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Procurador de Justiça no MPSP, doutor em Direito pela USP, escritor, professor, palestrante, é idealizador e presidente do Instituto 'Não Aceito Corrupção'

Opinião | Não se minimiza o crime de estupro

As Justiças da Espanha e da Itália emitiram importantes mensagens ao Brasil, ao mundo e, especialmente, a Daniel Alves e a Robinho

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A poucos dias do Dia Internacional da Mulher, entrevistado sobre a condenação de Daniel Alves por estupro traumático – pelo qual a vítima não tem forças para seguir a vida e se abala ao ouvir o Português –, Tite, ex-técnico da seleção brasileira, respondeu que cada um deve pagar pelos próprios erros, equiparando um crime sexual a dirigir na contramão, por exemplo.

Diminuir a relevância de um crime hediondo que vitimiza uma mulher escancara o machismo e a misoginia do brasileiro, que retiram o gênero feminino do patamar da igualdade, violando a Constituição. Um obstáculo cultural maior que a Muralha da China.

E o silêncio coletivo que tomou conta dos jogadores de futebol no Brasil, diante da notícia da condenação de Daniel Alves, que apresentou cinco distintas versões sobre os fatos, apesar de a verdade ser uma só, foi simplesmente ensurdecedor.

Este silêncio já tinha sido notado no caso Robinho, condenado em definitivo também por estupro, tempos antes, a uma pena de nove anos de reclusão pela Justiça da Itália. Robinho tenta ficar impune levando uma vida normal em Santos, como se nada tivesse acontecido, contando os dias para que seja extinta a punibilidade pela prescrição, o que ocorreu com Cuca e seus colegas, no caso da Suíça.

Aliás, um ex-companheiro de cela de Daniel Alves em Barcelona, em entrevista recente, revelou que o jogador pediu liberdade provisória com o objetivo de fugir para cá, onde pretendia, obviamente, ficar impune até o crime prescrever.

A propósito, em recente relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), apontou-se a necessidade de revisão das regras brasileiras relacionadas à prescrição, fonte inesgotável de impunidade dos delitos, tendo em vista a existência, inclusive, de uma terceira categoria inédita no mundo, exclusiva do Brasil: a retroativa ou intercorrente.

Este machismo resistente sobrevive num cenário em que temos hoje 52% de eleitoras, com apenas 33% de candidatas. Nas eleições de 2022, alcançamos 18% de mulheres eleitas no Congresso (18% no Senado e 18% na Câmara), isso porque na Câmara houve aumento expressivo de 42% de mulheres eleitas (dados do TSE).

Segundo o Mapa Mulheres na Política 2022, o Brasil ocupa a péssima 129.ª posição, de 190 países examinados em relação à participação feminina na política. Ou seja: estamos entre as dez maiores economias do mundo, mas nos situamos no pelotão desfavorecido em matéria de participação política das mulheres. Triste consequência também do machismo.

A luta pela igualdade de direitos começou há quase 92 anos, com a conquista do voto feminino em todo o País. A primeira eleitora registrada, Celina Guimarães Vianna, de Natal (RN), nasceu coincidentemente em 15/11/1890, exatamente um ano após a Proclamação da República. E a primeira prefeita eleita, também potiguar, foi Luiza Alzira Soriano Teixeira, em Lajes, e tomou posse em 1/1/1929, por força da inovadora legislação daquele Estado, que se antecipou ao restante do País em matéria de direitos políticos das mulheres. Mas a primeira senadora somente seria empossada em 1979, 50 anos depois de Luiza – a paulista Eunice Michiles, em plena ditadura.

Segundo a ONU Mulheres, 45% das parlamentares brasileiras já sofreram ameaças, 25% delas sofreram violência física no espaço parlamentar, 20% das mulheres sofreram assédio sexual e, para 40% delas, a violência sofrida atrapalhou suas agendas políticas.

Além disso, a décima pesquisa nacional de violência contra a mulher promovida pelo Data Senado em parceria com o Observatório da Mulher, divulgada em novembro, destaca que na visão de 74% das mulheres em geral a violência vem aumentando no Brasil. Para 89% delas, a violência é psicológica; para 79%, é moral; e para 76% a violência é física, principalmente atingindo a faixa etária de 40 a 49 anos.

Estima-se que 62% das mulheres deixam de denunciar a violência pelo temor da impunidade; 73% delas não denunciam por medo do agressor; e 61%, por dependência financeira do companheiro e pela falta de punição. Entretanto, há um dado positivo: o número de mulheres que se mantêm casadas após a violência caiu de 43% para 26%, desde a pesquisa anterior, realizada em 2019.

Em janeiro, outro estudo, da FGV, apontou que no ambiente digital o interesse feminino por política supera o masculino (50,4% ante 49,6%). Isso talvez possa ser explicado pelo potencial das redes sociais de levar a mulher do ambiente privado, onde ela sempre foi histórica e culturalmente segregada, para o público, que ela vem descobrindo e pelo qual vem demonstrando progressivo e emancipatório interesse.

Neste contexto, as Justiças da Espanha e da Itália emitiram importantes mensagens ao Brasil, ao mundo e, especialmente, a Daniel Alves e a Robinho, que sofreram danos reputacionais irrecuperáveis: eles não são intocáveis! A palavra da vítima tem valor, sim, sempre que segura e convincente, pouco importando quem seja ela.

Os boleiros precisam compreender que podem ser amados por aquilo que produzirem dentro dos campos de futebol, e isso poderá torná-los ricos e famosos, mas eles devem conservar respeito e humildade e ter maturidade para saber lidar com o poder obtido. Que eles entendam: o fato de serem popstars não faz com que as mulheres devam se considerar necessariamente privilegiadas por terem intimidade com eles. Elas podem querer dizer não. E, se o disserem, não é não!

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PROCURADOR DE JUSTIÇA NO MPSP, DOUTOR EM DIREITO PELA USP, ESCRITOR, PROFESSOR, PALESTRANTE, É IDEALIZADOR E PRESIDENTE DO INSTITUTO ‘NÃO ACEITO CORRUPÇÃO’

Opinião por Roberto Livianu

Procurador De Justiça No MPSP, Doutor em Direito Pela USP, Escritor, Professor, Palestrante, É Idealizador e Presidente Do Instituto 'Não Aceito Corrupção'

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