É na simpática cidade de Torrinha, no coração do estado de São Paulo, que está a destilaria Octaviano Della Colletta. Depois de atravessar uma região com várias casas típicas de interior, e nenhum prédio, é que encontramos a empresa, surgindo naquele cenário após muita terra batida e uma estradinha com inúmeras curvas. A destilaria é uma das empresas atrás de um selo importantíssimo: o de produção 100% orgânica de cachaça.
Para isso, o processo é diferente de grande parte da produção de cachaça que vemos acontecendo em destilarias espalhadas pelo Brasil. Tudo, na Octaviano Della Colletta, segue um passo a passo rígido: até o detergente usado precisa ser um produto orgânico.
“Buscamos o selo internacional de produção orgânica para conseguirmos chegar em outros mercados”, contextualiza a especialista Aline Bortoletto, responsável técnica da destilaria. “O orgânico é uma tendência que não tem mais volta e precisamos atender esse mercado”.
Assim, a destilaria precisa ser responsável por todo o processo, do plantio ao produto final.
Como é a produção de cachaça orgânica?
Nessa busca, tudo é profundamente controlado sob a batuta da destilaria. Tudo, é claro, começa com a cana-de-açúcar: ela é plantada ali no terreno da Octaviano Della Colletta, em 9,3 hectares de terra roxa, com produção orgânica. Nada de produtos químicos ou fertilizantes artificiais: toda a produção é controlada com agentes naturais, fazendo com que a plantação viva em uma simbiose interessante para manter o equilíbrio da cana.
“A terra roxa tem mais argila e ferro, deixando a cana mais forte e com alto teor de brix”, explica Aline. O brix que ela cita é uma escala numérica que mede a quantidade de sólidos solúveis como açúcar ou sacarose. Isso faz com que o caldo seja mais doce, fazendo com que a cachaça tenha notas sensoriais importantes e um sabor bem mais interessante. Além disso, vale destacar a importância de Torrinha: a cidade tem altitude de 1 mil metros, deixando um clima mais ameno e fazendo o fermento atuar de forma mais cadenciada.
Depois de colhida, a cana-de-açúcar é lavada duplamente, na carreta e entrando na esteira de processamento, e é feito um controle de qualidade -- canas com brocas, uma espécie de mariposa que deposita suas larvas na cana, são descartadas para não causar sujidade na cachaça. É depois de limpa que a cana-de-açúcar é depositada em uma máquina imensa, de estilo bem industrial, que pica a cana e esmaga duplamente para retirar o caldo.
O caldo, então, é filtrado duplamente e levado para a decantação. É aí que começa o processo de fermentação: são leveduras específicas que também ajudam a dar sabor e aroma para a cachaça. Nesse processo, a destilaria ainda precisa seguir rígidos valores de temperatura, pH, acidez, brix e teor alcoólico. Se não acompanhar tudo, seguindo todas as regras mais básicas, a cachaça vai sair de um jeito diferente no final de todo o processo.
Na Octaviano Della Colletta, não é usado também nenhum fermento químico, mas sim o chamado pé-de-cuba: ele é preparado em uma dorna, no início da safra, em uma mistura de leveduras com o próprio caldo de cana obtido no processo de moagem e prensa da cana.
Por fim, é adicionada água no caldo obtido -- obtido no próprio terreno da fazenda, mantendo as características do solo -- para reduzir a concentração de açúcares. É aí que o caldo, já fermentado e com água adicionada, vai para a destilaria: são maquinários de cobre, que ajudam a manter a temperatura desse composto, e que entram em um profundo processo químico de evaporação e condensação da cachaça, até obter a bebida alcóolica.
É neste momento final que a cachaça pode seguir dois caminhos: ou ser armazenada em tonéis metálicos, sem envelhecimento, para a cachaça branca, que no caso é chamada pela destilaria como Cê Blanc de Blancs; ou, então, partem para o envelhecimento em barris de carvalho, jequitibá branco ou amburana, gerando a cachaça mais escura, envelhecida, e geralmente com um sabor bem mais complexo e intenso, chamadas de Alzira (mais simples e barata) e a Cê Double Wood, feita em carvalho americano e jequitibá rosa.
Processos externos da cachaçaria
Vale lembrar que não é apenas no processo em si da cachaça que a destilaria Octaviano Della Colletta precisa se atentar com os processos para conquistar o selo internacional de produto orgânico. Por exemplo: usam fardos de palha de cana para gerar energia nas queimas da caldeira e utilizam o bagaço da cana para geração de adubo. Parte da cana triturada que não é aproveitada também é reaproveitada por outro fazendeiro para o gado.
A eletricidade é gerada através de painéis solares, enquanto grande parte dos veículos é movido a álcool produzido através de parte do álcool descartado no processo de produção da cachaça. Há, também, iniciativas de bem-estar com os funcionários da destilaria.
*Repórter viajou a convite do Senac Águas de S. Pedro.