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Suprema Corte freia Trump

Revés do presidente no caso de um deportado por ‘engano’ mostra seus limites

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Por Notas & Informações
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A Suprema Corte dos EUA endossou a decisão de uma juíza distrital do Estado de Maryland e determinou que o governo de Donald Trump “facilite” o retorno de um imigrante deportado “por engano” para El Salvador, país governado pelo populista Nayib Bukele, um admirador do presidente americano.

Kilmar Abrego Garcia, que vivia e trabalhava legalmente nos EUA, foi detido por agentes de imigração no início de março. Uma ordem judicial de 2019 supostamente o protegia de ser deportado para seu país de origem, justamente El Salvador, agora convertido em depósito dos imigrantes que Trump expulsa sob a controvertida política de limpar a América de gente de “gene ruim”.

Embora Trump enxergue a maioria dos imigrantes como uma classe inferior e predisposta ao crime, eles obviamente não são. E mesmo aquela minoria que é de fato criminosa tem direitos, que a atual gestão insiste em ignorar.

O caso de Garcia, contudo, é ainda mais estarrecedor porque o próprio governo, que primeiro acusou o deportado de ter envolvimento com uma das perigosas gangues salvadorenhas, admitiu que a deportação ocorreu por um “erro administrativo”, ressaltando, porém, que nada mais poderia fazer a respeito.

É justamente isso o que a decisão da Suprema Corte – que, lembre-se, é formada por uma maioria conservadora – busca reparar. Após idas e vindas, os juízes do mais alto tribunal do país impuseram, por unanimidade, um freio aos arroubos do presidente, que nesta segunda passagem pela Casa Branca vem se notabilizando por ações extremamente mais erráticas e impetuosas que aquelas que caracterizaram seu primeiro governo.

O excesso de voluntarismo, contudo, começa a despertar vozes críticas mesmo entre as fileiras trumpistas. Foi o que se viu recentemente entre bilionários que apoiaram a campanha presidencial do republicano, mas que diante da sangria dos mercados, por conta da imposição de tarifas protecionistas draconianas, permitiram-se deixar claro que a impetuosidade de Trump custará caro, em especial aos norte-americanos.

Não é que as vozes dissonantes entre os apoiadores de Trump discordem por completo do presidente, mas elas deixaram óbvio que perder dinheiro não é um desvario que estejam dispostas a tolerar silenciosamente.

Agora é a Suprema Corte – que na visão de Trump está lá apenas para referendar seus caprichos – que sinaliza que há limites que não podem ser ultrapassados. A deportação de um cidadão com status legal e protegido por ordem judicial não é algo que se corrige só com a admissão de “erro”, mas com o retorno imediato do deportado.

Por se tratar de Trump, notório por fazer o lhe dá na telha, é esperado que, mesmo com a determinação da Suprema Corte, instituições aparelhadas como o Departamento de Justiça protelem o retorno de Garcia.

Ainda assim, ao ignorar apoiadores no mercado financeiro e tratar decisões judiciais como chacota, o presidente amplia fissuras em sua própria base. Não há manual de guerra que chancele essa estratégia.

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