Dados da Europa confirmam o bom desempenho dos países do sul, especialmente das quatro maiores economias, Itália, Espanha, Portugal e Grécia. As três últimas cresceram em 2023 mais que o dobro da média da zona do euro. Coletivamente, desde 2017 os quatro superaram o crescimento da economia alemã – a maior do bloco – em 5%.
É um fenômeno nada trivial. A distância histórica entre o Sul e o Norte se ampliou na crise dos anos 2008-2012. A combinação de recessão e austeridade espremeu suas economias. A tentação populista brotou forte. A União Europeia correu risco de fragmentação. Mas o eleitorado e seus representantes souberam extrair da frustração um zelo reformista que agora dá frutos.
A solidariedade foi importante. Tanto na crise financeira quanto na pandemia, Bruxelas liberou generosos fundos de recuperação, mas com contrapartidas de austeridade. Os países do sul reduziram a burocracia e os impostos corporativos, flexibilizaram leis trabalhistas para incorporar novas modalidades de emprego e reduziram dívidas e déficits. Os investimentos voltaram, as exportações aumentaram e o desemprego caiu. O apoio do norte rendeu dividendos: a expectativa de manutenção do ritmo de crescimento do sul em 2024 tem permitido ao Banco Central Europeu sinalizar cortes nos juros.
O sucesso não é monopólio de algum espectro político. Ao contrário, ele mostra o efeito benigno da sobreposição de dogmas ideológicos pelo pragmatismo. Em Portugal e na Espanha, o equilíbrio fiscal foi conquistado por governos socialistas. Na Itália, a centro-direita de Mario Draghi promoveu políticas anticíclicas fiscalmente mais frouxas, com isenções tributárias que impulsionaram a indústria de construção. Ao mesmo tempo, a generosidade excessiva da previdência foi disciplinada, e o atual governo, mais conservador, está cortando gastos para reduzir a dívida.
A Grécia é especialmente instrutiva, pela sua regeneração não só econômica, mas política. À beira da insolvência, radicais de esquerda advogavam dobrar a aposta do expansionismo fiscal, pondo em risco a permanência na zona do euro. Eles chegaram a montar uma coalizão com a extrema direita em 2015. Ainda em 2019, quando o eleitorado exausto deu um voto de confiança à centro-direita liderada por Kyriakos Mitsotakis, o país era o “homem doente da Europa”.
Em artigo na revista The Economist, Mitsotakis explicou sua “lógica triangular”: “Pró-crescimento, mas fiscalmente responsável; robusta em imigração e assertiva em segurança, junto com uma política externa forte; e socialmente liberal em casa”. Em especial na economia, o governo focou em corte de impostos, apoio a empreendedores e reformas de mercado para atrair investimentos. As agências de crédito premiaram a responsabilidade fiscal, restaurando o grau de investimento. Os investidores responderam e o eleitorado também, reelegendo Mitsotakis.
“No fim, o baluarte mais importante contra o populismo é ouvir e realizar”, disse o premiê grego. Mas é também reconhecer seus erros e ser sincero com a população. “Trata-se de explicar por que, por exemplo, um grau de investimento não é só sobre agradar mercados – é sobre custos mais baixos de empréstimos para hipotecas –, ou por que é importante atrair investimentos estrangeiros para criar empregos mais bem pagos.” Ao conceder em 2023 o prêmio de País do Ano à Grécia, a Economist explicou: “A Grécia mostra que da beira do colapso é possível implementar reformas econômicas duras e sensatas, reconstruir o contrato social, exibir um patriotismo moderado – e ainda vencer eleições”.
As economias do sul estão longe de ser perfeitas: ainda há uma distância do norte, o desemprego ainda não caiu a níveis satisfatórios e as reformas têm um longo caminho à frente. Mas, por ora, elas deixam lições valiosas para uma Europa a caminho das eleições e para países como o Brasil, ainda capturado pela polarização populista. Combinar equilíbrio fiscal, responsabilidade social e crescimento não só é possível, como necessário para o desenvolvimento sustentável e a pacificação social.