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Comida

Ovas de peixes agregam textura, beleza e sabor de mar aos pratos

Quem disse que lugar de ovas de salmão, ouriço e capelim é só na cozinha fria japonesa? Chefs de acento contemporâneo indicam como usar ovas de peixes como tainha e truta, de origem nacional

Ovas de salmão e capelim. Foto: Marcos Mendes|Estadão Foto: Marcos Mendes|Estadão

Mari Hirata pega as ovas de bacalhau e mistura as bolinhas de tom rosa intenso com shoyu, manteiga e creme de leite fresco. Está feito o molho, uma espécie de carbonara do mar, que a chef nipo-brasileira radicada em Tóquio vai combinar com espaguetini recém-escorrido. A receita, que fez parte da aula anual da chef na Escola Wilma Kövesi, na semana passada, ilustra o diferente tratamento que ovas de pescados recebem em variadas cozinhas pelo mundo. E esse uso das ovas de um jeito ocidentalizado – além de sushis e sashimis – ganhou força no Japão nas últimas décadas. 

“A cozinha italiana começou a ficar na moda no Japão nos anos 1990. Havia prato do dia com espaguete e arroz ao lado”, conta Mari. A chef explica que esse espaguete com ovas de bacalhau, o tarako espaguete, é considerado o número 1 no Japão. “É tão popular que no mercado se vende tubo com o creme pronto. É para comer com macarrão comum. Num lámen não se coloca esse tipo de ova.”

Ovas de salmão e capelim Foto: Marcos Mendes|Estadão

Do mesmo jeito que a Europa invadiu o Oriente, a culinária japonesa influenciou cozinhas ocidentais e fez chefs levarem à mesa outras ovas além de caviar, como as típicas de sushis: ikura (ovas de salmão), massago (de capelim), tobiko (de peixe-voador) e uni (que são as ovas e todo o interior do ouriço-do-mar). 

As ovas agregam aos pratos um sabor de mar (toque iodado, umas mais intensas que outras), textura de bolinhas (umas maiores, como as de salmão) e apelo visual com cores variadas (amarela, laranja, vermelha, preta e até verde). 

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A maioria chega importada ao Brasil, já tendo passado por um processamento (com inclusão de sal, principalmente) para a sua conserva. Mas quando frescas elas oferecem ainda mais possibilidades gastronômicas, pois é o chef que faz a sua “conserva” e a reidratação com bebidas como espumante, cachaça e saquê (típico no Japão).

No Evvai as ovas de truta são usadas na finalização da carne cruda Foto: Tadeu Brunelli

No Brasil, as ovas frescas mais comuns são as de tainha, as de ouriço e as de truta, que ganharam espaço graças a criadouros na Serra da Mantiqueira e em Santa Catarina. 

No Evvai, o chef Luiz Filipe Souza começou a usar as ovas de truta no ano passado, compradas da Associação de Agroecologia da Serra Catarinense, em Lages (SC). Atualmente elas estão em dois pratos: na carne cruda (tartar) com creme de raiz forte e no risoto nero de sepia com lagostim. “Ela explode na boca, a cor é linda e ainda por cima é uma ova brasileira”, diz Luiz, que usou as ovas também num dos pratos com o qual foi classificado para a final do Bocuse d’Or, que será em janeiro na França.

Para fazer uma espécie de cura, Luiz primeiro coloca as ovas frescas por 1h30 na salmoura (o que a deixa mais “crocante”, depois de o sal ajudar a formar uma membrana mais resistente) e depois 1h30 no prosecco (que agrega acidez).

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RECEITAS:+ Chefs ensinam como usar ovas de peixe em diferentes preparos

Ovas de todas as cores

Peixe da mesma família do salmão, a truta é criada em água doce fria e não migra para o mar, como o salmão. Suas ovas são menores que as do salmão (devido ao tamanho do peixe) e sua coloração é naturalmente amarela – se a ração não contiver corante, como explica a pesquisadora Yara Aiko Tabata, do Instituto de Pesca em Campos do Jordão. (É ali que Yara desenvolve há uns anos pesquisa de criação de truta e vende o excedente das ovas para restaurantes das redondezas, como o Kouguem da japonesa Mayumi Yasunaga.) 

