Se só de ouvir falar em café solúvel você já vira os olhos, com total desprezo, este teste realizado pelo Paladar servirá como um convite para deixar o preconceito de lado e se abrir para novas experiências. É verdade que a má reputação do café instantâneo, como também é chamado, não é de graça: no Brasil, bem como na Europa e nos Estados Unidos, ele é visto como um produto de qualidade regular (quando não, pior) em razão de os produtos oferecidos serem preparados, principalmente, a partir de grãos da espécie Coffea canephora e suas variedades conilon e robusta, de maior rendimento no processo industrial.
A boa notícia é que, por aqui, há um movimento para oferecer café solúvel de excelente qualidade pelas principais torrefações, acompanhando uma tendência global. Destaque para as badaladas Intelligentsia, de Chicago; Ritual, de San Francisco; e Blue Bottle, de Oakland, que passaram a oferecer suas versões de café instantâneo. Na Europa, o destaque vai para a italiana illy, com blend de arábicas, e para a alemã The Barn, que mantém um excelente café instantâneo preparado com grãos naturais etíopes Dambi Uddo.
Curiosamente, o Brasil produz café instantâneo com grãos de café arábica desde a década de 1980, com a Cia. Iguaçu de Café Solúvel. A produção, porém, era exclusiva para exportação para o mercado japonês.
A degustação
Como já é possível encontrar no mercado uma porção destes novos cafés instantâneos, promovemos uma degustação às cegas para avaliar 11 destes produtos.
Além de mim, Ensei Neto, especialista no assunto e autor do blog Um Café para dividir, a prova, realizada no Centro de Preparação de Café do Sindicafé São Paulo, contou com um júri de peso, que se relaciona com a bebida de diferentes formas: Camila Archanjo (do Sindicafé), Maurício Maia (do blog O Cachacier) e a chef Carla Pernambuco. Cada jurado foi colocado em uma cabine de avaliação sensorial para provar as amostras de café preparadas na proporção de 1:39 (10g de café instantâneo para até 400 ml de água) – o equivalente a uma colher de chá para uma caneca de 240 ml. A água utilizada foi padronizada em sistema Pentair e aquecida a 96°C para o serviço.
No geral, a degustação surpreendeu os jurados por conta da alta qualidade, “inesperada desse tipo de café”, declararam. Boa acidez, notas frutadas e baixo amargor foram os pontos altos encontrados durante a prova. “Muito diferente do que se conhecia até agora”, afirma Maia. O resultado, para mim, mostra que o café especial, agora como instantâneo, rompeu sua última barreira. Confira as avaliações mais abaixo.
O que é e como é feito o café solúvel
O café instantâneo pode ser produzido por dois processos principais: a atomização, ou spray dryer, e a liofilização. Basicamente, busca-se a retirada de toda a água de uma solução de café, convertendo as substâncias que estavam dissolvidas em algo sólido.
O sistema por spray dryer consiste em produzir, inicialmente, um café extraído em alta concentração para, então, ser submetido por aspersão em microgotas a uma corrente de ar quente. O resultado é um pó fino, que pode passar por outro processo para formar o chamado aglomerado, que também se dissolve facilmente em água fria.
Já o café solúvel liofilizado, geralmente apresentado em pequenas placas, é obtido por meio de um processo inicial de congelamento do extrato de café para, então, ter a água sublimada (passagem do estado sólido ao vapor, sob quase vácuo). O resultado sensorial é muito rico, pois praticamente não há perda das substâncias mais voláteis e, portanto, mais delicadas.
Senta que lá vem história
O café instantâneo nasceu na Grã Bretanha, em 1771, enquanto que o primeiro produto americano foi lançado em 1851. Seu principal apelo era a facilidade no transporte e no preparo, tendo sido utilizado inicialmente por soldados durante a Guerra Civil. O nipo-americano Satori Kato foi inventor do primeiro método industrial para criar café solúvel em pó com boa estabilidade, em 1901. Em 1937, o químico Max Morgenthaler, da Nestlé, aprimorou o processo de preparo do café instantâneo, obtendo um pó de fácil dissolução em água, com resultado similar ao de um café fresco. A primeira indústria de café solúvel no Brasil foi instalada em 1953, atividade na qual, hoje, nosso País é o líder mundial de produção e exportação.
