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Uma greve ilegal e antidemocrática

Caos gerado pela greve do Metrô e da CPTM revela truculência dos grevistas, que não respeitam direitos básicos dos cidadãos, e o despreparo do poder público para lidar com crises do tipo

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Por Notas & Informações
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Pela enésima vez, os paulistanos viveram um dia de caos ontem provocado pela greve unificada dos funcionários da Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Ainda que fosse justa a reivindicação dos grevistas – o que não era o caso –, as categorias não poderiam causar tantos transtornos à população. Por ordem da Justiça do Trabalho, 100% do efetivo das duas companhias deveria estar operacional nos horários de pico (entre 6 e 9 horas e entre 16 e 19 horas) e 80% nos demais horários. Mas, mesmo com a fixação de multa de R$ 500 mil para cada um dos sindicatos em caso de descumprimento, a decisão judicial foi olimpicamente ignorada pelo movimento paredista. Para essa turma, os cidadãos que se danem.

Os grevistas cruzaram os braços em protesto contra estudos – por ora, apenas isso – conduzidos pelo governo estadual para privatizar o Metrô e a CPTM, além da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), que também aderiu à paralisação. É difícil imaginar que a população, submetida à truculência de uma greve ilegal, haverá de se solidarizar com o pleito dos grevistas contrários à eventual privatização do transporte metroferroviário. Basta dizer que as linhas do Metrô (4-Amarela e 5-Lilás) e as linhas da CPTM (8-Diamante e 9-Esmeralda) que já foram concedidas à iniciativa privada permaneceram operando quase sem falhas durante a paralisação das demais. Mas talvez seja pedir demais esperar inteligência política ou, menos ainda, atenção ao interesse público de grevistas que não respeitam nem a Justiça.

Milhares de cidadãos tiveram de pensar em meios alternativos de transporte, a um custo financeiro muito alto, para cumprir seus compromissos profissionais ou pessoais. Deslocamentos por carros de aplicativo chegaram a custar o triplo do que custariam normalmente, de acordo com relatos de usuários dos trens e do metrô ouvidos pela reportagem do Estadão. Pessoas fotografando a entrada de estações do Metrô e da CPTM fechadas para enviar as imagens a seus empregadores viraram cenas comuns. Consultas e exames agendados pela rede pública de saúde para aquele dia terão de ser remarcados – sabe-se lá para quando. Em suma: um inferno para muitos paulistanos que não desejavam muito mais do que apenas uma terça-feira normal.

Além de ilegal, a greve simultânea dos funcionários do Metrô, da CPTM e da Sabesp é antidemocrática, pois não respeita a decisão da maioria dos eleitores paulistas que, ao votar em Tarcísio de Freitas (Republicanos) para o governo de São Paulo, escolheu um modelo de governança para o Estado que tinha entre suas premissas iniciar estudos de concessão de alguns serviços públicos à iniciativa privada, ou mesmo a privatização de empresas estatais. Não será à custa do bem-estar dos cidadãos, sobretudo desrespeitando acintosamente seus direitos básicos, como o de ir e vir, que os grevistas haverão de sustar a realização desses estudos. É bom enfatizar: nada está decidido ainda, o governo apenas anunciou análises de cenários para a eventual concessão dos serviços ou venda das estatais para a iniciativa privada.

Se, por um lado, a greve revelou a truculência de servidores mais ocupados com a defesa de uma agenda político-ideológica derrotada nas urnas do que com a qualidade do serviço que prestam à população de São Paulo, por outro, mostrou, mais uma vez, a incapacidade do governo estadual e da Prefeitura da capital paulista para lidar com a paralisação do modal de massa. Evidentemente, haverá transtornos em qualquer grande cidade do mundo que se veja privada de seus meios de transporte metroferroviário, seja por greves, panes ou intempéries. Mas o caos que se instala em São Paulo, sempre que isso acontece, é de outra ordem – é fruto de despreparo e da ausência de planos de contingência dimensionados para a demanda gigantesca da capital paulista.

É lamentável que tantos cidadãos tenham passado por tantos transtornos por uma greve para lá de abusiva. E, mais ainda, que não tenha sido pela primeira vez e nem tampouco pela última.