O vinho Periquita é um clássico português, elaborado com a uva castelão, no passado apelidada de periquita (daí o seu nome). Era um tinto que precisava de muito tempo em garrafa para afinar os seus taninos, então bem mais rústicos e que, sim, envelhecia bem na garrafa. Poucos consumidores abriam a garrafa antes de dez anos da sua elaboração.
Hoje, os métodos de cultivar os vinhedos e elaborar o vinho permitem que o Periquita seja lançado logo depois da sua safra e já pronto para ser consumido – o melhor exemplo é que a linha Periquita cresceu, com brancos e rosés e também outros tintos, de estilo mais moderno e fresco. Mas a consequência desta, digamos, modernidade, foi que o vinho perdeu a sua capacidade de envelhecer com o tempo em garrafa, quando ganhava novas nuances de aromas e sabores.
A exceção
Mas há uma exceção, o Periquita Clássico, lançado pela primeira vez em 1992 e atualmente em sua sétima safra – a oitava, de 2017 deve ser lançada provavelmente no ano que vem (por aqui, a Interfood importa esses vinhos). O Clássico só é elaborado em anos especiais, por Domingos Soares Franco, enólogo e representante da sétima geração da vinícola José Maria da Fonseca. Detalhe: foi o próprio Domingos quem decidiu mudar a receita do Periquita nos anos 1990. “A ideia era atender a demanda dos consumidores, que queriam vinhos mais suaves”, explica António Soares Franco, sobrinho de Domingos, e representante da oitava geração.
É esse tinto que permite responder sim para a pergunta do título acima. Sim, o Periquita envelhece bem, com perfis diferentes conforme a sua safra. Mas qual o melhor? Ou por quanto tempo recomenda-se guardar uma garrafa? As respostas a essas perguntas estão na taça. E foi essa provação que o Paladar fez ao António, em uma visita à vinícola portuguesa no início deste ano. O resultado é que ele próprio trouxe em sua mala as sete safras já elaboradas do Periquita Clássico em sua visita ao Brasil no mês passado.
Passo a passo
O Paladar acompanhou essa degustação desde a abertura das garrafas. As rolhas das três primeiras safras da década de 1990 se mostraram problemáticas, daquelas que esfarelam ao abrir e exigem saca-rolhas especiais. Mas não foram capazes de comprometer a qualidade do vinho.
Na degustação cada garrafa revelou a sua personalidade. A pioneira, de 1992, mostrou de início boas notas de evolução, com couro, figos secos, tostados. Mas a sua exuberância durou pouco, e o tinto elaborado na época com 95% de castelão e 5% de espadeiro (variedade local), com estágio de oito meses em barricas de carvalho francês nova, quase morreu na taça depois de alguns minutos em contato com o oxigênio.
O campeão
O de 1994, elaborado apenas com castelão e com 10 meses de estágio em carvalho francês novo, redimiu o seu antecessor. Notas de frutos silvestres, mesclados com tostados, especiarias, frutas secas, notas terrosas, de chá preto, em uma riqueza aromática, que sobreviveu ao tempo. Foi o melhor do painel. O de 1995, elaborado da mesmíssima maneira que o anterior, também tinha os seus encantos, com alguns aromas de frutas mais maduras, resultado de um ano mais quente, mas também com tostados, e com taninos firmes e potentes.
Para elaborar a safra de 1999, Domingos optou por deixar o vinho por 24 meses em tonéis de madeira usada (ele manteve a técnica no 2001, mas aqui apenas 60% do vinho passou por essas barricas). O resultado é um tinto bem estruturado, ainda com notas de frutas vermelhas, mas bem fechado em aromas e, novamente, com os taninos firmes como destaque. Já o de 2001, um ano muito chuvoso, se mostrou o menos concentrado do painel e foi também o mais alcoólico, com 14% de teor alcoólico.
Em 2004, a opção de Domingos foi envelhecer o tinto por 24 meses em tonéis grandes de carvalho francês de primeiro uso, e o tinto encanta pelo misto de complexidade aromática (frutos vermelhos e secos, figo, floral) e estrutura mais macia, com taninos presentes e finos. O de 2014, que passou dois anos em barricas de madeira usada, foi obviamente, foi o mais jovem do painel, revelando notas de frutas escuras (ameixas, framboesas), um toque de avela e notas florais, com taninos bem macios e presentes.
Futuro
Agora é esperar as próximas safras, desde vinho que, além de envelhecer bem na garrafa também é mantido por muito mais tempo nas adegas da José Maria da Fonseca. Se chegar ao mercado no ano que vem, como previsto, o próximo Clássico terá passado um estágio de 8 anos na vinícola antes do seu lançamento. No site www.todovino.com.br