O clima, o PT, o presidente Lula e a geopolítica serão as principais ameaças inflacionárias nos próximos dois anos, mas o risco político interno é tratado muito discretamente pelo Comitê de Política Monetária (Copom), no informe distribuído depois da nova redução dos juros básicos, na quarta-feira, 13.
A inflação tem arrefecido dentro e fora do País, mas convém persistir na prudência e manter uma orientação contracionista, adverte o comitê, formado por diretores do Banco Central (BC). Ao anunciar a quarta redução consecutiva de 0,5 ponto porcentual, a nota promete novos cortes nos próximos meses.
Dirigentes de bancos centrais são em geral diplomáticos e discretos quando tratam do governo e do cenário político. Isso é compreensível e talvez desejável, mas esse cuidado pode obscurecer o perigo embutido no jogo político do dia a dia.
O comunicado parece muito distante das inquietações do mercado e do cenário de fortes pressões por maior afrouxamento das contas públicas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já se queixou, publicamente, da meta de equilíbrio fiscal proposta pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e das pressões contra o aumento da dívida pública.
O presidente pode ser mais sofisticado que alguns companheiros de partido, mas de vez em quando parece renunciar às diferenças. Então, confunde governo com gastança e defende o endividamento como indispensável à expansão econômica. Seu conceito de administração parece incompatível com a ideia de ordenar prioridades, controlar gastos e concentrar recursos — sempre finitos e insuficientes — nas metas mais importantes.
Com seus cuidados diplomáticos, o Copom dá pouco destaque ao perigo inflacionário associado aos objetivos políticos e à retórica do presidente Lula. Ao indicar os principais fatores de risco no cenário de preços, o comitê destaca a persistência das pressões inflacionárias globais e a resiliência da inflação de serviços.
Só no parágrafo seguinte o comunicado menciona a importância do cumprimento das metas fiscais para a ancoragem das expectativas de inflação. Nem sequer se assinala, como leve advertência, a piora do resultado fiscal estimado para este ano.
O comitê reconhece, no entanto, a lentidão do processo desinflacionário observado no Brasil. O conjunto inclui uma “reancoragem apenas parcial” das expectativas” e um “cenário global desafiador”. Esses dados, segundo avaliam os membros do Copom, recomendam a insistência numa política ainda contracionista — com afrouxamento cauteloso e lento da política monetária.
Se persistirem as tendências de estabilização dos preços, a taxa básica de juros, a Selic, será novamente reduzida no começo do próximo ano. Mas a inflação, segundo as projeções mais conhecidas, deve permanecer longe do centro da meta (3%) entre 2024 e 2026. A política de juros deve continuar, portanto, pouco adequada às ambições de expansão econômica do governo federal. Tanto pior se as mudanças climáticas afetarem a produção agrícola e impuserem mais custos ao governo e às famílias.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.