Lollapalooza com The White Lotus. Foi essa a sensação que os cinco dias de Cayman Cookout, festival gastronômico do Ritz-Carlton de Grand Cayman, deixou, graças a line-up, cenários, comes e bebes para ninguém botar defeito.
Diferente do seriado da HBO, o humor fez aparições, mas acidez e crítica não estavam no cardápio dos episódios, ou melhor, dos eventos da 15ª edição do Cookout. Na Food Lotus da vida rica real, tampouco teve barraco, o que, cá entre nós, todo ser humano normal gosta de presenciar.
Milionário fez fila para comer e comeu em pratinho descartável sem reclamar, dispensou Ferragamos, Guccis e Louboutins para ir descalço a churrasco e tietou seu chefs prediletos sem histeria. Ok, os mais de 10 mil coquetéis e as quase 3 mil taças de champanhe Moët & Chandon Brut Impérial servidos devem ter ajudado...
As borbulhas, aliás, estão na gênese da coisa: “Quando a gente abriu o hotel, percebeu que depois das festas de fim de ano ficava um pouco calmo aqui. Então, tomando champanhe e refletindo sobre o que poderia ser divertido para o hotel, para a ilha e para as pessoas, tivemos a ideia de um festival de vinho e comida”.
A explicação é do pai, Éric Ripert, que além do triplamente estrelado Le Bernardin, em Nova York, chefia o Blue, no Ritz-Carlton. Entusiasmado com o próprio projeto, o francês convidou seus melhores amigos – o espanhol José Andrés e o americano Anthony Bourdain – para bombarem os festejos. O que deu bastante certo.
Bourdain foi responsável por organizar uma feira com produtos e restaurantes locais. Hoje, o anfitrião é Andrew Zimmern, do “Comidas Exóticas” do canal Discovery, que somou gins aos runs e enfatizou o uso de facas, pimentas, cabra, cogumelos, wahoo (espécie de cavala gigante) e ervas nativas da ilha nas receitas.
Com simpatia, Andrew apresentou cada uma das barraquinhas da edição (a entrada valia US$ 250), falou da importância de refeições em mesas grandes, cheias de gente (coisa que raramente lhe acontece) e ainda confessou a pior coisa que provou entre todas as bizarrices de seus shows.
“Foram vermes de corais nas Ilhas Samoa, eram horríveis, mas eu não conseguia parar de comer, porque é um fenômeno que acontece uma vez em 20 anos”. Emocionado, lembrou que devido a um tsunami, todos os moradores do lugar não existem mais. E soltou um spoiler: uma nova temporada voltará ao ar em 2025.
Outro anfitrião célebre era Emeril Lagasse, cujos pratos e casos familiares são sucesso na TV americana há mais de 15 anos. Entre suas tarefas, estava levar cinco convidados a pescarem em alto-mar.
Durante as quatro horas do programinha de US$ 500, viu-se o sol nascer, escutou-se histórias de pescador (ali todo mundo jurou já ter fisgado algo digno de nota), descobriu-se o projeto do novo restaurante inspirado em suas heranças portuguesas e também seu empenho em levar o Guia Michelin para Nova Orleans (onde mantém um de seus três restaurantes).
Cerveja e Doritos foram compartilhados, mas peixe que é bom, ele não pescou... Tanto assim, que uma vez em terra firme, o chef Ramón Martinez o esperava com peixes-leão: “José Andrés não queria que você passasse vergonha e pediu para trazer o que ele pescou para você tirar foto”.
Com pés na areia e charuto na boca, o espanhol ativista e bem-humorado dos restaurantes Jaleo, protagonizou as sessões de receita e bate-papo mais disputadas do Cookout (US$ 245 cada). Numa, comandou uma paella sem arroz, na outra entrevistou Kristen Kish (vencedora do Top Chef que passará a apresentar o show) e Kwame Onwuachi (do Tatiana, restaurante afro-caribenho escolhido pelo New York Times a melhor novidade de 2023).
Na churrascada do evento, José Andrés entregava em mãos centenas de “temakis” de alface e cordeiro. O tal do churrasco (US$ 445) merece nota: apesar de comida em volume, servida na praia entre apresentações de DJ e show de drones, sabores, texturas e temperaturas estavam impecáveis.
De hamburguinhos de siri de Éric Ripert a doçuras do melhor confeiteiro do mundo, Antonio Bachour, passando por camarões gigantes e sustentáveis de Zimmern regados a incontáveis litros de spritz de Moët Chandon. Teor alcoólico à parte, houve ainda saideira no bar do lobby do Ritz-Carlton, com versões de sazerac, o coquetel icônico de Nova Orleans perfumado com absinto.
Ao longo dos dias, houve também speakeasy no spa (US$ 350); show privativo do Goo Goo Dolls (US$ 750), cujo maior hit é a canção do filme “Cidade dos Anjos”; velejada embalada por vinho rosé, lobster rolls e ostras com caviar (US$ 325); mergulho com arraias seguido de piquenique à beira-mar (US$ 485), viagem de jato à Jamaica inspirada em James Bond (US$ 5000) e um degustação de Romanée Conti guiadas por Éric Ripert (US$ 1515).
Não faltaram tons de turquesa nas águas e nem refeições especiais. O mexicano Enrique Olvera, dos premiados Pujol (Cidade do México) e Cosme (Nova York), preparou um almoço colorido, com direito a tequila e mezal premium (US$ 375), no Blue, restaurante que também abrigou jantares temáticos de trufas (US$ 575), caviar (US$ 575) e de encerramento (US$ 1.195).
Ao todo, o Cookout 2024 reuniu quase 100 eventos a partir de US$ 100 (caso da aula de yoga com taça de Veuve Clicquot). A maior parte, sold out. Para acompanhá-los e ainda ter o privilégio de encontrar os chefs participantes no mar, nos corredores e no café da manhã, as diárias a partir de US$ 3000 do Ritz-Carlton Grand Cayman foram disputadíssimas.
Mais do que nos preços ou na presença recorrente de trufa, caviar, lagosta e outras iguarias, mora aí a exclusividade: se oferecer para pegar um ovo beneditino a cozinheiros de mais de um milhão de seguidores no Instagram, vê-los jogar golfe, pickleball ou petanca, perguntar sobre uma receita, provar pratos assinados e, de quebra, tirar selfie sem se sentir ridículo.