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Oposição exemplar

Regime venezuelano agenda eleições regionais e legislativas; oposição acerta ao sugerir boicote

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Por Notas & Informações

O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela, o mesmo que legitimou a vitória fraudulenta do ditador Nicolás Maduro na disputa presidencial de 2024, convocou para 27 de abril eleições regionais e legislativas no país sul-americano.

Elvis Amoroso, o preposto de Maduro à frente do CNE, afirmou que os candidatos a governador e congressista devem assinar documento no qual se comprometem a “respeitar e acatar todos os eventos relacionados às eleições”, o que inclui os resultados emitidos pelo conselho. Tradução: concordam em ser atores na nova farsa eleitoral promovida pelo regime Maduro.

Principal expoente da oposição venezuelana, María Corina Machado defende que, enquanto os resultados das eleições presidenciais de julho do ano passado não forem respeitados, não faz sentido participar de nenhum tipo de pleito.

“Votar uma vez ou outra sem que os resultados sejam respeitados não é defender, é desvirtuar o voto popular como meio de luta democrática”, afirmou Corina em vídeo nas redes sociais.

A líder oposicionista está corretíssima. Corina nunca ficou chorando pelos cantos, como sugeriu o presidente Lula em uma de suas declarações mais infelizes sobre a Venezuela, e sabe por experiência própria que Maduro usurpa o conceito de eleições para aferrar-se cada vez mais ao poder com um falso verniz de legitimidade.

Impedida de enfrentar o autoritário líder nas eleições presidenciais de 2024, ela foi à luta e cerrou fileiras em torno de Edmundo González Urrutia, que agora é caçado pelo regime de Maduro e vive no exílio.

Ocorre que, como demonstraram inequivocamente instituições como o Carter Center, as eleições venezuelanas foram fraudadas; em vez de viver no exílio, González Urrutia era quem deveria estar no Palácio de Miraflores, no lugar de Maduro.

Levou quase uma eternidade para que a oposição venezuelana demonstrasse maturidade para lidar com os arroubos populistas de Hugo Chávez e de Maduro, o afilhado político do já falecido paladino do “Socialismo do Século 21”.

Liderada por María Corina, porém, a oposição vem comportando-se de forma exemplar, apesar de todos os empecilhos criados pelo regime.

A união em torno da candidatura de González, em uma eleição que Maduro só convocou por ter a certeza de que eleito ou não permaneceria no poder, acabou por expor de forma inequívoca ao mundo, se ainda havia dúvidas, que a Venezuela é uma ditadura. A eleição fraudada também criou embaraços para líderes como Lula, agressivo com Corina, mas complacente com o companheiro.

Como fez tudo o que lhe competia e mesmo assim foi roubada no processo eleitoral, realmente não cabe mais à oposição participar de novos pleitos na Venezuela enquanto o regime de Maduro perdurar.

O boicote agora é estratégico e contribui para que as atenções se voltem aos desmandos de Maduro, acusado de torturar opositores que questionaram a fraude eleitoral.

Não dar palco ao ditador de Miraflores é lição que líderes que relativizam o conceito de democracia para defendê-lo, como Lula, deveriam aprender.