Os melhores cafés solúveis do mercado
Nescafé Gold 8
Nestlé, liofilizado (R$ 21,99 no Pão de Açúcar) Bebida com excelente estrutura, com destaque para sua acidez licorosa e corpo com toque sedoso. “Melaço e caramelo dão o tom. Impressiona também pelo bom corpo”, descreve a chef Carla Pernambuco.Perfil Sensorial: acidez licorosa, chocolate, caramelo, castanhas, encorpado, estruturado.
2º Nescafé Origens do Brasil – Chapada Diamantina
Nestlé, spray dryer pó (R$ 14,20 no Sonda Supermercados) Feito com grãos 100% arábica com grãos da baiana Chapada Diamantina, destacou-se pelo caramelo intenso e pelo equilíbrio da bebida. “Tem notas frutadas e finalização elegante”, afirma Ensei Neto.Perfil Sensorial: acidez cítrica média baixa, castanhas, caramelo, leve floral, frutado, encorpado médio, elegante.
3º Cafuso Tradicional
Real Café, spray dryer granulado (R$ 3,60; 50g - marca capixaba, ainda não vende em SP) “Cremoso”, definiu Maurício Maia. Produto 100% conilon, destacou-se pelo equilíbrio e pelo corpo. Tem boa acidez final, além de delicada nota frutada.Perfil sensorial: acidez cítrica média, frutado, chocolate, encorpado, discreta adstringência, macio.
Cafuso Extraforte
Real Café; spray dryer granulado; R$ 3,60; 50g (marca capixaba, ainda não vende em SP) É 100% conilon. Surpreendeu aos jurados pelo perfil equilibrado e pelo fato de ser fácil de beber.Perfil sensorial: acidez cítrica média, encorpado, macio, com notas de chocolate.
illy
illycaffè; liofilizado (R$ 45,36 no Carrefour) 100% arábica, tem 3% de café em pó. Seu blend é composto de grãos de diferentes países, entre eles o Brasil.Perfil sensorial: acidez cítrica delicada, notas herbáceas, leve caramelo, discreta aspereza.
Lor Classique
JDE; liofilizado (R$ 17,20 no St. Marché) Blend de arábica e canephora. A bebida é “flat”; poderia ser mais ousada. Perfil sensorial: acidez baixa, leve cítrico e chocolate, leve adstringência.
Nescafé Gold 6 Espresso
Nestlé, liofilizado; R$ 19,20 no St. Marché Surpreendente acidez cítrica, muito bem trabalhada com notas de caramelo e o toque cremoso da percepção de corpo. “A acidez é brilhante, vibrante, incrível”, avaliou Camila Archanjo.Perfil sensorial: acidez brilhante, caramelo, cítrico, encorpado, cremoso, equilibrado.
Nescafé Gold 9
Nestlé; liofilizado (R$ 18 no Pão de Açúcar) Preparado com grãos 100% arábica, sua torra intensa privilegia o sabor amargo. Vai bem com leite.Perfil sensorial: acidez baixa, amargor intenso, leve defumado, leve adstringência.
Nescafé Origens do Brasil – São Sebastião do Paraíso
Nestlé; spray dryer pó (R$ 14,50 no Pão de Açúcar) Grãos 100% arábica provenientes do Sudeste de Minas Gerais, divisa com a Alta Mogiana (área reconhecida pela produção de cafés de excelência). Perfil sensorial: acidez cítrica média, chocolate, leve frutado, amendoim, pouco encorpado.
Nescafé Origens do Brasil – Serras do Alto Paranaíba
Nestlé; spray dryer pó (R$ 14,20 no Sonda Supermercados) Bebida equilibrada. 100% arábica com grãos produzidos no Cerrado Mineiro.Perfil sensorial: acidez cítrica média, leve caramelo, notas tostadas, finalização macia.
Três Corações
Três Corações; liofilizado (R$ 18,35 no St. Marché) 100% arábica. O sabor químico predominou, impactando na percepção de corpo. Perfil sensorial: acidez cítrica média, amargor intenso, sabor químico, corpo leve.