Os grandes vinhos chilenos ainda são um capítulo recente na história vitivinícola do país andino. Os seus melhores tintos começaram a nascer no final da década de 1980, início dos anos 1990. A uva cabernet sauvignon, desde o início, tomou a dianteira como a grande variedade tinta do país. É neste cenário que surge o rótulo Casa Real, posicionado desde a sua primeira safra, em 1989, como vinho premium da vinícola Santa Rita. E nasce já rompendo fronteiras, elaborado por uma mulher, a enóloga Cecília Torres, pioneira em um cenário bastante machista, no vale do Maipo.
Assim, provar o Casa Real é provar história. E foi esta experiência que Sebastián Labbé, o responsável por este vinho desde 2016, proporcionou ao Paladar, em sua passagem pelo Brasil no início de abril. Na mala, ele trouxe as sete garrafas, todas escolhidas com muita atenção na adega. A seleção incluía safras antigas, como a de 1995 e a de 2005, e também as duas últimas, que ainda não chegaram no mercado brasileiro, a de 2021 e a de 2022 – esta última, aliás, só será lançada oficialmente em setembro, na Place de Bordeaux, na França, onde alguns dos grandes rótulos chilenos têm conseguido brilhar.
Um sonho

O Casa Real nasceu como um sonho do empresário chileno Ricardo Claro (1934-2008), o dono da vinícola. Ele buscava um grande vinho, que combinasse com o hotel Casa Real, uma hospedagem já então bem glamourosa, localizada ao lado dos vinhedos, em Alto Jahuel, pertinho de Santiago.
A época coincide com o início outros grandes projetos ousados, focados em tintos de qualidade, como o Don Melchor e o Almaviva, por exemplo, localizados do outro lado do rio Maipo.
A seleção do vinhedo não foi difícil, escolhendo dois lotes plantados com cabernet sauvignon, um deles de 1970, em um total de 20 hectares. “Mesmo sem maiores estudos, sabíamos que as melhores uvas vinham destes vinhedos”, conta Labbé. Ele explica que é possível estabelecer uma relação entre o crescimento das vinhas de cabernet sauvignon e a fase do pintor, quando a casca da uva passa da cor verde para a rubi. “Há um denominador comum entre a qualidade de cada vinha e a sua capacidade fisiológica de crescer”, afirma Labbé. A constatação é resultado não apenas da observação do vinhedo, mas de muitos estudos sobre a cabernet sauvignon em solo chileno. Porque, apesar de ser a variedade tinta mais plantada no Chile, e de estar presente nos mais diversos países e solos diferentes, não é tão fácil assim elaborar um cabernet sauvignon de grande qualidade e complexidade.
100% cabernet
Ao contrário dos demais grandes tintos do vale central chileno, o Casa Real é elaborado apenas com a cabernet sauvignon. Os demais têm porcentagens de carmenére, cabernet franc, petit verdot, entre outras variedades tintas. Na história deste vinho, as principais mudanças foram o estágio em barricas de carvalho, passado daquelas 100% novas e francesas, até uma porcentagem de 75% a 80% destas barricas novas e o restante passa por barricas de segundo uso.
As datas das colheitas também foram adiantadas, em um movimento de elaborar tintos com maior frescor. Mas as notas clássicas da cabernet chilena, como o cassis e as groselhas, bem escoltadas com taninos presentes, firmes, e uma boa potência, são presentes em todas as safras.
As safras
A 1995, bem evoluída, tem o cedro como destaque e a sua longevidade. A de 2019, considerado um ano clássico, traz alguma evolução na taça, mesmo mantendo as notas de cassis e um agradável grafite. É a safra para consumir agora. Das recentes, a 2021 brilha pela complexidade, e a 2022, ainda muito jovem, atrai pelas notas frutadas e o potencial de envelhecimento. Também foram degustadas as safras de 2005, 2015 e 2020.