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Procurador de Justiça no MPSP, doutor em Direito pela USP, escritor, professor, palestrante, é idealizador e presidente do Instituto 'Não Aceito Corrupção'

Opinião | A guerra em Israel e a falência da ONU

A organização perdeu a força, seu modelo está superado, refém de egoísmos e das grandes potências. Urge reformá-lo

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Amanhã fará um mês do ataque a Israel pelo Hamas, que prega, sob patrocínio velado do Irã, a destruição do Estado israelense e o extermínio dos judeus. Aconteceu diante da iminência do acordo de paz entre Israel e Arábia Saudita, que os terroristas quiseram sabotar, pois poderia contribuir futuramente para a paz entre judeus e palestinos.

Aproveitou-se o Hamas da decadência política de Binyamin Netanyahu (Bibi), que, após enfrentar seguidas acusações de corrupção, na contramão do interesse dos israelenses, estava em vias de implantar, com autoritarismo, reforma judiciária que enfraqueceria a Suprema Corte, abalando a separação dos Poderes.

O Jerusalem Post divulgou pesquisa de opinião, uma semana após o ataque, revelando que para 86% dos israelenses ouvidos Bibi é o maior responsável pela falha de segurança da qual se aproveitou o Hamas. Para 56%, Bibi deverá retirar-se do cargo ao fim da guerra, porque mais da metade dos entrevistados não confia nele para conduzir a operação. Bibi parece estar com os dias contados em Israel.

Ou seja, judeus israelenses têm vivido drama político e, agora, em razão do ódio, por estarem em Israel, na mira de uma horda que quer metralhar judeus em geral, indiferente ao fato de que os ataques a civis indefesos são definidos como crimes contra a humanidade. Relativizar atos terroristas do Hamas equivale a apoiar o antissemitismo.

Israel deseja a paz e o Hamas, sabotar a paz, mantendo mais de 200 reféns judeus sequestrados, torturados e estuprados, exibidos como troféus nas redes sociais, pouco se importando os extremistas com vidas palestinas. Este cenário terrível não desobriga Israel, obviamente, por outro lado, a respeitar corredores humanitários para preservar civis vulneráveis. Afinal, Israel guerreia contra o Hamas, e não contra o povo palestino.

Ao fim da 2.ª Guerra Mundial, a ONU foi criada em nome da preponderância do interesse da civilização. A seguir, em 1947, por meio da resolução 181, fundou-se Israel, para coexistir com a Palestina, na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Mas, menos de 24 horas após sua fundação, em 1948, Israel já foi atacado simultaneamente pelos exércitos do Egito, da Jordânia, da Síria, da Líbia e do Iraque. Lá a vida nunca foi tranquila.

Nestas quase oito décadas, a Terra vem se tornando um planeta cada vez mais conflituoso, agressivo, xenófobo, racista, intolerante e permeável a toda espécie de ódio. E mais: países adquiriram a condição de potência nuclear, o que equivale a dizer que muitos já podem apertar o botão, colocando a humanidade em risco.

Os conflitos bélicos se alastraram, a ponto de termos tido 238 mil mortes por guerras em 2022, sendo 83 mil na guerra na Ucrânia e 100 mil na guerra do leste da África. Gastam-se por ano no mundo, em razão da violência, US$ 17,5 trilhões, o que equivale a 13% do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo, ou seja, R$ 10 mil por indivíduo, o que resolveria o problema global da fome e da miséria.

Antes de 7 de outubro, já assistíamos com inadmissíveis letargia e assimilação natural à guerra na Ucrânia, que ocorre há mais de um ano e oito meses, onde dezenas de milhares de pessoas já foram mortas. Mesmo assim, a Rússia se arvora em sua poderosa posição de detentora de assento permanente no Conselho de Segurança da ONU e propôs resolução para o conflito em Israel.

Não atribuindo ao Hamas a devida responsabilidade pelo início do conflito nem reconhecendo o justo direito de autodefesa a Israel, a resolução era fadada ao insucesso e não foi aprovada, tendo mais abstenções. Surreal estar em guerra há tanto tempo e querer ditar com arrogância ao mundo o caminho da paz e da proteção humanitária que a Rússia não pratica.

Por outro lado, a proposta brasileira foi vetada pelos EUA e a dos EUA, vetada por Rússia e China. O poder de veto é direito assegurado a potências nucleares – além das três, França e Reino Unido. Guerra de vetos no Conselho de Segurança.

Os mesmos EUA, aliás, que compraram o sêxtuplo das vacinas para covid-19 em relação àquilo que seria necessário para imunizar sua população inteira na pandemia, enquanto os pobres da África miserável morriam indefesos, sem vacinas nem recursos disponíveis, diante da inércia da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da ONU.

Resumo da ópera, em meio a votos e vetos: milhares de civis mortos e não há resolução do Conselho de Segurança da ONU, que deveria ser aprovada de imediato. Há algo muito errado. O que se deliberou não passa de fraca, tardia e ineficaz recomendação da Assembleia-Geral, três semanas após o início do conflito.

As guerras infindáveis na Ucrânia, no Oriente Médio e no leste da África, guerras que flagelam hoje um quarto da população do planeta, e a compra de vacinas por potência global desprezando as necessidades das demais nações, lamentavelmente, evidenciam a falência do sistema de operação da ONU. Ela perdeu a força, seu modelo está superado, refém de egoísmos e das grandes potências.

Urge reformar o modelo, renunciando a parte dos interesses de cada nação integrante, em prol da sobrevivência da civilização. Deve-se rever o poder de veto, diante da ampliação global do poderio atômico, pois isso revitalizaria e legitimaria efetivamente a ONU, o que é imprescindível neste momento histórico, sob pena de colocarmos em risco a sobrevivência das próximas gerações.

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PROCURADOR DE JUSTIÇA NO MPSP, DOUTOR EM DIREITO PELA USP, ESCRITOR, PROFESSOR, PALESTRANTE, É IDEALIZADOR E PRESIDENTE DO INSTITUTO ‘NÃO ACEITO CORRUPÇÃO’

Opinião por Roberto Livianu

Procurador De Justiça No MPSP, Doutor em Direito Pela USP, Escritor, Professor, Palestrante, É Idealizador e Presidente Do Instituto 'Não Aceito Corrupção'

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