Segundo a pesquisadora, as ovas de peixes que vivem no mar adquirem as cores dos peixes e crustáceos dos quais se alimentam. As do salmão selvagem são naturalmente laranja. O salmão de cativeiro, porém, recebe ração com pigmento.

Lagostim com consommé de tomate verde e dill finalizado com massago, do Ema Foto: Wellington Nemeth

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Outras ovas são “pintadas” após a desova, caso do massago (ovas de capelim), que podem ser pretas, vermelhas e até verdes, quando pigmentadas com wasabi. O massago preto está entre os preferidos, pois remete à cor natural do caviar de beluga (ovas de esturjão, entre as mais caras da espécie). No Ema, o massago é usado por Renata Vanzetto para finalizar o lagostim com consommé de tomate verde e dill.

As ovas de capelim também ficaram mais populares pois custam menos que a metade do preço das ovas de mujol, tradicionais “substitutas” do caviar de beluga e de sabor mais intenso que o massago. Da família da tainha, o mujol (que também serve para fazer bottarga) tem ova pigmentada de preto após a desova.

No Olympe, no Rio, o chef Thomas Troisgros serve no seu “menu confiance” um lagostim com couve, beurre blanc e ovas de mujol empanadas. Passadas pela farinha de trigo, elas se soltam umas das outras. “Quando você frita a ova de salmão, ela parece uma cera por dentro. Já a de mujol fica oca, supercrocante”, diz o chef, que apresentou essa ova frita há quatro anos em aula do Paladar Cozinha do Brasil ao lado de seu pai, Claude.

As ovas de tainha, muito usadas para bottarga (quando curam e secam), também são usadas frescas (e vendidas congeladas após junho, com o fim da safra no Brasil). Dagoberto Torres, da Barú Marisqueria, costuma fazer tempurá de ova de tainha fresca, depois de tirar a membrana do ovário e deixá-la marinando uma noite. 

Também de frutos do mar

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Além de peixes, também ovas de crustáceos e moluscos são apreciadas, como as de camarão e vieira. As mais comuns são as de ouriço-do-mar (uni), cujo “creme” alaranjado recheia a carcaça. No Olympe, quando tem uni, Thomas o usa na salada de folhas de azedinha com picles de cebola roxa e espuma de vinho branco.

No paulistano Tuju, volta e meia o uni aparece – o chef Ivan Ralston já serviu fígado de tamboril com uni no brioche de fubá e agora tem, no seu menu de inverno, a tostada de milho branco nixtamalizado com ouriço, abacate, limão-cravo e coentro. “A melhor época do uni é o inverno. É muito bom se bem manipulado, com sabor bem iodado e complexo”, conta Ivan, que passa limão e sal nele.

Tostada de milho branco nixtamalizado com ouriço, abacate, limão-cravo e coentro no menu do Tuju Foto: Gilberto Bronko

O chef Thiago Cerqueira Lima, do Loup, gosta da untuosidade do uni. Nos tempos do extinto Sympa, ele trocou a maionese do steak tartare pelo uni. “O uni é como um foie gras de peixe, uma gordura cremosa.”

Onde comprar

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Casa Santa Luzia, Jardins, tel. 3897-5000 - ovas de mujol - R$ 126, 100g - ovas de salmão - R$ 54,90, 100g - ovas de capelim (laranjas e pretas) - R$ 56, 100g - ovas de arenque (pretas) - R$ 95, 100g

Peixaria Mitsugi, Liberdade, tel. 3567-7670 - uni congelado - R$ 100, 200g - ovas de salmão - R$ 70, 100g - ovas de capelim (laranja) - R$ 26, 100g

Peixaria Nossa Sra. de Fátima, Pinheiros, tel. 3032-1221 - ovas de salmão - R$ 94, 150g - ovas de capelim (pretas, vermelhas e de wasabi) - R$ 36, 150g - ovas de peixe-voador (pretas e laranja) - R$ 36, 150g - ovas de tainha congelada - R$ 90, a dupla

Ocean Six, Moema, tel. 5093-9432 - ovas de capelim (laranja), R$ 25, 100g - ovas de salmão, R$ 58, 100g - ovas de tainha congelada - R$ 120 o quilo - uni (chega toda sexta, tem de ligar antes) - R$ 148, 250g

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