No ano de 2015, a Universidade chilena de Talca divulgou um estudo, em parceria com a vinícola Casa Silva, sobre os clones da Carmenère. A ideia era entender um pouco mais desta variedade que, apesar da origem francesa, é tão ligada ao Chile. Em uma explicação simples, cada clone vem de uma videira-mãe e, quando replantado, reproduz as suas características.
A pesquisa apontou que havia apenas dois clones de Carmenère, indicando que era pequena a variedade da uva, ao contrário do que se imaginava. A Pinot Noir, por exemplo, tem cerca de 50 clones registrados. “Quando maior o número de clones, tende a ser maior a capacidade da videira se adaptar a diferentes solos e climas”, explica o enólogo Mario Geisse, da Casa Silva. A pesquisa indicou também que os chilenos estavam começando a tentar entender a sua variedade emblemática.
Descoberta em 1994, em um vinhedo da Viña Carmen, a Carmenère há muito era cultivada no Chile, confundida com a Merlot. Ela foi exportada acidentalmente para o país andino, junto com as mudas de Merlot, no século XIX, e, desde então, as duas plantas eram cultivadas misturadas. Seu primeiro vinho oficial foi lançado em 1996 e, atualmente, ela é a terceira uva tinta mais plantada no país, com cerca de 10 mil hectares de vinhedos.
Ainda bem que os produtores não pararam nesta pesquisa. Nesta semana, Marcelo Garcia, enólogo da vinícola Terranoble, fez uma apresentação virtual sobre a Carmenère de diferentes vinhedos, daquele plantado mais perto dos Andes e outro mais próximo do Oceano Pacífico.
Mostrou que o estilo mais opulento, com as notas de frutas muito maduras, ou aquele com muita madeira está ficando para trás. “Gosto daqueles Carmenères mais frutados, com tipicidade”, define ele. A Terranoble tem dois vinhos que mostram esta diferença de vinhedos: o CA1, com uvas próxima dos Andes, e o CA2, mais perto do Pacífico, que são vendidos por R$ 276, cada, na Decanter.
É o caminho dos tintos elaborados com esta uva. Até um passado recente, a Carmenère era colhida em meados de maio e, não raro, resultava em vinhos com aromas de frutas sobremaduras. Atualmente a data adiantou para abril, o que gera uvas mais frescas. As podas são mais precisas, para facilitar a completa maturação da uva e evitar a superprodução. E o rendimento por plantas caiu sensivelmente. “Um Carmenère da linha reserva não deve ter mais de 10 mil quilos por hectare”, calcula Geisse (o seu reserva é vendido por R$ 106, na Vinhos do Mundo). Em linhas mais nobres, e mais complexas, o rendimento cai para 6 a 7 mil quilos por hectare.
Com o rendimento controlado e o cultivo em regiões mais quentes e com boa amplitude térmica (a diferença de temperatura entre o dia e a noite), a Carmenère não tem aquelas notas de pirazina, identificadas como pimentão verde pelo consumidor. Também vem reduzindo o estagio em barricas de carvalho – muitos enólogos partem para barricas usadas, que reduzem a sensação de notas que lembram carvalho no paladar.
São mudanças que mostram o aprendizado no cultivo da Carmenère, que é bastante apreciada pelo consumidor brasileiro. Outras certamente virão, resultado do maior conhecimento da variedade.