estratégico da indústria. Aquele que, por transformar matérias-primas em bens de consumo e equipamentos, tem a particularidade de difundir o crescimento por diversos outros setores. Em pouco mais de duas décadas, a indústria de transformação, que respondia por 20,9% do total dos investimentos industriais do País, minguou para 12,9% em 2021, último dado disponível. E, pelos sinais que vêm sendo observados, não para de encolher.
São indícios largamente conhecidos os da deterioração da produção industrial brasileira. Tanto que suscitaram, há pouco mais de quatro meses, uma análise publicada neste jornal pelo presidente da República, Lula da Silva, e seu vice, Geraldo Alckmin. No artigo Neoindustrialização para o Brasil que queremos (25/5/23), ambos reconheceram que o País está “perdendo a corrida da sofisticação produtiva” ao cair da 25.ª para a 50.ª posição no ranking de complexidade da economia.
O mês era maio, e o artigo, acompanhado do anúncio da elaboração de um plano para reativar a indústria, teve ampla repercussão. Aos elogios pela iniciativa somaram-se críticas pela falta de menção a pontos importantes, como produtividade, pesquisa e desenvolvimento e qualificação de mão de obra. O fato é que o calendário avançou para outubro e ainda não se tem qualquer informação concreta sobre a tal proposta de neoindustrialização.
Ao mapear os baques que a indústria de transformação vem enfrentando nas últimas décadas, o estudo da Fiesp não faz referência a um plano específico que tenha o condão de restituir o papel de condutor da economia ao segmento. Que isso sirva para dissuadir o governo da adoção de soluções mágicas de curto prazo, como subvenções esdrúxulas, crédito direcionado e protecionismo exacerbado – o velho cardápio do subdesenvolvimento.
Em vez de defender incentivos governamentais, como já se tornou tradicional, o documento da Fiesp cita uma medida bem mais simples e objetiva: a necessidade de fazer avançar as reformas estruturais, em especial a tributária, com a fixação da alíquota máxima de 25% para o Imposto sobre Valor Agregado (IVA).
Esperada há pelo menos 30 anos, a reforma tributária parecia tramitar a contento com a aprovação no plenário da Câmara, apesar das inúmeras modificações no texto. Agora está emperrada no Senado. A cada arranjo parlamentar, o que se vê é uma reforma mais imperfeita, mas que, diante da barafunda tributária em vigor, com certeza ainda contribuirá para reduzir o famigerado custo Brasil.
Esse deve ser o objetivo a perseguir, e não medidas pontuais do tal “Estado indutor”, como defende Lula da Silva. Não há incentivo a este ou aquele setor que garanta competitividade a longo prazo. E é preciso investir muito para começar a notar algum avanço. Hoje, o que é aplicado na indústria de transformação corresponde a parcos 2,6% do PIB. Precisa chegar, ao menos, a 4,6%.
Além disso, tem de haver espalhamento da aplicação de recursos em inovação e tecnologia na indústria de transformação. Hoje, o setor de petróleo e biocombustíveis concentra um terço desse capital. É necessário irradiar o investimento para mais setores da indústria, inclusive para melhorar a renda do mercado de trabalho que, no ano passado, chegou ao menor nível dos últimos dez anos.
O PIB de 2023 estaria comprometido sem o avanço extraordinário do agronegócio, um setor que conta com política pública como o Plano Safra, que se reverte em contínua modernização. O País carece também de uma política industrial eficaz.