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Uma desconfiança perigosa

É preocupante que uma parcela crescente da população brasileira hesite e resista às vacinas

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Por Notas & Informações
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Duas pesquisas divulgadas recentemente apontam para um problema grave: a crescente desconfiança de parcelas da população brasileira em relação a vacinas. Tal resistência, alimentada por desinformação, tem contribuído para a queda dos índices de cobertura vacinal no País. Nos últimos anos, as principais metas de imunização do calendário infantil não foram atingidas, um risco à saúde de milhões de crianças − e um alerta para as autoridades.

Um levantamento da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) indicou os principais fatores de resistência a vacinas no País. O principal deles, citado por 72,8% dos entrevistados, foi a preocupação com possíveis efeitos colaterais − como se os imunizantes não tivessem que ser licenciados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), procedimento que analisa a segurança do produto.

A pesquisa da UFMG foi realizada entre setembro e outubro de 2021, com apoio do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems). Para Hisham Hamida, diretor do Conasems, o receio de efeitos colaterais é sintoma de falsas notícias e boatos disseminados nas redes sociais. Disse ele ao Estadão: “É uma hesitação causada pela desinformação, pela desconstrução de uma confiança que tínhamos no programa de vacinação”. Uma lástima.

Outra pesquisa, publicada na revista científica Nature Medicine, mostrou que a hesitação dos brasileiros em vacinar os filhos contra a covid-19 aumentou 56,3% em 2022, em relação ao ano anterior. O levantamento foi feito pelo Instituto Global de Saúde de Barcelona (ISGlobal) e alcançou 23 países onde vivem mais de 60% da população mundial. Enquanto a disposição global de vacinar os filhos cresceu, a parcela de pais que relutam em fazer isso no Brasil subiu e atingiu 13,6%. Mais um sinal de que o País caminha na contramão.

A vacina contra a covid-19 é o método mais eficaz de prevenção das formas graves de uma doença que já matou quase 700 mil pessoas no País, muitas delas crianças. Elevar os índices de imunização em todas as faixas etárias, portanto, não só é recomendável, como é uma necessidade de saúde pública. O mesmo raciocínio se aplica às demais vacinas disponibilizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). No caso da covid-19, infelizmente, há que recordar a campanha contrária à imunização de crianças e adolescentes promovida pelo então presidente Jair Bolsonaro, que resistiu à liberação da vacina infantil pela Anvisa. Mesmo depois da aprovação, ele disse que sua filha, na época com 11 anos, não seria vacinada.

Sim, é de lamentar que o Brasil dê sinais de retrocesso em tema de tamanha seriedade. O desenvolvimento de vacinas, como se sabe, foi um dos maiores avanços de saúde pública na história da humanidade. Desacreditá-las é um desserviço que custa vidas. As autoridades sanitárias devem agora se empenhar em difundir informações corretas e com base científica, recordando as muitas evidências disponíveis: as vacinas são essenciais para prevenir doenças e, ao mesmo tempo, seguras para as respectivas faixas etárias.