A equipe econômica reduziu de R$ 35 bilhões para R$ 25 bilhões a estimativa para a renúncia fiscal gerada pela isenção do pagamento de Imposto de Renda a todos que ganham até R$ 5 mil mensais. Os números foram calculados para dar base a um projeto de lei que o Executivo pretende enviar ao Congresso até o fim deste mês, por meio do qual pretende viabilizar, em 2026, o cumprimento da promessa de campanha eleitoral feita pelo presidente Lula da Silva.
Essa perda, segundo o governo, será compensada pela criação de um imposto mínimo de até 10% que incidirá sobre os contribuintes com renda mensal superior a R$ 50 mil, incluindo o recebimento de lucros e dividendos distribuídos por empresas. A apuração será feita na declaração de ajuste anual do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF), quando os acionistas saberão se deverão complementar a contribuição ou se terão direito à restituição dos valores.
No País, lucros e dividendos eram tributados até 1995, mas passaram a ser isentos no ano seguinte sob a justificativa de evitar que, sobre uma mesma renda, houvesse incidência de Imposto de Renda sobre pessoas físicas e jurídicas. Já seria um caso raro no mundo, mas, ao longo dos anos, benefícios como isenções e abatimentos – ora propostos pelo Executivo, ora pelo Congresso – reduziram a tributação de empresas sem que houvesse contrapartida de cobrança maior sobre a renda pessoal.
Embora, em tese, a alíquota de IRPF incidente sobre quem ganha mais de R$ 4.664,68 mensais seja de 27,5%, a prática tem sido muito diferente. Com base em dados do IRPF, que incluem apenas os brasileiros que prestam contas ao Fisco, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda estimou que a alíquota efetiva de impostos sobre o 0,01% mais rico é de apenas 1,76%, o que garante aos mais privilegiados pagar, proporcionalmente à sua renda, menos impostos do que os mais pobres.
Essa é uma das principais distorções do sistema tributário brasileiro, e é louvável que o governo Lula da Silva queira torná-lo mais justo e menos desigual. Mas o problema de propor a isenção de IR a quem ganha até R$ 5 mil mensais associada ao aumento da tributação de quem aufere mais de R$ 50 mil mensais é o risco de que apenas a primeira proposta seja aprovada – ou seja, de que o governo perca arrecadação e não receba nada em troca.
Considerando que a isenção de IR talvez seja o principal projeto do governo no Congresso neste ano, não é desprezível a chance de que isso venha a ocorrer. Afinal, não é a primeira vez que o Executivo tenta, sem sucesso, taxar lucros e dividendos. No passado recente, iniciativas semelhantes foram apresentadas pelos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, mas não avançaram no Congresso, ambiente que é bastante influenciado pelo público potencialmente atingido pela medida.
A proposta de isentar de IR quem ganha até R$ 5 mil mensais, por outro lado, tem apelo popular, ativo que tende a ganhar mais força entre os parlamentares com a proximidade das eleições. Pesquisa realizada entre os dias 11 e 12 de fevereiro pelo Instituto Ranking dos Políticos mostrou que 49,1% dos deputados apoiam a proposta, enquanto 45,4% a rejeitam. Entre os senadores, 50% foram favoráveis e 34,6% se disseram contrários.
Independentemente de a renúncia ser de R$ 25 bilhões ou R$ 35 bilhões, não são receitas desprezíveis, ainda mais para um país que vive em desequilíbrio fiscal crônico há mais de uma década. O Brasil não pode se dar ao luxo de abrir mão dessa arrecadação tão facilmente e sem a garantia de que ela seja reposta. Liberar esses valores para o consumo de uma parcela da população que não costuma poupar pode, ainda, aquecer a demanda e impor mais desafios ao controle da inflação.
O governo, portanto, deveria ter mais cautela ao fazer da isenção do IR sua bandeira eleitoral. Na hipótese de que ela seja aprovada pelo Congresso neste ano e que a compensação por meio da tributação de lucros e dividendos seja novamente rejeitada, pode ser o próprio presidente Lula da Silva quem se verá em apuros quando tiver de lidar com contas públicas ainda mais depauperadas em 2027.