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Pouco a comemorar

Índice de homicídios no País caiu em 2023, mas segue 4 vezes maior que o mundial

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Por Notas & Informações
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O País recebeu com alívio alguns números apresentados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública, mas há poucos motivos para comemoração. A violência persiste na sociedade. Serão longas ainda as batalhas para que o Brasil vença a criminalidade. Os dados sobre homicídios mostram que há muito a ser feito.

Em 2023, foram 46.328 assassinatos, uma taxa de 22,8 casos para cada 100 mil habitantes – queda de 3,4% ante o indicador do ano anterior. Trata-se do menor registro da série histórica do levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, iniciada em 2011. A taxa de homicídios no País, porém, é quatro vezes maior que a mundial, além de superar a de países vizinhos. Isso, por si só, expõe a dificuldade do Brasil no combate ao crime.

Para Renato Sérgio Lima, presidente do Fórum, “a boa notícia é que na maior parte dos países as mortes vêm caindo e, entre as grandes causas, há um componente demográfico importante, já que a população está envelhecendo”. A parcela de homens jovens – sobretudo os negros – concentra as vítimas de mortes violentas. Até a idade da população virou uma esperança para refrear as estatísticas.

Enquanto São Paulo (7,8 por 100 mil) e Santa Catarina (8,9) trazem os menores índices do País, as maiores taxas foram registradas no Amapá (69,9) e na Bahia (46,5), onde o Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV) disputam territórios para consolidar novas rotas de envio de cocaína por via marítima para o exterior. Nesses Estados, o crime organizado e a letalidade policial escancaram um cenário de embate constante com consequências trágicas.

As polícias do Amapá e da Bahia, na avaliação de Lima, atuam de forma tumultuada. Não à toa, no topo do ranking, os dois Estados alcançam as taxas de letalidade policial de 23,6 e 12 mortes por 100 mil habitantes, respectivamente, revelando uma distância superlativa em relação a Rondônia (0,6) e Minas Gerais (0,7).

Além de migrar pelo País, o crime também migrou para o mundo virtual, para infortúnio dos cidadãos. Os bandidos têm preferido dar golpes virtuais a cometer crimes nas ruas, aproveitando-se do Pix, de aplicativos e de jogos online. Enquanto houve queda em furtos e roubos – inclusive de celular –, há alta no número de estelionatos, o que impõe às polícias o dever de aperfeiçoar seus recursos tecnológicos.

A violência contra as mulheres também preocupa. Houve crescimento nos números de estupro, importunação sexual e feminicídio. A tipificação de novos crimes, como stalking (perseguição), e campanhas para reduzir a subnotificação explicam parte da alta, mas o aumento generalizado acende o alerta de que ações para reverter esse quadro devem ser prioritárias.

O anuário mostra um crime organizado que se antecipa facilmente à inteligência dos órgãos de investigação e repressão e aos sistemas de defesa privados. Há claramente uma migração da delinquência para o ambiente virtual – que, se reduz a letalidade dos criminosos, por outro lado aumenta substancialmente os prejuízos e dá ainda mais poder financeiro às quadrilhas, contrastando com a excruciante lentidão do Estado.