O evento de lançamento do guia Descorchados, que avalia vinhos da Argentina, Brasil, Chile e Uruguai, é uma oportunidade para descobrir, na taça, algumas das tendências dos brancos e tintos destes quatro países – e também um pouco dos vinhos peruanos, que agora são também pontuados pelo guia, mas não entram na versão impressa, apenas na on-line. Neste ano, não foi diferente nesta megadegustação liderada pelo chileno Patrício Tapia nesta semana em São Paulo. Mas o que chamou muito a atenção foi a quantidade de enólogos e produtores presentes, motivados pela oportunidade de encontrar consumidores depois de dois anos de quarentena.
Novos estilos de vinhos com a torrontés, variedade branca autóctone da Argentina, foi o primeiro destaque. Se outrora a uva era conhecida por seu perfil muito aromático e um amargor no final, ela agora ganha novas vertentes. Primeiro, nas mãos de Susana Balbo, a primeira enóloga a se formar na Argentina e que iniciou carreira em Salta, no norte do país, a terra desta variedade. Além do seu já conhecido Torrontés Signature com passagem em barrica de carvalho e maior complexidade, ela apresentou um torrontés “laranja”, como são chamados aqueles brancos que fermentam junto com a casca e o engaço. Além da cor mais intensa, um amarelo meio rosado, é um vinho de maior estrutura, até com certo tanino presente (o Signature custa R$ 210, e o laranja ainda não tem preço definido, na Cantu).
Outro exemplo é o Gran Enemigo Torrontés 2019, um branco muito elegante (e sem as muitas notas florais dos torrontés mais simples), elaborado por Alejandro Vigil no vale de Uco (o vinho ainda não chegou no mercado brasileiro e deve ser importado pela Mistral). Em plena colheita na Argentina, Vigil foi um dos enólogos que marcou presença em apenas um dia do Descorchados. Veio, apresentou seus vinhos e logo voltou para a colheita na Argentina.
Ainda na Argentina, foi interessante notar bons vinhos fora da região de Mendoza, de zonas menos conceituadas como Barrancas e Rivadavia, ou bem menos exploradas, como a Patagonia – aqui o destaque foi para um improvável e bom merlot (R$ 289, na World Wine), elaborado pela vinícola Otronia.
Do Chile, as melhores degustações foram aquelas que permitiram comparar vinhos. Primeiro no painel de uvas do sul do país andino, elaboradas com a cinsault e com a País. De Itata, mas fora deste painel, o De Martino Old Vine Series Las Olvidadas 2020 (R$ 599, na Winebrands) também surpreendeu. Depois um painel com os tintos mais importantes do vale de Maipo. Lado a lado, o Casa Real Reserva Especial 2019 (R$ 999, no Pão de Açúcar), Enclave 2018, da Ventisquero (R$ 750, na Cantu), El Principal 2018 (R$ 1.228,90, na Decanter), e o Lota 201, da Cousiño Macul (R$ 701, na Casa Santa Luzia). Mas o ponto alto deste painel foi a comparação com quatro cabernet sauvignon de vinhedos vizinhos, todos da safra de 2019. Era o Don Melchor (R$ 1.099, a safra 2018, na Encontrevinhos.com.br), o Viñedo Chadwick (R$ 6.389, na Grand Cru) e o Almaviva (R$ 2.999, a safra de 2018, na World Wine) e o Silêncio, da Cono Sur (R$ 1.190, na WorldWine).
Do Uruguai, a impressão é de mais vinhos elaborados com a albariño, variedade branca que faz par com a tinta tannat entre os destaques do país. O Brasil se mostrou mais tímido nesta edição – no painel que acontece um dia antes do evento, apenas um rótulo brasileiro foi selecionado. Trata-se do Sacramentos Sabina Syrah 2021, com uvas da Serra da Canasta (R$ 150, no site da própria vinícola, que ainda está em construção). Um syrah mais tenso, com a fruta na medida, e elaborado com a técnica de dupla poda – quando a colheita acontece no inverno.