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Le Vin Filosofia

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Esqueça a variedade, pense no terroir

Na comemoração dos 20 anos do Pangea, vinho tinto ícone da Ventisquero, o foco é no lugar e não na uva syrah

Recentemente, o enólogo chileno Felipe Tosso veio ao Brasil para comemorar os 20 anos do Pangea, o primeiro tinto premium da Viña Ventisquero. Trouxe na mala seis safras deste vinho que é feito apenas com a uva syrah, cultivada nas montanhas do vale de Apalta, em Colchagua, ao sul de Santiago.

O Pangea, que tem seu nome inspirado no supercontinente que caracterizava o nosso planeta há mais de 250 milhões de anos, é elaborado a quatro mãos. Desde sua primeira safra, em 2004, Tosso conta com a parceira com o enólogo australiano John Durval, famoso por ter criado o tinto Grange, até hoje a melhor referência australiana em shiraz – a uva, de origem no vale do Rhône, na França, ganhou grafia própria quando chegou no país do canguru, mudando de syrah para shiraz.

SEIS SAFRAS

As seis taças degustadas (2005, 2008, 2011, 2013, 2017 e 2021) revelam a evolução deste tinto. A começar com o fato de suas vinhas terem ficado mais velhas, suas raízes mais profundas e, com isso, suas vinhas gerarem frutas mais complexas, até o maior aprendizado dos dois enólogos, em cultivar a variedade aos pés da Cordilheira dos Antes. As primeiras mudas de syrah foram plantadas no ano 2000 pela Ventisquero e a pioneira safra de 2004 chegou ao mercado em 2006.

O enólogo chileno Felipe Tosso veio ao Brasil para comemorar os 20 anos do Pangea, tinto premium da Viña Ventisquero Foto: Claudia Uribe/Divulgação

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E se a safra de 2005, a primeira desta degustação, traz um tinto com bons aromas de especiarias e notas ligadas à sua evolução, como frutos secos, a de 2021, que será lançada em breve, apresenta maior complexidade, seja nas especiarias e nos aromas frutados, como na sua estrutura e na maior amplitude no paladar – no Brasil, os vinhos da Ventisquero são importados pela Cantu.

“Desde 2017, optamos por amadurecer o tinto em foudres”, conta Tosso. Os foudres são barricas maiores, com capacidade a partir de 1,5 mil litro, que permitem uma relação mais harmônica entre o líquido e a madeira. No início, o tinto amadurecia em barricas novas de carvalho francês, com capacidade para 225 litros, que são o formado utilizado em Bordeaux.

FOCO NO TERROIR

Mas a grande diferença nestes 20 anos está no conceito do vinho. Na apresentação comemorativa, Tosso descreveu o terroir local, contou que a inclinação das vinhas está entre 30 e 35 graus, o que influi na incidência solar. Comentou do manejo para que as uvas possam ser colhidas em março (antes, a colheita avançava para abril) e do plano de aumentar os vinhedos de syrah para o Pangea – quando o projeto nasceu eram 10 hectares, atualmente são 15 e o plano é chegar aos 20 hectares. E só neste ponto, o enólogo falou da uva syrah.

Não que a variedade não seja importante – ela é, e muito. Mas cresce entre os enólogos do chamado Novo Mundo (fora da Europa) a ideia de trazer de volta o conceito do lugar onde o vinho é elaborado (e a palavra terroir é a união do solo, do microclima local e da variedade), diminuindo o foco na variedade. Atualmente para Toso é mais importante falar de Apalta do que da syrah. O nome da uva, inclusive, nem aparece no rótulo.

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“Nos grandes lugares, precisamos valorizar o local e não a variedade”, resume ele. Toso defende a variedade como a tinta mais bem adaptada à Apalta. Atualmente, inclusive, a maioria dos 70 hectares da Ventisquero em Apalta, é cultivada com a variedade.

Vale lembrar que a ideia de destacar o nome da uva no rótulo nasceu com os produtores norte-americanos, na Califórnia. Ao contrário dos europeus, que valorizavam a região, seus produtores optaram por colocar o nome da variedade no rótulo do vinho, com maior destaque do que a região em que o vinho é elaborado. Foi uma estratégia que deu tão certo que levou até muitas vinícolas europeias a passarem a estamparem o nome da uva no rótulo, o que era impensável até os anos 1990, talvez o ano 2000.

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