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Tutela absurda

Condenação de Ronaldo Caiado mostra que a Justiça Eleitoral se vê maior do que os eleitores

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Por Notas & Informações
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É espantosa a naturalidade com que a juíza Maria Umbelina Zorzetti, da primeira instância da Justiça Eleitoral de Goiás, subverteu a vontade de milhares de eleitores goianienses expressada nas urnas na eleição municipal deste ano.

Na quarta-feira passada, a magistrada condenou o governador Ronaldo Caiado (União Brasil) a oito anos de inelegibilidade por “abuso de poder político”. A sra. Zorzetti ainda cassou a chapa apoiada pelo governador para a prefeitura de Goiânia, formada por Sandro Mabel (União Brasil) e Coronel Cláudia (Avante). Mabel, como se sabe, foi eleito no segundo turno com 55,53% dos votos válidos.

Caiado foi acusado pelo bolsonarista Fred Rodrigues (PL), candidato derrotado na disputa, de ter sediado um ato de campanha pró-Mabel, com a presença de vereadores eleitos, no Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás, dias após o fim do primeiro turno. É possível dizer que a escolha do local foi, no mínimo, imprópria, sobretudo sendo Caiado um veterano e com pretensões políticas em âmbito nacional. Mas daí a alijá-lo das disputas eleitorais por essa irregularidade vai uma longa distância.

A decisão da juíza é absurda, além de perigosa, razão pela qual se espera que seja reformada pelo Tribunal Regional Eleitoral de Goiás e, eventualmente, até pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A Justiça Eleitoral, convém lembrar, deve se pautar pelo princípio da intervenção mínima. Ela existe no Brasil, ao contrário da experiência de outros países até mais avançados, porque aqui se entende que a força da democracia está na salvaguarda do melhor interesse dos eleitores. E, a fim de resguardá-lo, é necessária a existência de um ramo particular do Poder Judiciário.

Logo, a pergunta que a sra. Zorzetti deveria ter feito a si mesma antes de tomar a decisão era: o fato de Caiado ter realizado um ato de campanha no Palácio das Esmeraldas em prol de Mabel, em que pese se tratar de uma irregularidade, afetou ou não o resultado da eleição? Ao fim e ao cabo, a juíza protegeu ou violou os direitos dos eleitores goianienses? A tal reunião influenciou decisivamente o resultado da eleição? É evidente que não. Parece claro para qualquer pessoa sensata que se está diante de uma interpretação draconiana da legislação eleitoral, para não dizer de um abuso.

Caiado, obviamente, não fez o que fizeram Jair Bolsonaro (PL) e o general Braga Netto (PL) para terem sido condenados à inelegibilidade pelo TSE. Tampouco se portou como o delinquente Pablo Marçal (PRTB), acusado de ter falsificado um laudo médico para prejudicar o deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) e, assim, influenciar o resultado da eleição para a Prefeitura de São Paulo. A escolha do futuro prefeito de Goiânia certamente não foi viciada pelo evento realizado no Palácio das Esmeraldas.

Entre outras razões, essa atitude inflexível da Justiça Eleitoral, que por vezes se vê maior do que os eleitores, dá força ao discurso dos inimigos da democracia segundo o qual o “sistema” vai de encontro aos interesses dos cidadãos. No caso em tela, foi mesmo.