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Comida

Cacau com gosto

Por Daniel Telles Marques

Cacau com gostoFoto:

Provavelmente você sabe quais as uvas que vão no seu vinho preferido, talvez saiba o nome daquele lúpulo de que tanta gosta naquela cerveja e, se gosta de café, pode ser que prefira catuaí amarelo na xícara a bourbon vermelho. Mas, do chocolate, você sabe o quê? Que ele veio do cacau? Mas de que cacau?

A resposta a essa pergunta pode estar em uma pesquisa da fazenda M. Libânio, no sul da Bahia. Durante quase quatro anos, a fazenda colheu e armazenou amêndoas das variedades desenvolvidas para resistir à vassoura-de-bruxa. Das 23 variedades mais comuns na região, nasceram 23 chocolates diferentes, que foram avaliados e catalogados segundo sabores e aromas. A partir da pesquisa, o coordenador Eimar Sampaio acredita no surgimento de chocolates varietais ou de blends específicos.

Normalmente, chocolates nascem de um blend involuntário de cacau. Para fugir da vassoura-de-bruxa, praga que assolou a produção nas décadas de 1980 e 90, produtores passaram a misturar variedades de cacaueiros e assim dificultar a proliferação da doença. Resultado? Fazendas em que antes predominava certa variedade passaram a ter várias delas misturadas. E assim, diversificaram-se também as amêndoas que vão para os chocolateiros. O gosto ficou diverso, mas a habilidade do chocolateiro se tornou refém das misturas de amêndoas que chegam das fazendas.

Empresas como a francesa Bonnat e as brasileiras Chocolat du Jour e Unique já estampam nas embalagens as origens dos cacaus usados em seus chocolates. Em breve poderão também estampar a variedade das amêndoas.

A catalogação sensorial de variedades e a disposição das fazendas em oferecer cacau varietal podem criar um novo cenário chocolateiro. Antes, ainda é preciso acostumar o consumidor a comer chocolate de cacau. “Não se come chocolate com gosto de cacau”, diz Samantha Aquim, chocolateira carioca. “Primeiro, vamos mostrar para as pessoas que o chocolate vem do cacau e depois que as pessoas entenderem o que é cacau é que a gente pode falar de chocolate monovarietal. Meu sonho é que em 2025, quando uma criança olhar para um cacau, diga ‘mamãe, chocolate’.”

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Na fazenda Vale do Juliana, cacaueiros de uma única variedade foram plantados em uma área específica da fazenda e já começaram a dar frutos em escala de produção. “Este mês exportaremos nosso primeiro lote de amêndoas assim”, entusiasma-se Leonardo Sorice, diretor da propriedade. O lote foi para uma chocolateira nos Estados Unidos e em breve, lá fora, haverá mais um chocolate varietal feito com cacau brasileiro.

Ainda são poucos chocolateiros dedicados ao varietal. Henrique Almeida é um deles. Seu Chocolate Sagarana, homônimo da fazenda de onde saem as amêndoas do chocolate que ele produz, só usa a variedade maranhão em sua produção. Parte dos frutos também vai para Stephan Bonnat. “No Salon du Chocolat, em Tóquio, o chocolate mais caro era o Bonnat maranhão e as pessoas faziam fila para comprar”, conta. “É um cacau mais doce, com notas cítricas, floral e de café”, orgulha-se. A escassez vem de um gargalo da produção de amêndoas, porque a mistureba de variedades nas fazendas reduz o número de cacaueiros de uma única variedade na lavoura. “Quero fazer um chocolate só com frutos FL-84” (cacau produzido na fazenda Leolinda, de João Tavares), “mas a produção não é suficiente”, lamenta Samantha.

Patrícia Landmann, diretora da Chocolat du Jour, acredita que a crescente especificação na produção fará os chocolateiros “chegarem cada vez mais perto de um sabor mais específico de chocolate”. Cabe aos consumidores ultrapassar a simplificação grosseira entre amargo e ao leite. Há um espectro muito maior nos frutos.

Brasileiro e mestiço

Este é um TSH-1188. Dele se faz chocolates que ficam com cheiro de especiarias e um leve amadeirado. É fruto de um cacaueiro clonado para resistir à vassoura-de-bruxa e filho do cruzamentos de diferentes cacaus trinitários, que por sua vez, são filhos do cruzamento de cacau criollo, originário da América Central e México, e cacaueiros forasteiros originários da Amazônia.

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Durante muito tempo, trinitários clonados foram motivo do preconceito de grandes chocolateiros que afirmavam que cacau bom era só e somente o criollo e que os trinitários não tinham muito gosto e cheiro.Erraram feio. Afinal, foi de cacaus com esses nomes que João Tavares ganhou dois prêmios de melhores amêndoas do mundo em duas edições do Salon du Chocolat e chocolateiros de fama como Stephan Bonnat fazem alguns de seus melhores chocolates.

>>Veja a íntegra da edição do Paladar de 2/4/2015

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