O desempenho da economia brasileira tem surpreendido os analistas há algum tempo, e não foi diferente no ano passado. De acordo com o Monitor do PIB (Produto Interno Bruto), apurado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), o País encerrou o ano de 2023 com um crescimento de 3%. Ainda que seja um resultado positivo, o indicador não reflete a percepção sobre o real estado da economia, e não é por acaso.
Apurado com base nas mesmas fontes de dados e metodologia utilizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para o cálculo oficial das Contas Nacionais, o Monitor mostra que 30% desse desempenho se deveu à agropecuária, especialmente à soja cultivada na Região Centro-Sul do País. “Esse contexto mostra forte concentração setorial e regional e evidencia que o crescimento econômico não foi sentido de modo uniforme no País”, informou a FGV.
Indústria e serviços até tiveram resultados positivos no ano passado, mas muito mais tímidos. O que preocupa é a baixa velocidade do crescimento da economia na passagem do terceiro para o quarto trimestre, de 0,1%; a certeza de que o agronegócio não repetirá o fantástico desempenho que teve neste ano; e a redução dos investimentos, de 3% em relação a 2022.
Diante desse quadro, a FGV projeta que o País deve crescer apenas 1,4% neste ano, enquanto a previsão do mercado é de 1,6%, segundo a mediana das expectativas do último Boletim Focus, divulgado pelo Banco Central (BC). Porém, nem mesmo o Ministério da Fazenda arrisca um desempenho muito melhor e estima um avanço de 2,2%.
Independentemente do número que vier a ser alcançado, está claro, pelas projeções, que o País crescerá num ritmo muito aquém de suas necessidades e potencialidades. Ao Estadão, a economista e sócia da consultoria Tendências Alessandra Ribeiro calculou que o PIB deve avançar 2,4%, em média, nos próximos dez anos. Para proporcionar uma redução mais efetiva e expressa das desigualdades, o crescimento médio teria de superar os 3%, segundo ela.
É um desafio e tanto, considerando que isso só ocorreu duas vezes nos últimos dez anos – em 2013 e em 2021. Por outro lado, tampouco é impossível, sobretudo porque há um diagnóstico sobre os problemas que impedem a economia de crescer de maneira vigorosa: baixo nível de investimento, má qualidade da educação e produtividade estagnada. Se não é fácil revertê-los no curto prazo, é fato que o País não tem alternativa, já que não pode mais contar com fatores que nos auxiliaram no passado, como o bônus demográfico e o êxodo rural.
Há uma relação clara entre a produtividade do trabalhador brasileiro e o nível de educação formal. A produtividade é baixa porque o trabalhador não tem qualificação, e a qualificação é ruim porque, antes dela, o ensino deixou a desejar. A poupança para alunos do ensino médio pode ajudar nesse aspecto, uma vez que a evasão escolar nessa etapa do ensino é muito elevada.
Manter as crianças na escola, no entanto, é apenas um primeiro passo. Como pontuou o professor do Insper e coordenador da Cátedra Ruth Cardoso, Naercio Menezes, não será possível sustentar a economia enquanto apenas a elite tem acesso a uma educação de qualidade, acessível somente a quem pode frequentar escolas particulares – com raras e célebres exceções, especialmente no Ceará.
Em relação ao investimento, é preciso apostar em projetos de lei que favoreçam o ambiente de negócios e no fortalecimento das agências reguladoras. Com uma infraestrutura sofrível e investimentos que mal cobrem a depreciação e a manutenção dos ativos, o País não pode se dar ao luxo de flertar com a insegurança jurídica e a revisão intempestiva de contratos.
A promulgação da reforma tributária pode contribuir para estimular investimentos no médio e longo prazos, mas juros mais baixos só serão viáveis se o governo estiver de fato comprometido com as metas fiscais e com a busca do equilíbrio estrutural das contas públicas. Gastar melhor – e naquilo que realmente importa – talvez seja o maior e o mais urgente de nossos desafios.