Que calor! Me traz um rosé, por favor!
O ano de 2023 foi confirmado como o mais quente já registrado, segundo o relatório do Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus (C3S), a agência europeia do clima, divulgado nesta semana. Os terraplanistas que duvidam dos efeitos do aquecimento global procuram alguma explicação mística para esta canícula toda. E há negacionistas entre apreciadores e até críticos de vinho! Mas não vai adiantar a resistência aos dados da ciência. 2024 será ainda mais tórrido, com recordes de temperatura que vão transformar este planeta na sucursal de o Inferno de Dante.
Não dá nem para fugir para as montanhas. Os termômetros marcam 34 graus, com viés de alta. Você está com os pés na areia, em volta da piscina, à sombra de uma árvore no campo, em um restaurante ao ar livre, no teu apartamento com o ventilador, ou para os privilegiados o ar-condicionado, no máximo. Nós e nossas circunstâncias... E na hora de escolher um vinho, como fica?
Com este calor todo e o verão chegando sem cerimônia o vinho tem de refrescar o paladar e não esquentar o corpo, de acordo? A solução mais óbvia, amiguinhos, é abrir um rosé.
Despejar seu líquido na taça, acompanhar as paredes suarem e se deixar levar pelo impacto do primeiro gole. Esta sequência de serviço tem o mesmo efeito de propaganda de pasta de dente. Ahhhhh!!!! É refrescante até de olhar. Um rosé, nessas horas, pode ter o efeito de uma miragem no deserto.
Se fosse uma estatística do IBGE o rosé seria classificado como um vinho “nem-nem”: não é nem tinto nem branco. Assim como a população que não trabalha nem estuda também é jovem, alegre e descompromissado.
A maioria dos vinhos rosés é elaborada com uvas tintas, mas há casos raros que misturam uvas tintas e brancas. O que dá a cor pantone final de cada vinho rosé é o tempo de permanência que a casca da uva tinta fica em contato com o líquido.
Vinho de piscina, vinho de praia, vinho de verão. Estas definições, meio manjadas e quase impossíveis de evitar, porém carregam preconceito e injustiça com a categoria.
O rosé é um curinga na harmonização, uma delícia no aperitivo e apresenta variações de cores e sabores que encantam o paladar de quem busca algo mais num gole de vinho. É um vinho deixa a vida me levar, vida leva eu.
Nem melhor, nem pior
Sabe aquela pergunta clássica: qual vinho você levaria para uma ilha deserta? Normalmente os conhecedores escolhem algum tinto excepcional, de safra antiga, um porto vintage, uma branco etéreo, algo que tenha marcado uma existência, transformado um momento, com pontuações estrelares. Um vinho rosé raramente aparece como resposta. Na vida real, no entanto, sob um sol escaldante, aposto que uma garrafa refrescante, saborosa, frutada e leve de um rosé deixaria qualquer um mais feliz na tal ilha deserta imaginária.
Mas se o rosé é tão versátil e bacana, por que ele não é mais cultuado entre os especialistas? Para ser sincero, nunca testemunhei alguém declarar que um rosé foi o vinho de sua vida. Também não diria isso. Naquele almanaque 1001 Vinhos para Beber Antes de Morrer não há um mísero rosé. Ou seja, para os autores tudo bem passar por esta vida sem provar um rosé antes do último suspiro. Não acho não, a vida é feita de camadas e momentos. E há várias oportunidades para um rosado na taça.
O rosé é isso aí. Provocante, descontraído, nem melhor nem pior que os outros tipos de vinho, apenas cumpre seu papel: de uma bebida que refresca, envolve e alegra o paladar e melhora aqueles instantes que a vida merece ser curtida com leveza. Na harmonização é eclético. É sempre recomendado para acompanhar pratos leves, saladas, entradas, embutidos, risotos, massas, cozinha japonesa (pra quem aprecia).
42 rosés avaliados pelo Guia dos Vinhos
O Guia dos Vinhos dedica uma seção exclusiva aos vinhos rosés. Foram avaliados 42 rótulos com a seguinte participação, por país: 17 franceses, 5 portugueses, 5 espanhóis, 5 chilenos, 4 italianos, 3 argentinos, 2 brasileiros e 1 norte-americano
Se a escolha é um rosé, a Provence, no sudoeste da França, é a opção mais clássica e acertada. E pega bem, vamos combinar. Produzindo caldos rosados há mais de 2.500 anos, é a única região do mundo onde este tipo de vinho é a esmagadora maioria: 88% da produção é composta de rosés. E mais: algo em torno de 8% dos rosés produzidos no mundo têm origem na Provence. Não é à toa que dos 17 rótulos rosés franceses avaliados pelo Guia dos Vinhos 7 são da região da Provence e 3 foram pontuados entre os Dez Mais da categoria.
O rosé mais pontuado no Guia dos Vinhos, no entanto, ora pois, é um rótulo português, da região do Douro: Quinta do Crasto Douro Rosé 2021. Nossa equipe de editores: assim descreveu o vinho: “Feito com 85% de touriga nacional, o estilo floral se impõe neste rosé, dando feição alegre e primaveril ao conjunto. Completam o nariz toques de pêssego e framboesa. Na boca tem acidez gostosa, que faz chamar o próximo gole. Ótimo acerto entre frescor, corpo e precisão dos aromas”
Jovem, fresco, acessível, baixo teor alcóolico e aquela cor
Para aqueles que ainda relutam em se render aos encantos de um vinho rosé, listamos cinco razões para beber este tipo de vinho no verão:
1. É um vinho para beber jovem, nada de ficar guardando na adega e esperando evolução. O melhor momento é aqui e agora. Quanto antes consumir, melhor;
2. Não tem como fugir, é ideal para o verão. É um vinho que deve ser bebido bem fresco, quase gelado, em temperaturas que variam de 7º a 11º. Tira da geladeira abre e toma, sem complicações;
3. Não costuma ser caro. Claro, há diferenças de preços, dependem da região, produtor etc. Mas no geral são vinhos acessíveis. No Guia dos Vinhos há 13 rótulos até 100 reais;
4. teor alcoólico é baixo, em torno de 12,5%, o que convida e permite encher mais taças sem culpa;
5. E tem a cor, ou melhor as cores, que vão de um rosa pálido, passando por tons de casca de cebola, salmão até um rosa mais intenso. Mas se ainda lhe faltam argumentos para apreciar uma taça de rosé neste verão, fique com a poesia de sua tonalidade: um vinho que tem a cor do por e do nascer do sol!