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Comida

“A comida é uma linguagem”, diz autora de ‘A Cozinheira de Frida’

Escritora Florencia Etcheves fala sobre os desafios de escrever uma história inspirada na vida de Frida Kahlo com a comida como fio condutor

Capa do livro A Cozinha de Frida. Foto: PlanetaFoto: Planeta

Nayeli é uma jovem que, depois de fugir de casa, chega indefesa à Cidade do México. Mas é graças às suas maravilhosas habilidades na cozinha que ela encontra um lugar na Casa Azul, onde Frida Kahlo vive praticamente isolada desde o acidente fatal que a deixou paraplégica. Entre sabores, aromas e cores, a pintora e a sua nova cozinheira iniciam uma amizade que marca profundamente o destino de ambas. Esta é a história de A Cozinheira de Frida, livro que chegou recentemente às livrarias brasileiras pela editora Planeta.

Diferente de uma biografia, a argentina Florencia Etcheves escreve uma ficção que une elementos do mundo real (Frida, seus gostos, comportamentos e arte) com o que é criado por Florencia (a história de Nayeli e a de sua neta, décadas depois, passada em Buenos Aires). “Deixei minha escritora interior agir e criei Nayeli, a cozinheira, para que ela fosse o artifício que me permitisse narrar, por meio de sua trajetória dramática, um pedacinho da história de um país maravilhoso como o México”, explica ela em entrevista ao Estadão.

Capa do livro A Cozinha de Frida Foto: Planeta

O resultado é um livro que apaixona: se de um lado traz a história de Frida e de Nayeli se entrelaçando e trazendo aspectos biográficos da artista mexicano que emocionam; do outro, aromas e sabores da cozinha mexicana que servem como uma forma de comunicação entre as duas. É um livro que tem cheiro, tem cor, tem sabor. Emociona e empolga.

A seguir, confira a conversa do Estadão com Florencia Etcheves sobre A Cozinheira de Frida:

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Paladar: De onde surgiu a ideia do livro? De onde veio esse desejo de falar sobre Frida Kahlo?

Florencia Etcheves: Foi uma proposta de Sergio Vilella e Gabriel Sandoval, da Planeta México: um romance policial com Frida Kahlo. Eu admito que fiquei chocada. Como escrever um romance sobre um país que não é o meu e uma época que não é a minha? Tive que recorrer às minhas ferramentas de anos como jornalista investigativa e me lancei nessa aventura. Viajei para o México e ali começou a jornada de criação mais fascinante que já tive: mergulhar de cabeça em outra cultura, através de Frida e Diego.

A ideia não era escrever uma biografia deles ou uma investigação jornalística, então deixei minha escritora interior agir e criei Nayeli Cruz, a cozinheira, para que ela fosse o artifício que me permitisse narrar, por meio de sua trajetória dramática, um pedacinho da história de um país maravilhoso como o México.

Paladar: O livro está repleto de aromas e sabores; afinal, os laços entre Frida e Nayeli surgem através da comida. Como foi o processo de falar sobre uma cozinheira e, principalmente, de dar tanta importância à comida na narrativa?

Florencia Etcheves: Eu sabia que queria escrever um romance em dois tempos: o passado no México e o presente em Buenos Aires; então, o elo, que era Nayeli, tinha que ser uma senhora mais velha, uma avó. E a voz da minha avó veio até mim, aquela voz que sempre me dizia que as pessoas que te criam não são aquelas que te ensinam boas maneiras ou leitura, mas sim aquelas que te alimentam. Eu segui o conselho dessa voz e decidi que Nayeli seria uma cozinheira, alguém que cria, cuida e ama por meio da comida. O resto foi fácil: o México é um dos berços de sabores e texturas culinárias. Trabalhar com essas texturas enriqueceu o romance e o universo da minha protagonista, Nayeli Cruz, a cozinheira de Frida.

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A autora Florencia Etcheves, de A Cozinha de Frida Foto: ALEJANDRA LOPEZ

Paladar: Como você vê a importância da comida como um elo entre as pessoas? Você acha que pode ser uma forma de comunicação?

Florencia Etcheves: Absolutamente. A comida é uma linguagem e, muitas vezes, faz parte da identidade patriótica dos países. No meu país, a Argentina, por exemplo, se reunir para comer um churrasco é sinônimo de amizade, camaradagem e laços familiares. Comer um “assadito”, como dizemos, é um plano que nunca é feito sozinho. Quanto mais pessoas na mesa, melhor. E também, a comida nos traz o sabor da pátria dos nossos avós. Minha avó era espanhola: sua paella, sua empanada galega, sua tortilla me fizeram conhecer a Espanha muito antes de atravessar o Atlântico de avião. O mesmo acontece com aqueles que têm avós italianas.

Paladar: Como foi a experiência de escrever ficção histórica? O processo de escrita é diferente?

Florencia Etcheves: Foi uma deliciosa fascinação. Meu trabalho como jornalista investigativa teve muito a ver com isso; eu me dou bem com o mundo dos dados. Tenho meu próprio método de catalogar informações e hierarquizá-las, e não tenho medo de passar horas e horas diante de documentos, textos ou processos judiciais. Eu adoro essa tarefa. Sou um “bicho de bibliotecas”, como se diz no meu país. Além disso, sou tremendamente curiosa e não tinha muitas informações sobre Frida. Senti que todo esse trabalho era como conhecer uma nova amiga enquanto tomava tequilas.

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Quanto ao processo de escrita, não foi muito diferente dos meus outros processos, sou muito metódica e sempre faço minhas tabelas com linhas do tempo, meus cadernos para desenvolver personagens, meus cartões com arcos dramáticos e tramas. Só começo a escrever quando tenho tudo isso bem definido e pensado em detalhes. E sempre começo pelo final. Se não tenho o final, não sei para onde ir. O final da história é meu guia. O desafio é chegar a esse final de maneiras mais interessantes e divertidas.

Paladar: Você está escrevendo algum outro livro no momento?

Florencia Etcheves: Tenho muitas ideias, e isso é uma desgraça, porque acredito que ter muitas ideias é o mesmo que não ter nenhuma. Como também sou roteirista, estou escrevendo dois filmes agora. Mas sei que um dia desses vou acordar no meio da noite com uma ideia clara como um raio e vou começar meu próximo romance.

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