Tanto por seu grande porte, em média de 50 kg, quanto por sua carne saborosa, o atum tem muita coisa a se aproveitar além dos seus filés nobres e caros, muito apreciado em sashimis. No japonês Quina do Futuro, aberto há cerca de 30 anos em Recife, o chef André Saburó, filho dos fundadores, passou a estudar intensivamente o peixe há alguns anos e hoje serve até sarapatel com suas entranhas.
Medula, pescoço, coração e linha de sangue são alguns dos itens que o chef aproveita do atum. O pescoço, chamado de colar ou colarinho, é a fronteira da cabeça com o corpo e traz, num pedaço de cerca de 30 cm, gelatina, gordura e músculo. Depois de serrar a estrutura óssea em formato de paleta, ele deixa o colar um dia no sal e depois grelha no char broiler – é também como churrasco que Telma Shiraishi prepara o colar no Aizomê.
Perto do pescoço, na parte de trás da bochecha, tem ainda uma carne que lembra o cupim do boi, com gordura entremeada, e que Saburó prepara como sushi maçaricado, para o calor dissolver a gordura. “O atum de Recife é exportado sem cabeça, então pego-as para mim.”
A linha de sangue, que se espalha pelo corpo, e o coração ele leva para o sarapatel, apelidado de sarapatum por seu conterrâneo Joca Pontes (do Ponte Nova). Segundo Saburó, o atum é um dos peixes que mais têm sangue e um coração possante, porque tem de nadar o tempo todo senão morre. Na receita ele ainda coloca o bucho e a cartilagem da cauda, molinha. “É bem parecido com sarapatel de porco, com pouco gosto de mar.”
Ainda tem a medula, uma espécie de tutano que fica dentro da articulação das vértebras – como o peixe é grande, a junção também é. Julien Mercier aprendeu com Saburó a aproveitar essa parte e já a serviu crua gelada com raspas de limão. “Parece que você está comendo uma gelatina de suco de ostra, bem iodado”, diz Julien. Rafael Costa e Silva também serve a medula crua, marinada dois minutos no limão, como ceviche, e banhada em caldo de grão-de-bico tostado à mesa.