Há 15 anos, Luiz Filipe Souza botou um terno e saiu com currículos debaixo do braço. Analista de crédito em banco, não tinha a menor intimidade com facas e panelas, mas queria uma vaga na cozinha. E conseguiu. No Restaurante Fasano.
Dali já se anunciava um profissional cerebral e determinado que, com pouco menos de uma década de trabalho, lançou e alçou seu autoral Evvai na rota gastronômica do país. Em cinco anos da casa no bairro de Pinheiros, o chef realizou mais de 15 menus.
No comecinho, eram sete tempos a R$ 180. Desde lá, havia bombolone (sonho) de vieira, massas de pontos e espessuras impecáveis e caldos reconfortantes. Foram então aparecendo ideias, segurança e hoje a experiência chamada Oriundi tem 13 tempos e sai a R$ 737 (mais pelo menos R$ 519 pelas felizes harmonizações do sommelier Marcelo Fonseca).
Ao longo dos cardápios, Luiz Filipe amalgamou bases clássicas italianas, inspirações brasileiras e uma obsessão pela estética. É essa combinação de técnicas e heranças ítalo-brasileiras mais uma dose generosa de imaginação, outra de ousadia, mais uma de lindice que se come na novíssima degustação.
Do pão quentinho de mandioca para derreter a manteiga de maracujá ao morango lacto-fermentado que se mistura ao tomate em picolés feitos na hora pela confeiteira Bianca Mirabili, o talentoso cozinheiro vai além do uso inusitado de frutas.
“Parte do encanto está em propor o conhecido de maneira desconhecida, ressignificar de maneira prazerosa. É algo bem trabalhoso, envolve muitas tentativas, muitos erros, mas quando acertamos, os resultados são compensatórios. A moqueca deixa de ser moqueca sem deixar de ser moqueca. A massa deixa de ser massa sem deixar de ser massa. A sobremesa deixa de ser sobremesa sem deixar de ser...”, filosofa ele.
Aqui, cabe uma palavrinha: a tal da moqueca feita com olhete fresquíssimo não leva dendê, mas numa espuma mágica com tomate, leite de coco e framboesa evoca-se a cor, a densidade e, de algum modo, o próprio sabor desse azeite de palmeira. Com volúpia, preenche a boca com acidez agradável e surpreendente.
Já a massa, um linguini al dente, servido frio, com pistilos de açafrão, sorbet de cupuaçu, pitada de pimenta baniwa e coulis de tangerina mais do que refrescar, acende o paladar. A combinação das duas frutas mencionadas lembra cajá no paladar e adoça com sutileza.
A utilização de produtos nacionais é uma das marcas do Evvai, mas nem só: “Não acredito em rótulos, mas entendo que temos uma linha de trabalho bem definida e madura. Trabalhamos sob uma caixa criativa formada por paralelos culturais de Brasil e Itália, expressos sobre técnicas clássicas ou contemporâneas de maneira divertida”.
Entre uma diversão e outra, Luiz já angariou a 14ª posição no The World’s 50 Best Restaurants América Latina e a 67ª na edição mundial de 2022, além de uma estrela Michelin nos tempos em que o guia esteve por aqui.
No momento, exalta a elegância do alho-poró, o cappuccino de conchas, as tortinhas coloridas e o barreado que está servindo: “Tenho vários queridinhos, todos são meus queridinhos! é como perguntar a uma mãe qual seu filho preferido”.
O talento que não foi desperdiçado numa agência bancária fica em cartaz nas receitas citadas e mais algumas até pelo menos o início de agosto. Isso é, se o chef não tiver um de seus rompantes incontroláveis de inventividade!
Evvai
R. Joaquim Antunes, 108, Pinheiros. Seg. a sáb, das 19h às 23h. Tel.: (11) 3062-1160