Quando a uva encontra o seu país
A malbec deve muito à Argentina. Ou será que é a Argentina que deve a malbec? O fato é que as duas, variedade e país, parecem viver uma relação de simbiose. O ganho de qualidade dos vinhos argentinos, fenômeno que começou no final do século passado, tem na malbec a sua base propulsora. E a variedade ganhou fama exatamente por seu desempenho em solo argentino. Antes, era “apenas” a uva originária de Cahors e que vez ou outra entrava em pequenas porcentagens em alguns dos vinhos de Bordeaux – a malbec é uma das seis variedades do tradicional corte bordalês, junto com a cabernet sauvignon, a merlot, a cabernet franc, a petit verdot e a carménère.
Trazida para a Argentina no século 19, ela atualmente responde por 39,44% das variedades tintas do país e seus 45,6 mil hectares de vinhedos correspondem à 23% da área plantada. Ocupa essa liderança desde 2011. Foi o mesmo ano em que a Wines of Argentina definiu que na data de 17 de abril seria comemorado o Dia Internacional da Malbec, em uma época em que não era comum festejar o, digamos, aniversário de uma variedade.
O dia de 17 de abril é uma referência porque foi nessa data, no ano de 1853, que o governo da província de Mendoza votou uma importante medida para aumentar a qualidade do vinho local. No mesmo ano, as primeiras mudas de malbec chegaram à Argentina, trazidas pelo agrônomo francês Michel Aimé Pouget (1821-1875). O sucesso da malbec, no entanto, não foi imediato. Ela amadurecia bem, por ter encontrado o seu habitat em um clima desértico ao contrário das regiões chuvosas francesas onde era cultivada. Mas não tinha o rendimento das demais variedades locais.
Com mais de 100 anos em solo argentino, e bem adaptada, a malbec começou a revelar o seu potencial no final do século passado. Foi quando enólogos, argentinos e estrangeiros, começaram a investir na melhora da qualidade do vinho local. Aí a malbec começou a brilhar e a se transformar em sinônimo de vinho argentino.
Atualmente, há malbec de vários estilos e propostas. O Guia dos Vinhos degustou 56 garrafas em que a malbec se faz presente.
O malbec de maior destaque foi o Luigi Bosca Malbec De Sangre Edicion Limitada 2020, com uvas de Altamira, uma das regiões aos pés da Cordilheira dos Andes, que vem dando origem a malbecs de maior complexidade. Obteve 95 pontos, em uma escala de até 100. A seguir, o Guia traz cinco malbecs com 93 pontos, um deles, o Achaval Ferrer Malbec 2021, por R$ 130, e indicado para ser consumido com carnes – essa aliás, parece ser uma das maiores vocações desta uva.
Para quem gosta de achados, o Vistalba Un Mundo Chiquito 2022 é um 100% malbec, que conquistou 91 pontos e é vendido por R$ 60. Com 90 pontos e vendido por R$ 49, o Mauricio Lorca Graffitti Malbec 2022 é um malbec mais simples, floral, indicado para um final de tarde de verão.
Porque nesta história, a malbec também foi construindo uma história de diversidade de estilos e propostas de consumo.
(os preços são os pesquisados em junho de 2023, na época da degustação do Guia dos Vinhos)