O nome açafrão-da-terra, quase sempre abreviado para simplesmente açafrão, pode confundir cozinheiros pouco experientes, já que o rizoma da Curcuma longa não tem nada a ver com o estigma de flor da espécie Crocus sativus usado na paella, esse sim o açafrão verdadeiro. É verdade que podemos encontrar no mercado corantes para o prato espanhol feitos com o açafrão-da-terra, muito mais barato, mas seus méritos próprios são tantos que seria vulgar tratá-lo apenas como fraude de cor. Ainda em relação ao nome, vale lembrar que açafrão tem origem etimológica na cor amarela, em árabe.
Embora possamos chamá-lo de cúrcuma, açafrão-da-terra ou gengibre-dourado, para evitar confusão, prefiro usar o termo cúrcuma para esse rizoma asiático superbem adaptado em todo o mundo tropical e da mesma família do gengibre. Seu sabor está mais para o amargo, mas a coloração é tão forte que uma pequena colher do pó é suficiente para colorir e dar sabor a uma xícara de arroz sem amargar o prato.
Os rizomas podem ser encontrados apenas na época de colheita. É difícil, pois quase toda a produção se transforma em pó. Quando achar um, enterre pelo menos um pedaço em um vaso e terá uma planta linda, que brota na primavera e dá flor no verão. No outono, as folhas tombam – é hora de colher. Para usar, basta ralar ou bater no liquidificador com água e usar o líquido coado.
Só no nome. A cúrcuma não tem nada de açafrão. FOTO: Robson Fernandjes/Estadão
O bom é comprar o pó, que conserva o sabor e concentra a cor, de produtores artesanais que secam e trituram a cúrcuma sem misturas. Nas feiras de Goiânia, por exemplo, você encontra barracas de tempero muito coloridas com bacias cheias de colorau e cúrcuma sempre juntos, como dois marcadores importantes da comida brasileira, especialmente no Centro-Oeste – afinal, galinhada sem cúrcuma não é digna do nome. Em Sergipe, é usada para dar cor ao molho branco. E, embora não seja muito comum, pode entrar no preparo de doces. É o caso do bolo libanês sfoof, feito com semolina.
E uma característica da cúrcuma que vale a pena ressaltar é a reação do seu pigmento curcumina que, aliás, é um potente antioxidante, em meio alcalino e isto pode ser divertido em performances culinárias. Para conferir, faça a experiência: ferva um pouco de cúrcuma em água e divida em duas partes. Junte um pouco de bicarbonato em uma e vinagre na outra. A primeira mistura, alcalina, ficará vermelha. Com vinagre, a cor se mantém.
Agora, não pense que cúrcuma é apenas o rizoma com sua cor. As folhas frescas têm incrível perfume de manga verde e podem ser usadas para embalar peixes e doces de arroz, como é feito na Índia, país onde a cúrcuma, de um modo ou de outro, está sempre presente. O pó amarelo entra na maioria dos temperos de caris e pratos com grãos e vegetais, como a receita do jiló, que aprendi com uma vizinha indiana. É só servir com arroz e… nhac!