Na Tailândia, pad thai, pad see ew e pad kee mao são apenas três dos inúmeros pratos populares de noodle. Mas, em restaurantes tailandeses de outros lugares, eles são canônicos.
“Estes são os três noodles que todo mundo que esteve na Tailândia quer fazer”, defende Watcharee Limanon, que vive entre Bangkok e os Estados Unidos desde 1994 e construiu um pequeno império culinário tailandês em Yarmouth, Maine, sua cidade natal.
Esses pratos são especialmente populares, explica Limanon, não apenas porque são vastamente disponíveis, extremamente baratos e deliciosamente lendários, mas também porque eles têm o tal “rot chaat dee” – aquele equilíbrio entre sabores (picante, azedo, salgado, doce e amargo), texturas (crocante e macia) e aromas (peixe e ervas) que os cozinheiros tailandeses – e os fãs de comida tailandesa – adoram.
“Você sabe aquele jeito que faz pipoca com caramelo ser uma coisa perfeita?”, questiona Pailin Chongchitnant, chef em Vancouver, no Canadá. “O doce faz você desejar o sal, e o sal faz você desejar o doce”. Em tailandês, disse ela, o termo para essa sensação de que você não consegue parar de comer é glom glom. “Um pad see ew bom de verdade é exatamente assim”, complementa.
Os noodles perfeitos
Mesmo para cozinheiros tailandeses experientes, não é fácil acertar esses pratos na cozinha de casa. Os noodles são uma comida de rua clássica, preparados na hora por vendedores que empunham woks gigantes e vão pegando ingredientes de dezenas de tigelas. Mas, para quem mora no exterior, a comida caseira costuma ser a única maneira de satisfazer seus desejos. (Restaurantes tailandeses fora da Tailândia, por muitas razões, raramente cozinham para os gostos tailandeses).
Como fazia tempo que procurava o noodle perfeito, perguntei a Limanon e outros cozinheiros como eles adaptam esses pratos em suas cozinhas, com ingredientes, equipamentos e desafios locais.
Primeiro: a wok nem sempre é a ferramenta certa para o trabalho.
O minúsculo apartamento em Manhattan para o qual a chef Hong Thaimee se mudou tinha um fogãozinho sem uma única boca potente. Então ela começou a usar sua Dutch oven.
“Mesmo que você consiga aquecer uma wok o suficiente para fritar, ao adicionar os ingredientes a wok esfria bastante”, disse ela. “O que você precisa é de uma panela que segure o calor”, com um fundo plano que entre em contato direto com a chama. (Os vendedores de noodle tailandês costumam usar woks planas pelo mesmo motivo).
Embora encontrar ingredientes “autênticos” possa ser um desafio, insistir na autenticidade muitas vezes é contraproducente, diz Chongchitnant, que publica vídeos detalhados de receitas em seu popular canal do YouTube, o “Hot Thai Kitchen”. “As pessoas na Tailândia também ficam brincando com as receitas”, conta.
Chongchitnant cresceu em Hat Yai, perto da fronteira sul com a Malásia, onde comia pad see ew feito com macarrão de ovo em vez do macarrão de arroz padrão. Tempos depois, sua família se mudou para Bangkok, onde os restaurantes se vangloriam por usar espaguete e linguine. Embora o prato original seja feito com carne bovina – parecida com o chow fun chinês – ela disse que frango e carne de porco são igualmente populares na Tailândia.
O dilema dos ingredientes asiáticos
Na América do Norte, se Chongchitnant não consegue encontrar gai lan, o brócolis chinês, ela usa broccolini (um híbrido de gai lan com brócolis), ou corta o brócolis em talos longos, porque o prato precisa do crocante dos caules grossos e verdes.
“As pessoas acham que um bom substituto para um ingrediente asiático é outro ingrediente asiático”, diz ela, observando que as pessoas muitas vezes sugerem o bok choy e o repolho Napa – inutilmente, na sua opinião – como bons substitutos para o gai lan. “Mas nem sempre faz sentido”.
Da mesma forma, ela reflete, os cozinheiros não tailandeses geralmente partem do pressuposto de que o melhor substituto para o manjericão-sagrado é o manjericão tailandês – mas o manjericão italiano faz uma combinação de sabor mais parecida.
Jam Sanitchat tem um restaurante em Austin, Texas, chamado Thai Fresh, que também funciona como escola de culinária, mercado e sorveteria vegana. Ela conta que, apesar da demanda de veganos e vegetarianos locais, não conseguia se imaginar fazendo pad thai sem molho de peixe.
“Passei muito tempo me recusando”, lembra. Mas, no fim, ela decidiu que o papel central dos condimentos – o onipresente molho de peixe, a pimenta em pó, as fatias de limão, a pimenta em conserva e muito mais – prova que, na Tailândia, o sabor às vezes é mais importante que a tradição. “Um chef francês jamais deixaria você temperar a comida dele”, diz. “Mas nós somos muito mais abertos à escolha”.
Compreender os ingredientes pode ser um desafio, especialmente para cozinheiros que não estão familiarizados com, digamos, toda a gama de molhos de soja asiáticos. O molho de soja preto tailandês tem uma doçura complexa; algumas marcas de molho de soja preto chinês são parecidas, mas outras são muito mais salgadas. A solução, diz Sanitchat, é sempre temperar de leve e depois provar.
Um molho com excesso de sal pode ser corrigido com açúcar mascavo. Um prato muito picante pode pedir uma pitada de açúcar, ou a acidez do tamarindo, do limão ou até do vinagre puro. (Cozinheiros modernos na Tailândia costumam usar vinagre destilado, mas o produto tradicional é feito de água de coco).
Limanon, que dá aulas de culinária tailandesa em sua casa, me orientou a fazer pad thai (ela usa uma frigideira antiaderente). Antes mesmo de começar a cozinhar, aprendi algo imensamente útil: ao usar noodles de arroz seco, não importa o que a embalagem diga, você nunca deve fervê-los. Para ficarem macios e elásticos, mas não moles, eles precisam ficar de molho em água quente até cerca de 70% do tempo de cozimento.
Embora o pad thai seja o prato nacional, é um acréscimo recente à tradição culinária.
A Tailândia tem sua própria culinária rica e antiga, mas a técnica de fritar noodles veio da China. O pad see ew e pad kee mao são populares há gerações, mas mantiveram uma identidade separada da culinária tailandesa tradicional.
E para beber…
Pode parecer contraintuitivo acompanhar o pad thai com vinho. A maioria das pessoas provavelmente escolhe cerveja, que é uma boa combinação. Mas este prato combina bem com muitos brancos aromáticos, particularmente aqueles que são moderadamente doces, como um riesling alemão spätlese. Ainda melhor seria um auslese bem envelhecido, que é potencialmente mais doce que o spätlese (a menos que envelhecido por pelo menos 10 anos, momento em que a doçura começa a suavizar). Rieslings secos da Alemanha e da Alsácia também são ótimas escolhas. Outras opções são grüner veltliner, gewürztraminer, silvaner, sauvignon blanc e pinot blanc. Eu não optaria por um tinto, mas se você quiser, descobri que cabernet franc fresco e Beaujolais-Villages combinam bem com os sabores ousados deste prato. — ERIC ASIMOV
Este artigo foi originalmente publicado no New York Times. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU