O que aprender em um concurso de vinhos

O que aprender em um concurso de vinhos

Publicado por: Suzana Barelli Publicado: 04/08/2024 18:49 Visitas: 395 Comentários: 0

Estamos em tempos de medalhas – e parabéns à ginasta Rebeca Andrade que ganhou a sua medalha de prata enquanto eu escrevia esse texto. E o vinho também tem as suas condecorações para exibir em suas garrafas. Mais: muitas vezes, essas medalhas de ouro, prata ou bronze são o principal guia para o consumidor escolher o vinho da ocasião.

Mas quais são as regras para essas medalhas? Os principais concursos de vinho que concedem medalhas seguem as regras da Organização Internacional da Uva e do Vinho, a OIV, órgão que reúne os principais países produtores e traz as estatísticas do setor.  A competição mais conhecida por seguir as regras da organização é o Concurso de Bruxelas. E pelas regras da OIV, 30% das amostras inscritas em seus concursos devem receber medalhas, obrigatoriamente, independentemente da qualidade do líquido dentro das garrafas.

Em uma conta simples significa: se o concurso tiver 1000 vinhos inscritos, 300 deles terão medalha. As medalhas são concedidas conforme as notas, dos mais bem pontuados aos que tiveram menores pontos em uma escala de até 100 pontos. Mas, se as 300 melhores notas equivalerem ao ouro, serão 300 ouros e não haverá prata ou bronze. Isso vem acontecendo em diversos concursos, que concedem apenas ouro (em geral tem também uma categoria gran ouro) ou apenas ouro e prata.

Foi o que aconteceu na última edição do concurso Brazil Wine Challenge, promovido pela Associação Brasileira de Enologia em julho passado, em Bento Gonçalves (RS). 

Em sua 12ª edição, o concurso concedeu 322 medalhas para as 1037 amostras inscritas. São vinhos elaborados por 191 vinícolas, de 14 países diferentes. Destas, 26 receberam o gran ouro e 296 conquistaram a medalha de ouro.

Neste concurso, recebiam o gran ouro os vinhos pontuados a partir de 93 em uma escala de até 100. O ouro equivale às notas entre 89 e 92; a prata, de 88 a 84, e o bronze, de 80 a 83. Eu tive a oportunidade de ser uma das 84 juradas presentes entre os três dias da avaliação. E a cada gran ouro a mesa julgadora, formada por cinco pessoas, batia palma, indicando a medalha máxima.

 


Avaliando espumantes no Brazil Wine Challenge

Mas, por outra regra da OIV, eu jamais saberei qual foi o vinho que na minha opinião mereceu o gran ouro (ou os ouros, pratas e bronze) e todos os aplausos. Só sei que foi um vinho branco. “As regras da OIV garantem sigilo nas amostras”, explica Ricardo Morari, presidente da ABE. Por mais que a regra seja polêmica, é a maneira encontrada para proteger os produtores e garantir um número crescente de inscrições – pela primeira vez o concurso rompeu a barreira das 1000 amostras, o que foi comemorado pelos organizadores.

Assim, os produtores inscrevem os seus vinhos, mas se a amostra for mal avaliada, ninguém saberá. Nem o próprio produtor, que poderia aproveitar a informação para melhorar o seu vinho. Mesmo na entrega das medalhas não é revelado a nota de cada amostra premiada, apenas qual a medalha obtida.

Para os jurados, a participação permite ter uma ideia de como estão os vinhos em uma dada região. Por dia, são degustados ao redor de 40 amostras, em grupos formados por cinco degustadores. No Brazil Wine Challenge, mesmo com o aumento da inscrição de amostras de vários países, a grande maioria é de rótulos brasileiros.

A minha mesa, presidida pelo enólogo Dirceu Scottá, degustou muitos espumantes brancos brut, espumantes rosés, brancos e também muitos tintos. As únicas informações disponíveis para o jurado, que prova as amostras às cegas, são a categoria (vinhos rosés, brancos aromáticos e não aromáticos etc), o grupo (vinhos tranquilos, espumantes e destilados) e a safra. Depois das notas entregues, os jurados são informados sobre qual o país de origem de cada amostra degustada.

Mas ao degustar vinhos da mesma categoria é possível fazer uma análise. Nos espumantes, o foco segue nos vinhos brut secos. Muitas amostras (mas não todas, sempre é bom lembrar) com muita qualidade, frescor e complexidade. Nos espumantes rosés, há mais críticas, principalmente porque várias das amostras tinham uma nota acima de açúcar residual. Infelizmente a minha mesa não provou os moscatéis, que também aparecem como uma vocação brasileira.

Nos chamados vinhos tranquilos (sem borbulhas), os rosés também mostraram essa tendência para o açúcar residual. O painel surpreendeu com alguns brancos secos bem elaborados. Nos tintos, que foi a maioria dos rótulos degustados, os estilos foram os mais variados. Mas destaca-se a preferência dos enólogos brasileiros por vinhos muito extraídos, com muitas notas de frutas vermelhas e negras maduras ou bem maduras. E também pelo uso excessivo de barricas de carvalho. Notas de tostados, baunilha, coco, bala de leite, todas associadas ao estágio em madeira, reinavam no painel, muitas vezes deixando as notas frutadas em segundo plano.

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