Há alguns anos ninguém poderia imaginar, mas baristas brasileiros são verdadeiras sensações nas redes sociais. Só no TikTok, aplicativo de vídeos geralmente curtos e com muita edição, o barista Léo Oliva possui mais de mais de 280 mil seguidores no TikTok e quase 5 milhões de curtidas nos vídeos, quase todos eles falando sobre como preparar um bom café, identificar quando é um produto de qualidade e compartilhando sua rotina.
Esse sucesso que acompanha Léo Oliva e outros nomes começou durante a pandemia de covid-19, quando as pessoas passaram a se interessar pelo processo de buscar hábitos mais saudáveis e artesanais. No entanto, enquanto algumas coisas ficaram apenas na memória, a busca pelo bom café continuou. O vídeo mais recente de Amanda Albuquerque, outro sucesso da rede, tem quase 400 mil curtidas -- e 2,7 milhões de seguidores.
“É uma das principais formas de divulgação da pessoa e do trabalho”, explica Léo. “Outros vão além, se tornando influenciadores como criador de conteúdo. Além de ser barista e de dar aula, faço conteúdo sobre café para apresentar todo esse universo de forma descontraída. São os ‘coffee influencers', criando conteúdo didático e fácil de digerir que atraem as pessoas para esse universo dos cafés especiais, por toda curiosidade gerada”.
Descobrindo a profissão
Essa popularização do barista, porém, não era assim lá atrás, quando Amanda e outros profissionais da área começaram a vasculhar o café. Léo Oliva trabalha há cinco anos como barista. Começou pesquisando sobre cafés especiais e sobre a profissão, que não conhecia até então. Ele, que é do Rio de Janeiro, se mudou pra Curitiba e foi cursar a faculdade de gastronomia. No entanto, acabou tendo sua carreira focada totalmente na xícara de café.
“O barista não é só o cara que faz o café. É quem tem conhecimento do plantio, da torra e até chegar na xícara para passar, pelo menos, o básico de informação para seu cliente. Precisa saber tudo sobre o grão”, explica Léo. “É o profissional de hospitalidade, é quem está na última cadeia do café. É quem representa toda a cadeia, é quem também representa as várias mãos que passaram por aquele café. É quem representa a cafeteria”.
Nas conversas do Estadão com baristas, são várias as histórias de profissionais que se aproximaram da profissão de barista por conta de tradições familiares. É o caso de Boram Julio Um, embaixador barista do espaço Priceless e um dos 15 melhores profissionais do setor no mundo, segundo o Campeonato Mundial de Baristas. Sua família já tinha tradição na produção, até que começou as atividades com a própria cafeteria, a Um Coffee Co.
“Trabalhar com café é apaixonante. Por isso me envolvi em todos aspectos”, diz Boram, em entrevista. E o que está fazendo esse profissional ganhar tanto espaço nas redes sociais? Ele é seguido por cerca de 10 mil pessoas no Instagram, onde compartilha a rotina da profissão. “Acredito que seja a ascensão de profissionais de gastronomia nas mídias. Além disso, o café acaba sendo acessível para muita gente, por isso se torna tão abrangente”.
O carioca Marcelo Pedras, dono da marca Cello Café, também vai bem nas redes sociais, com 50 mil seguidores no TikTok. Ele explica, com uma calma de monge tibetano, o que é um café de qualidade -- um tour no mercado, explicando o que há de melhor nas prateleiras, tem mais de 1 milhão de visualizações. Esse trabalho de formiguinha, diferenciando o que há de bom e de ruim, também faz parte do cotidiano de vida do barista.
“Não existe isso de café preto. Não existe extraforte. Café precisa ter corpo, precisa ter aroma, precisa ter notas”, explica Marcelo em entrevista ao Estadão. “As pessoas estão começando a entender que café não é tinta. Precisa ter cheiro de café. Hoje, já estou na segunda etapa: estou explicando para as pessoas que você não deve comprar o café já moído, senão oxida. Precisa comprar o café em grão e moer na hora. Se puder, o cru”.
Desafios do barista
Apesar desse sucesso todo, são vários os desafios que a profissão ainda enfrenta. Boram explica, pra início de conversa, que apesar desse sucesso todo, a profissão de barista ainda é pouco reconhecida. “Não existe distinção exata como um sommelier ou outros profissionais de bebidas”, diz o embaixador de café do Espaço Priceless. “O barista hoje ainda exerce muitas funções diferentes além de servir café pela necessidade do mercado”.
Com essa falta de reconhecimento, vem também a falta de dinheiro. Segundo Léo, não tem plano de carreira e a renda é em torno de R$ 1,4 mil. Para sobreviver, os baristas acabam apostando em outras áreas dentro do universo do café. “É difícil se manter nas cafeterias. Estamos buscando novos caminhos para termos uma renda um pouco maior”, diz. “Alguns profissionais acabam optando por se tornarem instrutores dando treinamentos, cursos e workshops, além de consultorias, como é o meu caso. Outros se voltam para outras áreas comerciais dentro do café. Vira mestre de torra. Poucos ficam só vivendo do barismo”.
Afinal, apesar do salário baixo, o custo de entrada para ser barista é alto. O barista Juarez Gomes explica. “Os utensílios são caros, os cursos não são baratos. O barista consegue, com o salário que gira em torno dos seus R$ 1,5 mil, comprar um café legal pra ele? Ou o café especial vai ficar restrito ao seu cargo?”, provoca Juarez. “Além disso, ninguém que sai do curso, sai barista. As horas de máquina e de chaleira que te fazem um barista”.
Apesar disso tudo, em todas as entrevistas o tom é positivo: a profissão de barista tem futuro. “Um bom restaurante precisa de um barista. Estão percebendo isso. Não adianta comer bem e terminar com o gosto de café ruim. Mata o paladar”, diz Marcelo. Juarez, que entrou faz pouco tempo na área e nas redes sociais para divulgar seu trabalho, incentiva os que desejam entrar no mercado. “Tenha muita sede de cafeína, muita sede de conteúdo. Nesse meio não existe uma verdade absoluta, então saiba que ele está sempre inovando e mudando”, explica o barista ao Estadão. “Isso me motiva a sempre querer aprender”.