O baque do valor da Petrobras na bolsa após o anúncio da aprovação de mudanças no estatuto pelo Conselho de Administração não foi à toa. Mais do que o temor de ganhos menores na distribuição de dividendos, o mercado financeiro enxergou o retrocesso embutido na medida. O atual comando da petroleira prepara a abertura de um buraco na blindagem da empresa para liberar a passagem da ingerência política e sua deturpada estratégia de fazer da Petrobras um instrumento a serviço dos interesses do governo.
Alterar o estatuto reformulado há seis anos para dotar a companhia de parâmetros rigorosos de governança diante dos estragos escancarados pela Lava Jato é, por si só, uma atitude controversa. O fato de ocorrer durante um governo petista, mesma gestão que esteve na origem do escândalo que transformou a Petrobras em vítima de um dos maiores casos de corrupção do mundo, piora a situação. Por fim, pinçar no estatuto artigos que cercam de cuidados a escolha dos administradores responsáveis pela condução da empresa deixa patente o caráter político da medida.
Aprovado em abril de 2017, o estatuto seguiu as diretrizes da Lei das Estatais, sancionada no ano anterior. Além de filtrar indicações de integrantes do Conselho de Administração e diretoria executiva, exigindo, por exemplo, quarentena para líderes partidários e sindicais e excluindo a possibilidade de participação de integrantes do governo, o novo regulamento tornou explícita a responsabilidade individual de conselheiros e diretores por atos que, de alguma forma, acarretem prejuízos à empresa.
A triste realidade brasileira revela que estatais sempre estiveram à mercê de uso político, seja para promover compadrios, favorecer esta ou aquela região com obras – necessárias ou não – ou adotar estratégias que tragam retorno político e/ou financeiro aos apadrinhados. A Lei 13.303, ou Lei das Estatais, procurou resguardar minimamente essas empresas padronizando procedimentos de contratação e adotando novas modalidades de licitação pública.
Misto de estatal e empresa privada, a Petrobras ficou no meio do caminho, mas procurou, por via estatutária, adequar-se à nova realidade. Recorre, porém, a inúmeros artifícios para driblar as obrigações. A mudança na política de preços é uma delas. Em maio, numa confusa explicação, o presidente da empresa, Jean Paul Prates, disse que não haveria mais paridade internacional, as referências do mercado seriam o custo alternativo do cliente e o valor marginal da Petrobras. Noves fora, o critério de reajuste passou a ser desconhecido. E não há como desvincular a ingerência na política de preços dos prejuízos amargados por quatro anos a partir de 2014.
Outro estratagema permitiu a nomeação de dois conselheiros que haviam sido rejeitados pelo órgão interno de governança. Uma liminar do então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, em decisão monocrática, permitiu que a norma fosse driblada. Agora, com o novo estatuto, o comando da Petrobras pretende perpetuar a firula.